A História dos Vídeo Games

A História dos Vídeo Games #10: A grande crise de 1983/84

No nosso último encontro na coluna A História dos Vídeo Games, vimos a história de 2 consoles que ameaçaram o reinado do todo poderoso A... (por Jones Oliveira em 21/03/2010, via Nintendo Blast)

No nosso último encontro na coluna A História dos Vídeo Games, vimos a história de 2 consoles que ameaçaram o reinado do todo poderoso Atari 2600: o Intellivision e o ColecoVision. Chacoalhando o império construido por Nolan Bushnell e pela Warner, os dois consoles só vieram reafirmar o que estava se tornando perceptível a todos: a indústria não era mais a mesma e algo estava errado…

brokenTVPassada a fase embrionária da indústria na década de 1960 e sua adolescência na década de 1970, parecia que finalmente os fabricantes chegavam a um outro nível de maturidade. A indústria de vídeo games deixou de ser um negócio de fundo de quintal e já faturava valores astronômicos para a época. Já havia imprensa especializada no assunto e, claro, fofocas, muitas fofocas a respeito disso e daquilo.

Dentre as várias fofocas, uma foi contada tantas vezes que distorceu a realidade e cegou os produtores e fabricantes: bastava fazer um joguinho qualquer, lançar no mercado e ficar sentado assistindo o Domingão do Faustão (OK, não existia o programa na época) a espera do dinheiro era uma das estratégias que sempre davam certo. É verdade que o mercado estava borbulhando, mas as coisas não estavam tão fáceis assim.

gamer O amadurecimento da indústria era apenas aparente. O mercado, e consequentemente o consumidor, sofria sucessivas enxurradas de consoles desde a primeira geração. Não estaria exagerando em dizer que a cada semestre eram lançados de três a quatro “novos” consoles. Fora isso, a partir da segunda geração, com a política de obter lucro a partir das vendas dos jogos, cada vez mais jogos eram lançados, saturando o mercado que ainda não estava preparado para absorver tanta coisa.

 

O desespero da Atari e a inundação do mercado

COCADA PRETA Até a sua venda para a Warner, a Atari era o mais concreto exemplo de sucesso na indústria. Sua agressividade, capacidade de leitura do mercado e apostas nas moedas certas no “jogo da indústria” lhe renderam o título de “rei da cocada preta”. Contudo, sua venda para a Warner Communications, talvez, a comprementeu pelo resto da vida. Sem Nolan Bushnell a Atari começou a adotar estratégias perigosas e sem sentido, mesmo quando a ocasião não lhe exigia isso.

O primeiro exemplo de tal estratégia foi no lançamento do 2600. Com o número de vendas abaixo do esperado, a Warner simplesmente disse “façam ai qualquer coisa que chame a atenção para vender o console” aos programadores (para mais detalhes, lei o episódio 7 da coluna). Já no fim de 1970, com a chegada do Intellivision e do ColecoVision, a coisa ficou mais preta ainda.

Etvideogamecover Com hardware inferior ao dos concorrentes, a única maneira que a Atari encontrou para contornar o problema e continuar vendendo foi apelar para a sua biblioteca de jogos – a maior àquela época. A estratégia era lançar a maior quantidade de jogos possíveis e tentar fazer os consumidores “comerem com os olhos”, oferecendo títulos como E.T. the Extra-Terrestrial (o mairo sucesso dos cinemas até então) e uma adaptação porca do sucesso dos arcades Pac-Man.

Pac-man Para se ter uma ideia de como as coisas estavam sendo feitas, E.T. foi desenvolvido em apenas 5 semanas (enquanto um jogo “normal” do Atari demorava 6 meses em média) e seu objetivo foi de aumentar as vendas do Atari 2600 no Natal de 1982. O que se viu nos cinemas, no entanto, não se repetiu nos vídeo games. O jogo foi o maior fracasso de todos os tempos: a Atari investiu mais de 25 milhões de dólares na aquisição dos direitos do jogo e, no fim das contas, teve que mandar enterrar mais de 50% dos cartuchos produzidos tamanha a ruindidade do jogo.

