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Análise: Shinobi Spirits S: Legend of Heroes (Switch) diverte com turma de ninjas carismáticos, mas peca no level design

Título de ação e plataforma 2D tem lá o seu charme, mas desperdiça muito de seu potencial.


Não faltam opções atualmente para os fãs do misto entre ação e plataforma 2D. Em meio a tantos títulos, muita coisa bacana corre o risco de passar despercebida. Um forte candidato para isso é Shinobi Spirits S: Legend of Heroes (Switch), um game bastante simpático que aportou há pouco tempo na eShop do Nintendo Switch.

Produzido pela japonesa Tom Create (que traz no currículo principalmente jogos licenciados saídos apenas no Japão, como vários títulos baseados na franquia Gundam e os dois jogos de Fullmetal Alchemist para o Game Boy Advance), esse game recria o igualmente obscuro Ninja Battle Heroes (3DS), prometendo ação ninja em 2D estrelando um elenco de carismáticos mascotes. Será que o resultado final fica a altura da fofura dos protagonistas? Confira com a gente!


Ninjutsu adorável

Estrelado por adoráveis animaizinhos antropomórficos, o elenco de Shinobi Spirits poderia ser facilmente confundido com mascotes da Sanrio como a gatinha Hello Kitty ou o sapinho Keroppi. Em uma ambientação de Japão feudal, a Beast Brigade atua como resistência ao shogunato de Ieyasu Tokugawa. Nosso herói principal, Saizo Kirigakure, parte em resgate de seus companheiros de dojo, sequestrados e/ou aparentemente convertidos para as forças do mal a partir das ações misteriosas do colega Sasuke Sarutobi.

Sem se preocupar muito em estabelecer a trama, o foco da narrativa se encontra no resgate sucessivo dos amigos de Saizo, e nas subsequentes interações entre eles. Além de uma série de coletáveis que revela detalhes sobre o lore deste mundo, há também uma sala onde é possível acompanhar diálogos extras entre os personagens. No geral, percebe-se um trabalho de bastante detalhamento da ambientação do jogo, ainda que a tradução cause estranhamento em alguns pontos.



Cada personagem resgatado se torna também uma Skill do tipo Summon, podendo então ser evocado durante as fases para emprestar suas habilidades únicas ao time. Embora a opção de controlar diretamente outros desses heróis acabe fazendo falta, sua participação direta na jogabilidade garante que o jogador se sinta familiarizado com a ambientação carismática da aventura.

A apresentação gráfica combina de forma charmosa backgrounds tridimensionais com os sprites de personagem, que adquirem um visual 2D "chapado" que chegou a me lembrar um pouco da série Paper Mario. Infelizmente, faltam aos cenários o mesmo nível de qualidade visto nos personagens, com texturas simplistas e bastante repetitivas.



Já no campo sonoro, a produção perde a oportunidade de embalar bem a ação com uma trilha musical à altura. A ausência de variedade acaba sendo novamente um problema aqui, só que ainda mais marcado do que no caso dos cenários: ao longo de todo o game, temos uma lista muito restrita de canções breves que se repetem em um loop curtíssimo. Desnecessário dizer que isso torna as faixas, que em si são até bem bacanas, em um verdadeiro tormento após algum tempo de jogatina contínua.

Assim, o grande destaque do game entre os aspectos de  narrativa e audiovisual fica por conta do elenco colorido de personagens  —  o que inclui também os inimigos, que compartilham do mesmo estilo de arte vívido e adorável. Seria necessário um maior polimento na trilha sonora e no visual das fases para que se fizesse justiça ao carisma da premissa no conjunto geral. (Sério, se há um limite para o quanto somos capazes de ouvir a mesma musiquinha sem entrar em colapso mental, eu cheguei bem perto dele dessa vez!)


Pular, cortar, e pular novamente!

No campo da jogabilidade em si, Shinobi Spirits revisita a ação 2D com um jeitão que faz lembrar os jogos do gênero na era 32-bits. Combinando plataforma 2D com ação frenética entre combos, projéteis e técnicas variadas, o resultado final se aproxima mais de um beat-em-up em grandes arenas expansivas do que de um título de plataforma propriamente dito.

Ao início do jogo, nosso herói conta com um conjunto bastante básico de habilidades, o qual vai se expandido ao longo da jornada, conforme encontramos os pergaminhos de habilidades e acumulamos Spirit o suficiente para investir na Skill Tree. Saltos comuns e duplos, dashs em terra e aéreos, rasteiras, shurikens, bombas de fumaça e ataques diversos com espada que podem ser desenvolvidos em forma de combos formam a base do arsenal à disposição do jogador.



