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Análise: Fairy Tail (Switch) é um RPG ótimo para fãs da série

Primeiro game da série japonesa é bastante sólido e divertido, mas pode se fechar demais ao fandom do mangá por focar nos últimos eventos da história.




Dos lançamentos desse ano, um dos que mais me chamaram a atenção era Fairy Tail (Switch). Não somente por ser sobre a série de mangá/anime que eu gostava de acompanhar, mas também por ser um game desenvolvido pela Gust, uma das desenvolvedoras que eu criei apreço nestes últimos anos ao jogar seus JRPGs.


Antes mesmo de iniciar a análise já devo alertar que esse jogo se passa no meio da história de Fairy Tail para o final, ou seja, é bem possível que eu fale spoilers da série nesse texto. Caso você queira se contextualizar sobre a história, o jogo começa ao final do arco da “Ilha Tenrou”, que se passa entre os capítulos 200 a 253 do mangá e os episódios 96 a 122 do anime.

A gameplay começa no arco “X791”, que se inicia no capítulo 254 e episódio 123. Eu pretendo evitar ao máximo os spoilers, mas como a gameplay do jogo é baseada nos acontecimentos da história para que certas mecânicas existam, será inevitável comentar pontos-chave do enredo. Se você não se sentir confortável, pode se contextualizar sobre a história e retornar mais tarde!

Se reconstruindo das cinzas

Dados os devidos avisos, bora para a análise! O game se inicia justamente após os 7 anos de sumiço dos maiores magos da guilda Fairy Tail, que estavam adormecidos graças a um poderoso feitiço que os protegeu da morte. Durante esse tempo, a guilda foi perdendo sua notoriedade e foi se afundando em dívidas por não ter mais magos tão poderosos para manter a sua reputação como a melhor do reino de Fiore.


Quando os membros acordam de seu sono de 7 anos, precisam levar Fairy Tail de volta às suas origens e é aqui que a gameplay se inicia. Para trazer a guilda de volta ao estrelato, o jogador deverá realizar missões pequenas (e repetitivas) para evoluir os magos para que eles possam compensar os anos adormecidos. Sem contar que a guilda é considerada a pior de todas e seu prédio, que uma vez foi grandioso, hoje é um casebre. As missões realizadas ajudam a melhorar a reputação, com premiações em dinheiro para que o jogador possa melhorar a infraestrutura do prédio.

Como o jogo se inicia quase que no meio da história completa da série, o jogo acaba se direcionando praticamente para a parcela dos jogadores que conhecem a série até um certo desenvolvimento da história. O que pode não ser muito interessante para quem se interessou por Fairy Tail agora, mas pensando na estrutura de um RPG e de um videogame em geral, a escolha desse arco faz todo o sentido para que mecânicas de nível sejam implementadas.

Pois o começo do mangá se passa com muitos personagens e muito mais desenvolvimento em suas habilidades, como Natsu, Gray e Erza, por exemplo. Com os acontecimentos da “Ilha Tenrou” temos um nivelamento que casa com o desenvolvimento do enredo, o que torna a experiência melhor como um todo. O problema é que pode afastar quem não é familiarizado com a história.


Por mais que os eventos do jogo tentem contextualizar as origens de certas relações ou desfechos de arcos, muitas delas se tornam supérfluas para a história, não trazendo o peso real de desenvolvimento. Um exemplo são as histórias pregressas de vários personagens que vão ganhando desfechos ou revelações durante o enredo do jogo, mesmo com as inserções e explicações adicionais, e quem não conhece a história só vai ficar mais confuso.

Histórias de magos e lutas

Escolher o gênero RPG para trazer Fairy Tail aos games foi uma escolha de mestre. Geralmente jogos originados de anime shōnen (voltados para o público masculino mais adolescente) gostam de resultar em games de luta 3D. Alguns tiveram grande sucesso, como as séries Dragon Ball Z Budokai Tekaichi e Naruto Ninja Storm. Porém, já vimos animes fantásticos virarem jogos bem medianos por utilizarem todos o mesmo gênero.

Mas esse não é o caso com o game analisado aqui, pois se tem uma coisa que a Gust sabe fazer é um JRPG bom que parece com um anime interativo. E é exatamente assim que podemos resumir este game: parece que nós estamos assistindo aos episódios do anime enquanto controlamos os protagonistas durante a aventura.


