Jogamos

Análise: WWE 2K Battlegrounds (Switch) entra no ringue com boas ideias, mas é nocauteado com más execuções

O jogo é um aprimoramento em relação a títulos anteriores da franquia, mas possui problemas em seu sistema de luta, performance e economia in-game.


Se eu tivesse que fazer uma lista dos meus maiores prazeres secretos, luta livre televisionada provavelmente estaria entre as primeiras posições. Não sou daqueles que sabem de tudo do chamado telecatch, mas me divirto sempre que assisto às disputas coreografadas, às encenações exageradas e às narrativas cheias de dramas dignos de novelas. Como diria minha irmã, também apreciadora do esporte, a modalidade é entretenimento puro. E não há nenhuma empresa que soube crescer com esse tipo de entretenimento como a WWE, a maior companhia do ramo no mundo.


Porém, nos games, a instituição norte-americana esteve em maus lençóis nos últimos anos. WWE 2K20 (Multi) foi duramente criticado por seus constantes bugs e loot boxes. Dois anos antes, jogadores de Nintendo Switch receberam uma versão de WWE 2K18 cheia de problemas de performance. Com a repercussão negativa, a publicadora 2K Games cancelou uma sequência numerada da franquia e apostou em uma outra abordagem com WWE 2K Battlegrounds.

Desenvolvido pela Saber Interactive, conhecida por produzir o port de The Witcher 3: Wild Hunt – Complete Edition para o Switch, o título traz mecânicas de jogos arcade às lutas, assim como NBA 2K Playgrounds 2 fez com o basquete. O resultado é um lançamento que, apesar de não possuir os mesmos problemas de seus antecessores e ter um gameplay promissor, é restringido por batalhas desbalanceadas, algumas questões de performance, economia in-game que privilegia as microtransações e uma incompreensível exigência de se estar sempre online para progredir.

WWE cartum

O principal aspecto que diferencia Battlegrounds dos demais jogos da marca é sua apresentação. Modelos fotorrealistas dos astros da WWE dão lugar a representações mais caricatas, com braços, pernas e cabeças grandes. As arenas, na maior parte, se localizam em espaços inusitados, como um pântano na Flórida ou em um castelo na Escócia, em vez dos ringues característicos dos campeonatos reais. Já a plateia se limita a algumas pessoas, em contraste às milhares que comparecem aos ginásios com seus cartazes. É tudo mais simples, sem necessidade de retratar o esporte como é de verdade.
Comparações com os mini craques do futebol são inevitáveis.


No início, essa espécie de descompromisso com a realidade agrada. Quem gosta de jogos como NBA Jam sabe que parte da graça é ver seus atletas favoritos em um estilo completamente novo. É justamente o que acontece aqui. É divertido ver nomes como John Cena, The Undertaker, The Rock, Ronda Rousey, Sasha Banks e Asuka reinterpretados para esse mundo mais cartunesco, incluindo suas entradas no ringue, que, apesar de menos glamourosas (os lutadores saem de dentro de uma caixa caída do céu, para se ter ideia), possuem características que remetem às introduções na vida real. Há um certo charme que se expressa nas primeiras horas do jogo.

Porém, essa diversão não dura muito. Com o tempo, as entradas, que sempre usam as mesmas animações e ângulos de câmera, começam a se tornar repetitivas. Vê-las várias e várias vezes torna mais evidente a falta de polimento na construção dos personagens. Apesar de exibirem muitos movimentos corporais, os lutadores não possuem muitas expressões em seus rostos, que se mantêm com um semblante vazio que chega a ser inquietante.
A falta de expressões dos personagens e a plateia apática dão um ar de gráficos inacabados, mesmo com a simplicidade do estilo artístico.
Além disso, em uma olhada mais minuciosa, é possível ver como as pessoas na plateia são genéricas, ficando imóveis na maior parte do tempo ou realizando gestos e animações que começam e terminam do nada. Por mais que a direção de arte do título tenha a intenção de ser mais caricaturesca, a sensação que fica é que ela não aproveita a tecnologia das plataformas atuais e se limita a um visual semelhante ao de uma ou duas gerações atrás.

É nessa dinâmica de “um passo para frente, dois para trás” que o jogo baseia todo o seu design, da mecânica de luta à progressão por meio de moedas in-game.

Lutas simples, mas rasas

Como todo título arcade que se preze, a proposta de WWE 2K Battlegrounds é transpor todos os movimentos quase super humanos das estrelas do esporte para comandos fáceis de se executar nos Joy-Con. E isso ele faz muito bem. Com botões dedicados para socos, chutes e defesa, é muito tranquilo realizar combos poderosos. Nada de meias-luas ou coisas parecidas. Basta apertar uma sequência de três botões para fazer um ataque que pode desorientar o adversário.
Quando combos são executados com sucesso, efeitos flamejantes são utilizados.

Mas a graça está em quando o jogo mistura esse sistema de combate com seu perfil mais cartunesco para criar golpes incrivelmente exagerados. São ganchos que jogam o oponente metros acima da arena, agarrões que giram os competidores no ar pelos calcanhares e voadoras que deixam os pés pegando fogo. Por sorte, todos esses movimentos também são simples de efetuar, exigindo que se pressione um dos gatilhos junto com os botões de ataque simples ou somente que se incline o analógico direito para alguma direção.

