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Análise: Bioshock: The Collection (Switch) — três sucessos estreiam em um console Nintendo

Os jogos, lançados há mais de uma década, são aclamados pela crítica e levam o jogador a um enredo digno de cinema.

A 2K ama o Nintendo Switch — sim! Por isso, trouxe grandes relançamentos para o console híbrido no fim de maio, das franquias XCOM, Borderlands e Bioshock. Neste texto, o mais importante presente na grande quantidade de conteúdo nos três jogos é apresentado, com um passeio pelo enredo, pelas características que os tornam excelentes, sem nunca deixar de lado os acertos e erros do port.


Bioshock é, com certeza, uma franquia que todo gamer já ouviu falar ao menos uma vez na vida. Ela foi apresentada ao mundo na forma de uma trilogia e teve seu desenvolvimento liderado pela Irrational Games, nascida em 1997, adquirida pela Take-Two Interactive em 2006 e encerrada em 2017. Uso, aqui, o termo liderado para deixar claro que o segundo game da trilogia, mesmo que tenha membros do time original, foi desenvolvido pela 2K Marin.

A estreia da série de jogos foi em 2007, com Bioshock, seguido de Bioshock 2 (2010) e finalizado com Bioshock Infinite (2013). Os dois primeiros se passam na cidade submersa de Rapture, construída pelo magnata Andrew Ryan visando criar uma utopia distante das opressões governamentais da década de 40. O último, porém, se passa em 1912 na cidade flutuante de Columbia, sem ligação com os dois jogos iniciais, mas herdando muitas características de gameplay e enredo.

O fato aqui é que todos os jogos lançados foram criticamente aclamados, sendo o segundo considerado o de menor sucesso. Isso torna-os muito próximos de The Elder Scrolls V: Skyrim (Switch), que ganha uma nova versão a cada geração de consoles. Passam-se os anos, e Bioshock continua sendo relançado para novas plataformas. Agora chegou a vez do Nintendo Switch.

Numa análise como esta cabe a difícil tarefa de, além de criticar jogos lançados há mais de uma década, remasterizados e já aclamados pelo público, avaliar o quão bem eles se saem no conforto híbrido do Nintendo Switch. O fato de estarem em um console portátil é diferente de qualquer outro relançamento de Bioshock e veremos todos os aspectos dessa experiência. Tanto os conhecedores da franquia como os que não a conhecem sairão desta leitura convictos: é uma boa escolha. Vamos lá!

Uma cidade, um homem e um farol

Em Bioshock, o protagonista é apresentado a Rapture, uma cidade submersa e cheia de ideais. Criada pelo magnata Andrew Ryan, a metrópole subaquática buscava se livrar de opressões governamentais e tornou o fundo do mar a moradia das mentes mais brilhantes do mundo. Lá, tecnologias muito superiores às da superfície surgiram e foi criado o cenário steampunk perfeito para a aventura dos dois primeiros títulos.

A porta de acesso do protagonista — Jack — é um farol no meio do oceano, encontrado após a queda do avião que o transportava. O gatilho, aparentemente simples, leva a um mergulho com descobertas progressivas sobre a cidade, e o guia dessa aventura é Atlas, o líder de uma rebelião contra Andrew Ryan. Jack deverá ajudá-lo a voltar à superfície com sua família.

Andrew Ryan, criador de Rapture e antagonista do primeiro título
Você já deve ter imaginado que as coisas não têm andado muito bem por lá. Tudo em Rapture foi sinal de progresso até a descoberta do Adam, um líquido extraído de moluscos capaz de modificar o código genético de seres humanos e dá-los superpoderes como eletricidade, fogo, controle mental e enxame de insetos. A substância tornou-se preciosa e deixou dependentes todos os habitantes que, sedentos por mais poderes, levaram a metrópole ao caos completo. As pessoas que sofrem dessa dependência são chamadas de Splicers.

Não bastasse o enredo interessante, ele levanta questões filosóficas sobre a nossa sociedade e deixa muitas outras abertas para a interpretação do próprio jogador. Um dos recursos mais interessantes para garantir isso são as gravações em rádios espalhados ao longo da jornada, que revelam depoimentos de diferentes pontos de vista sobre os acontecimentos. É uma das principais formas de entender o que ocorreu em Rapture. Não por acaso, a trama conta com reviravoltas dignas de cinema e é construída em um universo conciso e envolvente.