Pois o conteúdo original se tornou um sucesso pelos personagens carismáticos, comédia e lutas muito bem desenvolvidas. Todos esses elementos conseguiram ser bem combinados dentro do jogo, em maior e menor grau.


O legal é que no mangá original os personagens mudam seus times para realizar missões específicas e isso também ocorre no jogo. Há missões primárias e secundárias que exigem magos específicos para realizá-las, estas têm como foco um desenvolvimento menor de história, mas que contribuem para expandir outras mecânicas que auxiliam na campanha principal. Além do jogador poder escolher com quais personagens vai querer seguir.

Aconselho que você tente administrar os personagens que possui à disposição, pois há 16 deles no total - que serão desbloqueados de forma gradual e há mais 4 disponíveis via DLC - e ter apenas três ou quatro personagens mais poderosos pode te complicar quando certas missões mais exigentes precisarem de um personagem mais fraco no time.

E como evoluímos os personagens? Batalhando, claro! O game tem uma mecânica de batalha bem simples, com estilo clássico de turnos no qual o jogador pode ter até 5 magos ao mesmo tempo, enquanto os inimigos ficam dispostos em um quadrado de 3 por 3. Os movimentos são de defesa, uso de itens e atacar com poderes mágicos ou um mero ataque físico, que não consome da barra de magia.


A mecânica de batalha não é nem um pouco inovadora e a única novidade é a possibilidade de um grande ataque em grupo que só ocorre se o jogador desenvolver os laços de amizade dos personagens fora das batalhas. É algo bacana, pois amplia as possibilidades e qualidade das lutas e instiga o jogador a explorar as sub-tramas do game, que são peças exclusivas de história.


Outra possibilidade é a ampliação das habilidades ao passo que a história progride, como Natsu poder comer fogo dos inimigos desse elemento, ou colocar os personagens em seus modos mais poderosos (não vou dar exemplos, pois isso também seria spoiler da história).

Todas as mecânicas do jogo rodeiam as batalhas, não há minigames ou qualquer outra demanda no jogo que não esteja voltado a lutar ou conseguir aprimorar seus personagens para batalhas. Mas não significa que há apenas isso para fazer.

Explore Fiore e melhore a Guilda

Mesmo de forma limitada, a Gust conseguiu colocar o seu toque especial no jogo, trazendo traços de sua série original para complementar a gameplay de Fairy Tail. A empresa é conhecida pela franquia Atelier, um JRPG relativamente conhecido e que possui várias análises aqui no Blast. Fizemos um rápido guia para quem gostaria de conhecê-la.

Mas o que podemos fazer em Fairy Tail além de lutar? Bem, nos cenários há itens que o jogador pode coletar e utilizá-los para cumprir side-quests para cidadãos que habitam a terra de Fiore e sintetizar Lacrima, que são pedras mágicas que ajudam a tunar os personagens em batalha.


O processo de síntese é bem simples, ao aprimorar o laboratório de desenvolvimento de Levy — uma das magas da guilda e personagem disponível por DLC — o jogador deve recolher materiais para produzir as pedras mágicas. No menu principal, é possível ver quais qualidades a Lacrima criada e/ou encontrada vai trazer ao personagem. Um ponto bacana é que, se você não tiver paciência para equipar os lutadores, o próprio jogo faz isso por você se quiser.

Além disso, podemos arrecadar dinheiro e materiais para melhorar a guilda, há espaços dentro do estabelecimento que podem ser aprimorados e, consequentemente, desbloquearemos novas qualidades aos magos do time, garantindo melhores itens para compra e uma síntese para as Lacrimas mais poderosas.

Qualidade cinematográfica, em baixa resolução

Olha, Fairy Tail possui uma animação surpreendentemente boa, até mesmo para os padrões de animação da Gust. Não me leve a mal, mas eu nunca achei que as animações da série Atelier fossem grandes coisas, mas nesse jogo elas são, mesmo com as cenas mais simples sendo usado uma movimentação repetitiva. As animações de batalha são feitas com bastante cuidado e as cutscenes… são tão boas que eu vou deixar o próximo parágrafo para falar delas.