Os já citados Summons também cumprem seu papel, cada personagem oferecendo sua contribuição à guerra ninja, diversificando a experiência. O inseguro Kosuke oferece serviços de cura, a explosiva Mochizuki dinamita os inimigos a curta distância, os irmãos Isa & Seikai estonteiam os inimigos com um golpe de peso, a tsundere Kamanosuke lança ataques de vento por toda a tela com sua foice, o falastrão Jinpachi congela inimigos a curta distância, Unno voa por toda a tela detonando os inimigos de todas as formas possíveis (esse cara é o melhor!), Juzo atua como sniper no plano horizontal e Sasuke garante cobertura de várias maneiras com técnicas poderosíssimas. (OK, esse é bom de serviço, também!). Ufa!

A tridimensionalidade dos cenários afeta a jogabilidade, porém apenas de forma bastante indireta: alguns inimigos podem se posicionar no plano de fundo da fase, sendo que por vezes podem inclusive se locomover em profundidade até o plano de frente. Infelizmente, nosso herói fica restrito ao plano principal e a uma movimentação exclusivamente bidimensional, ainda que conte com a possibilidade de lançar shurikens em profundidade para atingir esses meliantes dados à esperteza.



Em termos dos controles, uma grande ressalva diz respeito à falta de opções de customização. Não só não há opção para movimentar o personagem com o direcional digital (que seria minha pedida principal para esse game, sem dúvida!), como também o sistema de Summons — tão importante na dinâmica do jogo — depende de um método de seleção arcaico rotacionando as imagens dos personagens, uma a uma, no canto da tela. No meio de um caos de ação e tentando cumprir um desafio de tempo. Pois é.

Se esse tipo de solução era cabível nos tempos do Nintendinho (com seus míseros dois botões), a falta de opções de configuração para a ampla variedade de controles do Switch acaba pesando contra o título, ainda mais em se tratando de nos manter presos a uma configuração bem pouco prática.


Jutsu desajeitado

Tirando esses fatores de lado, a jogabilidade é suficientemente responsiva, ainda que alguns aspectos da movimentação incomodem um pouco, especialmente no início. É que o sistema de upgrades cobra seu preço: elementos básicos da jogabilidade iniciam o jogo bloqueados na Skill Tree, e nesse sentido essa limitação atua como um motivador bacana para se progredir na campanha.

Conforme novos upgrades vão sendo habilitados, nosso herói vai ficando menos "engessado" e o jogo passa a fluir um tanto melhor, resultado em alguns momentos bastante divertidos de ação caótica. A frente da pancadaria definitivamente empolga mais do que a plataformagem. Embora os saltos e dashs sejam bem responsivos e o game jogue muito bem em alguns dos trechos bem desenhados de plataforma, no geral o a experiência acaba totalmente sabotada por um aspecto central: o level design.




O desenho das fases sofre tanto de falta de inspiração quanto de planejamento ruim. Grande parte das fases se resume a plataformas muito alongadas distribuídas de forma um tanto quanto aleatória, resultado em inimigos esparsados em um espaço grande e sem foco, o que reflete em uma péssima visibilidade da fase para o jogador.

Como se não bastasse, a produção parece justamente contar com isso como artifício para inserir algum tipo de desafio de plataformagem nas fases. Entre a visibilidade restrita do jogador e as plataformas mal espaçadas, o resultado é um só: quedas e mais quedas. Afinal de contas, quem é que não gosta de cair em um precipício sem fundo que era impossível de se prever, em meio a um combo de 100-hits, perdendo todo o progresso feito ao longo de 5 minutos até então?



Não são só os poços sem fundo que aterrorizam o jogador: algumas das fases adotam desenhos tortuosos, não sendo rara a sensação de se deparar com diversos "becos sem saída" por toda parte. Normalmente, a solução é escalar verticalmente o nível  —  e aí entram os não raros saltos às cegas que acabam muitas vezes nos fazendo voltar ao início do percurso.

As batalhas contra os chefes, em especial, mostram o verdadeiro potencial do game no que diz respeito ao uso sincronizado de Summons e técnicas para obter-se uma ação fluída e empolgante. Na maior parte do tempo, no entanto, o foco da ação acaba disperso pelo level design que alterna entre o apático e o frustrante.



Aprimorando a arte ninja

Fora o apelo visual, o outro dos atrativos prometidos por Shinobi Spirits S diz respeito à sua progressão ramificada de jogo. A já citada Skill Tree traz um elemento de customização com ares de RPG de ação, onde os pontos de Spirit coletado através das fases são investidos nas mais variadas técnicas. Uma função bem-vinda é a possibilidade de se resetar todo o quadro para redistribuir os pontos a qualquer momento e sem custo algum  —  uma mão na roda para testar builds diferentes para cada desafio.

Por sua vez, o sistema de dificuldade e missões complementa essa árvore de habilidades, representando a forma mais prática de se obter esses pontos de experiência, ao mesmo tempo em que oferece ao jogador a chance de customizar um desafio gradual para si mesmo conforme sua própria habilidade.



