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Análise: Stories Untold (Switch) é uma valiosa imersão narrativa

Um jogo com poucas mecânicas de gameplay, mas que ainda assim consegue prender o jogador pela tensão criada.



Jogos de point-and-click sempre tiveram seu público. Ainda que outros gêneros, mais participativos em termos de gameplay, ocupem a maior parte dos lançamentos atuais, games em que é preciso interagir com os cenários e com estrutura narrativa forte, continuam surgindo e propondo novos níveis de exploração. Stories Untold, desenvolvido pela No Code e publicado pela Devolver Digital, chega agora ao Switch trazendo um nível grande de tensão para as mãos dos jogadores. Lançado originalmente em 2017, o título ainda impressiona pela qualidade do texto e capacidade de testar os nervos do jogador.

O medo é o que nos move

Stories Untold não chega a ser um jogo de terror, ainda que às vezes seja lembrando dessa forma. Aqui o horror é psicológico. Isso significa que o jogador não vai se deparar com cenas terríveis, daquelas que fazem você querer vomitar. No entanto, o medo ainda está presente, tanto pelo clima narrativo imposto pelos desenvolvedores, como pela forma como a história é contada.

O game, é preciso dizer, é constituído por quatro histórias distintas que precisam ser jogadas em uma ordem específica. Ou seja, quando você passa pela primeira, a segunda é liberada e assim sucessivamente. Existe um motivo para isso, mas não possível contar aqui. Primeiro, porque o jogo trata basicamente de narrativa e apresentar detalhes tira as surpresas que estão pelo caminho. Além disso, Stories Untold tem uma progressão lenta, o que força o jogador a se envolver com os acontecimentos, ao ponto de, inevitavelmente, conectar os pontos que podem ser ligados.

No que se refere ao gameplay, o jogo é um point-and-click e funciona muito bem com os controles do Switch. Durante a maior parte do tempo não é possível andar livremente por nenhum cenário. Basicamente, você vai estar diante de um ambiente controlado em que é possível interagir com objetos, como monitores, teclados, câmeras etc. Em todos as cenas, você terá alguém funcionando como interlocutor, seja um texto, uma voz gravada, um personagem distante etc. A partir de suas interações vão ser apresentados, pouco a pouco, alguns puzzles que precisam ser resolvidos, e é assim que a história progride.






Dependendo do que você espere de um jogo como esse, aqui pode estar o maior ponto de frustração. Muitos puzzles são confusos, e os desenvolvedores não oferecem dicas suficientes sobre o que é preciso fazer em algumas situações. Assim, em alguns momentos, é preciso em um processo de tentativa e erro, até conseguir realizar a tarefa que lhe foi imposta. O curioso, depois, é perceber quão óbvio era o que devia ser feito, apesar de tudo parecer muito confuso no início.

Não esqueça os fones de ouvido

Toda a estética de Stories Untold é baseada nos anos 1980. Desde os objetos (computadores, gravadores, câmeras e tecnologia em geral) até a música, tudo remete àquela década. Aliás, a belíssima abertura que antecede cada um dos episódios já nos insere nesse ambiente.

No entanto, se os gráficos são apenas simples e competentes, a design de som é primoroso, e vale realmente a pena correr o risco de levar uns sustos utilizando fones de ouvido. É uma experiência muito diferente jogar imerso na ambientação ou apenas com o som da televisão. Os diálogos, atuações, sons dos objetos e de movimentações próximas... tudo é muito bem pensado e trabalhado, sendo realmente o ponto alto do game. Stories Untold me parece, assim, ser muito mais sobre sentir do que sobre acompanhar uma história. Ou melhor: a narrativa se constrói a partir das sensações do jogador.


Jogos mentais

Stories Untold apresenta um nível de imersão intenso. Misturando o conceito de um visual novel com as mecânicas do point-and-click, o jogo nos leva a explorar e, principalmente, sentir, situações em que a angústia e a tensão nos dominam. No entanto, não se trata de uma experiência apenas para os fãs do horror. O título, no final de tudo, parece lidar com aquilo que existe de mais visceral em cada um de nós: a nossa capacidade de sentir medo ‒ e de entender o medo como uma forma de proteção.

Prós

  • Design de som primoroso;
  • Boa localização para o português; 
  • Estrutura episódica bem elaborada;
  • Clima tenso e de mistério que prendem o jogador.

Contras

  • Mecânicas repetitivas;
  • Alguns puzzles são pouco intuitivos.
Stories Untold  — Switch — Nota: 8.0
Análise produzida com cópia digital cedida pela Devolver Digital

Pesquisador nas áreas de estética e cibercultura com Mestrado em Cultura e Sociedade (UFMA) e Doutorado em Comunicação (UnB). Além de escrever sobre jogos, produz o Podcast Ficções e tem um blog sobre literatura, filosofia e cotidiano.
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