CustersRevenge Com um soco na barriga como esses, a Atari perdeu as estribeiras. A quantidade de títulos de qualidade duvidosa que surgiram a partir dali foi imensa – não que eles já não existissem. Jogos como Custer’s Revenge começaram a aparecer nas prateleiras e rapidamente o gênero pornô tomou conta da milionária festa da indústria.

Cansados de tanta porcaria, os consumidores começaram a voltar seus olhos para uma alternativa que começava a ficar bem mais acessível…

 

O barateamento dos computadores pessoais

Ao contrário do que temos hoje em dia, nas décadas de 1960 e 1970 o computador era algo que ninguém imaginaria que poderia ter em casa. Custando algo em torno de US$ 3300,00 atuais, os computadores eram verdadeiros artigos de luxo disponíveis apenas em universidades e ambientes militares.

A grande sacada das empresas da indústria foi lançar seus consoles com a palavrinha “computer” no meio do nome deles. O Atari 2600 foi o melhor exemplo disso – seu nome oficial de lançamento era Atari Video Computer System. A tentativa de fazer com que os consumidores se sentissem donos de um computador por menos de 200 dólares dava certo, mesmo que para isso as empresas tivessem que fazer promessas absurdas. Não raramente eram prometidos periféricos que tornariam o vídeo game em um super computador e com bastante frequência elas não eram cumpridas.

VIC-20_friendly_brochure_p1 Cientes da excelente oportunidade que lhes surgia, os fabricantes de computadores pessoais começaram a bolar uma forma de baratear os componentes do computador, de forma que eles se tornassem acessíveis aos consumidores. Não demorou muito para que houvessem computadores a US$350 disponíveis nas lojas especializadas e de departamento.

O valor relativamente alto se justificava porque os consoles “expansíveis” exigiam um acessório que custava mais que o dobro do preço original do console. O consumidor gastaria, no mínimo, US$500 para transformar o seu console em um computador pessoal.

De saco cheio dos vídeo games e da mediocridade que lhes era oferecido, os consumidores começaram a optar pelos computadores. Percebendo que agora a gangorra começava a pender para o outro lado, a Commodore lançou o Commodore VIC-20 a US$199,00! A partir de então os computadores pessoais começaram a decolar.

Vic-20_ad Em pouco tempo os consumidores puderam desfrutar de melhores gráficos e sons, graças a maior quantidade de memória que os computadores ofereciam. Para os gamers, os computadores ofereciam jogos de maior qualidade, fáceis de copiar em disquetes e fitas cassete. Para o restante da família, processadores de texto, planilhas eletrônicas e mais um punhado de aplicações estavam disponíveis.

Foi ai que começaram a surgir campanhas publicitárias com slogans do tipo “Pra quê um vídeo game se você pode ter um computador?” e “seu filho não precisa de um vídeo game, mas de um computador”.

 

O surgimento das third-parties

Activision_logo Você sabia que a Activision surgiu por causa de uma briga na Atari? Pois é. Mais especificamente, os fundadores da Activision eram programadores na Atari e, descontentes com a situação a que eram submetidos, sairam da empresa em 1979. À época, não existiam créditos nos jogos – tudo o que se sabia era que os jogos eram desenvolvidos pela Atari, ou pela Mattel, ou pela Coleco… o nome dos profissionais envolvidos na criação, concepção e desenvolvimento do jogo não apareciam.

sal na ferida Hoje em dia todos os envolvidos no projeto recebem uma porcentagem da venda dos jogos – mesmo pequena, mas ainda é alguma coisa. Só que isso era muito diferente nos idos de 1970 e 1980. Ninguém recebia nada, nem um tostão! Tudo ia para os bolsos das fabricantes. Dá para acreditar?

O sal foi jogado na ferida dos desenvolvedores quando a Atari foi vendida para a Warner – a partir daquel momento todos começaram a pensar: “porque músicos, diretos, atores e outros profissionais das outras divisões da Warner recebem royalties e eu não?”, exigindo o mesmo reconhecimento dos demais.