Cada um dos três níveis (Easy, Normal e Hard) sobe consideravelmente o desafio, e contém três desafios a serem superados, cada qual recompensando o jogador com quantidades generosas de Spirit ou até desbloqueando ou incrementando técnicas raras na Skill Tree.

As missões funcionam como um incremento divertido, com objetivos interessantes para se testar em cada fase. Tratam-se dos momentos em que o teste das diferentes configurações de habilidades mais rende, em especial nos desafios de terminar a fase sem dano.



No entanto, trata-se de mais um conceito prejudicado pelo level design empobrecido: os time attacks, por exemplo, sofrem da monotonia inerente a se memorizar os níveis esticados e pouco empolgantes, e o jogador se vê com pouco espaço para experimentação nesse quesito, exceto buscar os pouquíssimos atalhos e "spammar" o as habilidades de dash no máximo.

Já a opção de níveis de dificuldade empolga menos, uma vez que o incremento do desafio se restringe basicamente a aumentar brutalmente a velocidade, poder de ataque e vida dos inimigos. Com cada soldadinho possuindo toneladas de HP, a melhor pedida acaba sendo investir pesado nos Summons. As batalhas que resultam são explosivas e bem divertidas, mas não raramente acabam interrompidas pelo desenho esparso das fases.



Também é possível investir em Skills que aumentam os atributos de nosso personagem e de seus amigos, algo bastante bem-vindo para fazer frente à escalada de poder no nível Hard. No entanto, para habilitar os upgrades de cada atributo, é necessário encontrar os três pergaminhos referentes a ele escondidos pelas fases do jogo.

Novamente, o grande defeito do jogo dá as caras: essa busca pelos coletáveis não empolga tanto quanto deveria, frequentemente soterrada entre quedas em becos sem saída e inimigos "respawnando" sem parar. Não ajuda nada que a quantidade de Spirit recebida diretamente em batalha seja muito baixa, o que faz da tarefa um grinding lento, repetitivo e ineficiente.



É divertido experimentar as diferentes combinações de habilidades e "grindar" por mais Spirit em busca de melhorar o poderio de nossa Beast Brigade. No entanto, todo essa gama de conteúdo extra acaba atolada em uma progressão truncada pelo level design inconstante e pelas baixas recompensas obtidas fora das missões principais.

Se ao menos no nível Hard o drop de Spirit fosse mais elevado, talvez a tarefa de percorrer as fases novamente trouxesse algum apelo a mais. Da forma como está configurada, no entanto, a tarefa acaba adquirindo mais ares arrastados de "encheção de linguiça" do que de um desafio extra propriamente dito.



Assim, ao mesmo tempo em que promete incrementar uma fórmula sem exageros com diversos fatores bacanas — e acerta em construir elementos que, ao menos em teoria, recheiam a experiência de valor replay extra, Shinobi Spirits S: Legend of Heroes acaba desperdiçando muito de seu potencial pela baixa qualidade de seu level design. Trata-se de uma ótima pedida para matar tempo no modo portátil, em sessões curtas, não se sustentando o suficiente como uma experiência mais aprofundada de jogo.

Deixando de lado algumas ressalvas em relação à interface e controlabilidade, o game joga muito bem e tinha potencial o suficiente para ficar à altura do carisma de seus personagens também no campo da jogabilidade  —  o divertido e desafiador boss rush do último mundo é a prova disso. No entanto, entre um beat-em-up competente, mais que peca pela repetição, e a plataformagem abaixo da média, o título acaba por não repetir o mesmo polimento visto no design de personagens em seus demais aspectos.

Prós

  • Elenco muito carismático de personagens, bem representado em belíssimos sprites em alta definição;
  • Jogabilidade responsiva, em especial na frente de ação;
  • Esquema de progressão de habilidades garante bastante variedade ao jogo;
  • Sistema de dificuldades e missões aumenta o fator replay e incentiva a experimentação com a Skill Tree.

Contras

  • Level design fraquíssimo sabota o potencial da fórmula em diversos momentos;
  • Repetitividade e simplicidade dos cenários não fica à altura do design dos personagens;
  • Ausência de opções de configuração de controles, com padrões fixos pouco práticos;
  • Trilha sonora chega a ser enlouquecedora, de tão repetitiva.  
Shinobi Spirits S: Legend of Heroes (Switch) — Nota: 6.5
Análise produzida com cópia digital cedida pela TOMCREATE

é gamer pra todo jogo, mas tem predileção por títulos retrô e um bom e velho JRPG. Sonic, Donkey Kong Country, Ratchet & Clank, Final Fantasy e Disgaea são algumas das séries que formaram a paixão pelos games, desde que ganhou seu Mega Drive, muitos (nem tantos!) anos atrás. Além de escrever para o Nintendo Blast e Game Blast, pode ser encontrado tagarelando no Plano Crítico.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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