Da mesma forma, apresenta-se Bioshock Infinite. Mesmo situado em uma época anterior ao título original e geograficamente distante da cidade submersa, vários elementos se repetem: Booker DeWitt, o protagonista, deve salvar a garota Elizabeth para que possa limpar seu nome, pois suas atitudes do passado o condenam. O homem é levado a um farol no meio do oceano, que o leva para os céus, na cidade flutuante de Columbia.

Novamente, um homem — Zachary Comstock — é tido como líder da cidade e mantém cativa a moça que deve ser resgatada. A partir daí, constrói-se um cenário muito diferente, onde um culto ao profeta Comstock e a profecia do retorno do falso pastor (o protagonista) desencadeiam uma muito parecida série de eventos caóticos na cidade. Se, para você, isso já não é suficiente para ver as semelhanças, saiba que encontrará bebidas chamadas Vigors, que dão a seus consumidores poderes elétricos, flamejantes, mentais e outros — a variedade é muito grande.

Mesmo com premissas diferentes, há muitos pontos que conectam as histórias do primeiro e terceiro títulos, tornando-os Bioshocks — e essa é a marca registrada da franquia: num mesmo universo, enredos que levantam aspectos sobre a nossa sociedade, alguns superpoderes, cidades aparentemente utópicas e um mesmo objetivo: fugir.

Além de originais no roteiro, Bioshock 1 e Infinite têm estilos artísticos únicos e marcantes: o primeiro, sombrio e com cores neon, como uma cidade dos tempos modernos; o segundo, com muita luz, sons e cores vivas — os opostos entre o subaquático e o céu. Mesmo assim, nos 6 anos que distanciam o lançamento de ambos, nota-se o grande progresso nas questões gráficas e, também, na experiência da desenvolvedora. Por isso, aspectos como a trilha sonora evoluem ao longo da trilogia, passando da presença de poucas músicas de época para obras primas de composição em momentos decisivos.

Mas não se engane, não há melhor e pior entre o primeiro e o último jogos desta coleção. Ambos são excelentes e, se há uma forte recomendação aos leitores, é que possam experimentá-los.

O segundo título: um culto e uma garota

Falamos muito de Bioshock 1 e Infinite, mas ainda nos resta Bioshock 2 que, com seus erros e acertos é também uma excelente escolha, acredite. Nesta aventura, que se passa cerca de uma década após os acontecimentos do primeiro título, o protagonista encontrará uma Rapture destruída e tomada por uma líder de mente brilhante, Sofia Lamb, que almeja criar uma nova raça de pessoas perfeitas a partir da perfeição de sua filha, Eleanor. E, dessa vez, um aspecto muito específico da metrópole submersa é explorado: as Little Sisters e os Big Daddies.

Se o local da fuga estivesse assim escancarado, seria mais fácil.
Quando ainda estava em seu auge, Rapture era repleta de pessoas felizes e sedentas por Adam. Por ser um recurso escasso, era necessária uma fonte mais confiável do líquido que, eventualmente, envolvesse extrai-lo das pessoas que já não estão entre nós. Estudos dos cientistas mais renomados concluíram que, ao implantar no interior do corpo de garotinhas o molusco marinho gerador de Adam, elas seriam capazes de reaproveitar esse recurso dos mortos. Aqui surgem as Little Sisters.

Em geral, as garotas que vivem nos orfanatos são levadas a essa condição e tornam-se exímias exploradoras da cidade, farejando corpos para extrair mais Adam. Mas, conforme Rapture sucumbia ao caos, as pequenas não tinham mais proteção e eram atacadas por Splicers que queriam mais poderes. Então, prisioneiros homens tiveram seu corpo modificado para dar corpo aos Big Daddies, criaturas enormes e perigosas que criam um vínculo de sangue com uma única Little Sister, protegendo-a a qualquer custo.

O protagonista Delta, um Big Daddy, e sua Little Sister Eleanor
Em Bioshock 2, essa não é uma novidade — o título anterior já trazia essas criaturas e dava ao jogador a decisão de matar as Little Sisters, extraindo mais Adam, ou salvar a vida delas e obter uma quantidade menor da substância. O diferencial aqui está no protagonista: ele é um Big Daddy dos primeiros experimentos, chamado de Subject Delta, e a sua Little Sister é Eleanor Lamb — a garota a quem devemos salvar.

Assim, mesmo tendo um estilo artístico praticamente idêntico ao primeiro jogo, este traz um enredo completamente diferente, um pouco menos filosófico e mais focado no objetivo pessoal de salvar a garota.