Por mais que a Atari tentasse impedir a produção e venda dos jogos da Activision para o seu console, sempre saiu perdedora na justiça. Em um dos julgamentos à época, a justiça reconheceu, oficialmente, a Activision como a primeira third-party de todos os tempos, permitindo a comecialização dos seus jogos sem nenhum problema.

A partir daí, várias empresas de fundo de quintal foram surgindo e tentando tomar vantagem do lucrativo mercado. Jogos como Chase the Chuck Wagon, Skeet Shoot e Lost Luggage inundaram o mercado, formando uma enorme bola de neve que fugiu do controle da Atari, Mattel e Activision.

427063-lost_luggage_large 956025-b_chasethechuckwagon_front_large 1414519174

Consequências

O lançamento de tantos jogos e consoles fez com que o mercado ficasse supersaturado. As lojas ficaram sem espaço físico para armazenar e expor tantos jogos, que sequer eram vendidos! Na tentativa de desafogar o estoque e gerar fluxo de caixa, acabavam retornando os cartuchos para os fabricantes que, também sem dinheiro, não podiam ressarcir as lojas.

Numa tentativa de reduzir o enorme prejuizo, as lojas se viram obrigadas a fazer queimas de estoque que reduziram os preços dos jogos mais caros de US$34,90 para US$4,95. A indústria de vídeo games, antes vista como uma aposta certa, uma mina de dinheiro, agora não passava de uma enorme vala de prejuizos.

video-game-sales Sem o feedback das vendas, empresas como a Magnavox e a Coleco abandonaram o ramo de vídeo games para sempre. Empresas promissoras como a Imagic também entraram em colapso, declarando falência assim que os lucros deixaram de vir. A Atari, por sua vez, resistiu somente por causa da Warner que segurou sua barra – não fosse isso, também teria ido pro brejo como a Magnavox e a Coleco. Apesar de ter escapado da crise, nunca mais foi a mesma.

A única que realmente escapou foi a Activision. A partir do rompimento com a Atari, rapidamente a Activision investiu no mercado de computadores e enquanto a indústria afundava, ela continuava lucrando com os jogos desenvolvidos para computador. Hoje a Activision é a maior third-party de todas na indústria.

msx1 Mesmo com as promoções, liquidações e todo tipo de técnica para ludibriar o consumidor, as lojas perceberam que jogos e vídeo games não renderiam mais nem um centavo. As centenas de milhares de prateleiras que eram reservadas aos consoles e seus jogos mundo a fora foram subsituidas por prateleiras de outros produtos. Ignorando os vídeo games, as lojas fizeram com que eles caíssem no esquecimento dos consumidores. A moda dos vídeo games parecia ter chegado ao fim. A nova onda agora era a dos computadores.

 

No nosso encontro de hoje vimos os principais fatos e acontecimentos que levaram a indústria entrar em colapso. Fala-se em “Crise de 1983/84”, mas ela não ocorreu especificamente nesses anos. Assim como a crise econômica que passamos da última vez, a crise dos vídeo games foi devido a uma série de fatores que vinham acontecendo há bastante tempo – eu diria que desde o surgimento da primeira geração. No entanto, a Atari foi a principal vilã da história. Com a crise veio o fim da segunda geração de vídeo games e, aparentemente, da indústria. Alguns consoles da terceira geração que já entravam no mercado à época, tiveram suas vendas mais do que prejudicadas, com excessão de um deles – o MSX. Mas esse assunto e a discussão sobre o MSX ser um computador ou vídeo game fica para o nosso próximo encontro. Até lá!


Escreve para o Nintendo Blast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


  1. Sempre tive um ódio da atari, mesmo com seus jogos com qualidades (naquela época) e console super famoso, mas eu sempre tive um ódio dela, e olha que eu nem nasci antes dos anos 80. Agora descobri porque desse ódio irracional, ela quase acabado com os videogames.

    ResponderExcluir
  2. Q vergonha heim Atari!!! ¬¬

    ResponderExcluir

Disqus
Facebook
Google