No jogo existem as animações de história mais comuns e também animações que são feitas fora da engine do jogo. Essas têm uma qualidade digna de uma animação 3D para assistir. A movimentação dos personagens e o tratamento de luz são ótimas e faz você se perguntar “por que o resto do jogo não é assim?” Realmente parece que estamos vendo uma versão 3D do anime, o que é uma experiência ótima, uma pena que essas animações não são muito frequentes.


No entanto, o maior contato que teremos com os gráficos desse jogo não é a melhor das experiências. Fairy Tail peca e muito no que apresenta do trabalho visual. Antes de ter o jogo em mãos, os gráficos não eram uma preocupação, pois a Gust sempre entregou jogos que performavam incrivelmente bem no Switch graficamente, mesmo comparando com as suas versões para PS4 e PC. Infelizmente, esse feito não se repete aqui.

Fairy Tail chegou ao Switch como um port não atualizado de um jogo para PS2, as texturas são de qualidades duvidosas e quando são aplicadas aos cenários e modelos dos personagens, a experiência só piora. Um exemplo simples é como vemos os detalhes nos personagens, fica tudo pixealizado e nada prazeroso de se ver. Até mesmo o símbolo das guildas fica descaracterizado, quando visíveis.

Ao meu ver, os cenários do jogo são bastante genéricos e quase desassociados do universo dos personagens. Enquanto o estilo dos personagens é cartunesco e colorido, os cenários se parecem de qualquer jogo mais voltados ao realismo e, apesar do traço do autor, Hiro Mashima, ser esse para desenhar o ambiente, acredito que seria possível um ajuste para que eles se conectassem melhor. Talvez uma saturação maior nas cores, ou até mesmo tornar os objetos mais cartunescos.


E o problema das texturas se alastra nos cenários, há elementos inteiros que foram trocados por uma imagem em baixa qualidade. Podemos ver isso com maior evidência em portas que deveriam ser modeladas em 3D, mas são planas com detalhes desenhados. Não nego que esses pontos são menos perceptíveis no modo portátil, mas é só colocar o Switch na Dock que o show de horrores se inicia.

De qualquer forma, esses elementos não estragam a experiência do jogo de forma completa. Ainda temos um título sólido e muito divertido, mas que poderia ter ficado um pouco mais de tempo em desenvolvimento para melhorar esses gráficos.

Vale entrar da guilda?

Devo dizer que a experiência de jogar Fairy Tail é muito boa se você conhece a obra original. O game captura muito bem a essência do anime e te faz sentir naquele universo, todas as vozes, músicas, estilo artístico e a escrita fazem o material fonte brilhar nessa mídia nova.

Enquanto RPG, temos um título sólido dentro do gênero, recheado de coisas para fazer e, mesmo muito focado em batalhas, o jogador não fica desamparado se quiser apenas focar no enredo. As histórias trazem toda a comicidade que esperamos dos personagens e o desenvolvimento segue em um ritmo bem similar a de um anime mesmo, então é possível desfrutá-lo ao mesmo tempo em que se diverte nas batalhas.


Um único ponto negativo são as transições entre batalha e história, muitas vezes ocorrem de forma bem desnecessária. Um exemplo é precisar dar dois passos com o personagem para iniciar um evento com um rápido diálogo e uma luta, por que não já iniciá-lo? Ajudaria a manter um ritmo mais dinâmico.

Num geral, é um ótimo título de estreia e espero que dê espaço para mais Fairy Tail nas mãos da Gust e que eles possam investir melhor para produzir games mais completos e criar uma série longeva da franquia. Com sorte, não veremos esses gráficos novamente.

Prós

  • Game captura a diversão e comédia da obra original;
  • Variedade de conteúdo complementar à campanha principal;
  • Cutscenes e animações bem produzidas;
  • Modo de batalha sólido e divertido.

Contras

  • Gráficos de qualidade duvidosa;
  • Sem localização para o português;
  • As missões mais simples são bastante repetitivas;
  • A história já desenvolvida pode afastar quem não é familiarizado com o mangá.
Fairy Tail - Switch/PS4/PC - Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Felipe Fina Franco
Análise realizada com cópia digital cedida pela Koei Tecmo

Estudante de Sistemas da Informação que gostaria de aprender todas as línguas existentes, mal sabendo lidar com as duas que já fala. Descobriu seu amor pela Nintendo ao conhecer Super Mario 64 e desde então nunca mais largou os cogumelos, karts e rúpias que encontrou em seu caminho.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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