Por isso, na época de seu lançamento e ainda hoje, Bioshock 2 decepciona um pouco por se parecer com um pacote de expansão do primeiro título, aproveitando o mesmo engine e os mesmos assets. Em um lançamento como o desta análise, na forma de uma Collection, é muito bom poder explorar e entender um pouco mais de Rapture em uma nova aventura, mas é fácil entender o descontentamento dos fãs que, lá em 2010, esperavam mais do título.

A mecânica de hack do primeiro título, que foi substituída em seu sucessor.
De qualquer forma, o segundo jogo não decepciona em melhorar tudo aquilo que não funcionou muito bem no primeiro: mecânicas como a de hack de câmeras e travas evoluíram para versões mais fluidas e menos frustrantes; a interface do game e interações do jogador foram refinadas e, por fim, o equilíbrio entre as três dificuldades disponíveis — fácil, médio e difícil — ficou bem mais claro, oferecendo desafios para jogadores menos experientes sem frustrá-los.

Um port e dois remasters

Até agora, falamos um pouco sobre o que define cada um dos títulos e o que os torna tão interessantes. Mas, é importante também destacarmos os aspectos que tornam (ou não) este um port adequado para o console híbrido da Nintendo, até porque muitos de vocês, leitores, já conhecem a aventura e querem saber como ela se sai no Switch.

Os títulos têm desempenho sem engasgos até em ambientes abertos.

Em questões de desempenho, não há dúvidas de que a qualidade gráfica foi reduzida. E, nesse aspecto, não são só texturas de menor qualidade, mas sim a quantidade de frames por segundo. Dos 60 quadros renderizados nas outras plataformas, aqui temos apenas 30 de forma estável. O que para muitos pode ser um fator determinante na escolha, não representou nenhum incômodo ao longo da jogatina. Prefiro que sejam possíveis os 30 fps estáveis do que taxas variantes e que causem desconforto.

Um aspecto visual e incômodo é o ajuste de brilho. Ao iniciar a aventura e a qualquer momento do gameplay, você pode ajustar o brilho dos gráficos renderizados — mas não o confunda com o brilho da tela do Switch. O ajuste manual deve levar o indicador até que uma caixa de cor cinza esteja quase invisível no fundo preto, deixando a iluminação do ambiente e objetos mais fortes.

O problema, aqui, está justamente na migração entre portátil e TV, pois o ajuste para jogar sob o Sol, por exemplo, é diferente daquele usado no conforto de seu quarto e pode se tornar frustrante sempre ter que fazer essas alterações, a ponto de desestimular a troca entre os modos do console. Aqui, poderia ter entrado o armazenamento de configurações diferentes para cada modo do portátil, o que sanaria o problema.

Por fim, mais uma vez o desconforto e imprecisão dos analógicos pequenos dos Joy-Con pode atrapalhar os jogadores principalmente no modo difícil, onde cada tiro conta. A opção de ajustar a sensibilidade dos controles pode até ajudar, mas é difícil acertar o ponto desejado de primeira. Senti falta da opção de controles de movimento, que encaixam muito bem para o ajuste fino do movimento realizado pelos analógicos. Já o uso do Pro Controller tornou muito mais agradável a experiência.

Fortemente recomendado

Bioshock: The Collection une três grandes obras da indústria do entretenimento, que influenciaram vários outros títulos subsequentes de ambientação steampunk. Não há dúvida, portanto, que esta é uma coletânea indispensável no Switch para aqueles que nunca a experimentaram antes. Há alguns pequenos problemas na migração para o console que poderiam ser acertados, sim, mas nada que prejudique a excelente — e filosófica — jogatina. Num texto como esse, em que muita informação é comprimida em uma única análise, resta a sugestão: jogue e descubra todo o restante, você não irá se arrepender.

Prós

  • Oportunidade de reviver três enredos intensos e cheios de reviravoltas;
  • Duas cidades construídas nos mínimos detalhes a serem exploradas;
  • Incrível produção artística que contrasta o céu e o fundo do oceano.

Contras

  • Problemas no ajuste de brilho ao migrar entre modo docked e portátil;
  • Ausência de controles de movimento.
Bioshock: The Collection — Switch/PC/PS4/XBO — Nota: 9.5
Versão utilizada para análise: Switch
Análise produzida com cópia digital cedida pela 2K Entertainment
Revisão: André Carvalho

É diretor de redação do Nintendo Blast e fã de games desde pequeno, quando começou sua jornada com Mario e Zelda lá no SNES. É formado na área das engenharias e trabalha com desenvolvimento de software. Quando sobra um tempinho entre as jogatinas e o dia a dia, aparece lá no Twitter como @niccomch.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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