O jogador também precisa administrar uma barra de vida, que quanto mais vazia, mais difícil se torna para o lutador escapar de uma imobilização; uma barra de energia, que precisa estar cheia para executar certos movimentos; uma barra de super, que ativa um ataque muito forte quando completada; uma barra de torcida, que enche à medida que se faz movimentos pedidos pela plateia, facilitando imobilizações nos adversários; e três power-ups que variam entre atributos como combos mais fortes, regeneração de vida e até mesmo um bafo de gelo que paralisa inimigos.

Soma-se a isso o fato de que cada lutador possui uma classe diferente, podendo ser mais pesado e lento, mas forte; ótimo em manobras aéreas, mas péssimo em agarrões; ou regular em todos os quesitos.
Um golpe complexo, mas simples de ser executado com o analógico direito.

Parece muita coisa para se prestar atenção ao mesmo tempo, mas devido ao combate simples, todas essas peças acabam se encaixando e permitem que estratégias possam ser criadas contra certos lutadores ou em certos tipos de disputa. É um sistema de batalha que é capaz de divertir, mas que não alcança seu potencial devido a um desbalanceamento em um de seus componentes: o counter.

Caso a barra de super esteja cheia o suficiente, é possível reverter movimentos adversários apertando o botão certo durante as animações. No entanto, o indicador que mostra qual botão apertar aparece muito brevemente na maior parte das vezes, dando pouco tempo para reagir. Assim, o jogador vai à lona e deve apertar o botão B repetidamente para se recuperar. Mas nisso o oponente já realizou outro golpe difícil de ser revertido. Cria-se assim um loop em que tomar o controle da luta fica muito difícil, ao ponto de se tornar injusto, principalmente contra CPUs em altas dificuldades. Até é possível que quem esteja jogando utilize esse ciclo a seu favor, mas aí as contendas ficam previsíveis, pois utilizam a mesma sequência de golpes todas as vezes.
Revidar os ataques dos adversários é algo difícil de fazer no meio do confronto.

Battlegrounds também tenta diversificar um pouco a dinâmica da pancadaria ao adicionar elementos interativos nos cenários e itens. Ambos seguem a linha arcade e incluem de objetos comuns como cadeiras e martelos de brinquedo a coisas mais absurdas, como motocicletas, ataques de jacarés e cabras comandadas por controle remoto. Apesar de engraçados, esses componentes não alteram o desenvolvimento das lutas de maneira significativa, trazendo pouco incentivo para utilizá-los.
Jogar os outros aos crocodilos é divertido, mas é indiferente ao andamento da luta.

Quebra-pau inconstante

Apesar de o combate desbalanceado afetar todos os principais estilos de disputa de WWE 2K Battlegrounds, alguns são mais agradáveis do que outros. Lutas com somente dois lutadores em cena, como exibição 1v1, Steel Cage (em que personagens devem coletar o máximo de dinheiro para fugir de um ringue cercado por uma jaula) e Gauntlet (em que deve-se vencer uma série de desafiantes um seguido do outro) são mais divertidas por serem mais diretas e não ter tantos elementos interferindo na partida. O Steel Cage é um destaque, pois adiciona um elemento de risco e recompensa ao combate, já que o adversário pode puxar o jogador de volta para a jaula.
As disputas de Steel Cage são divertidas, pois possuem muitas reviravoltas.

Porém, todas as outras configurações que envolvem mais de dois lutadores no cenário são incômodas. A performance do jogo fica inconstante em confrontos com três ou quatro pessoas, em tag matches e no Royal Rumble, em que sobrevive aquele que não for jogado para fora do ringue por mais tempo. Mesmo mantendo a taxa de quadros por segundo na faixa dos 30 fps na maior parte das vezes, há momentos em que o título trava por um ou dois segundos após um golpe especial ou um efeito de eliminação, atrapalhando o ritmo do gameplay. Também é possível notar glitches de animação, em que os modelos se teletransportam do nada no meio do ataque.
Batalhas com três ou quatro lutadores ao mesmo tempo são meio caóticas.

Além disso, a inteligência artificial das CPUs não é lá muito inteligente nas batalhas com muitas pessoas. Em vários momentos, elas obstruem a visão da ação, dificultando a compreensão do que está acontecendo, especialmente na tela portátil do Switch. Em outras situações, elas agem de maneira incoerente. Por exemplo, é comum se preparar para atacar um adversário específico e bater em outro, controlado pelo jogo, simplesmente porque ele estava no meio do caminho; ou então a CPU inimiga impedir a imobilização de seu colega por vezes seguidas numa partida de tag, mas ficar imóvel em uma das tentativas sem motivo algum. É como se sua programação estivesse constantemente lutando consigo mesma.

Isso faz com que os principais modos do jogo fiquem maçantes de se experimentar. O modo Campanha coloca o jogador na pele de sete desconhecidos que lutam para ganhar seu lugar ao Sol no maior torneio da WWE, o Wrestlemania. Embora tenha uma apresentação relativamente agradável, com histórias em quadrinhos originais contando os principais momentos da narrativa, sua estrutura se baseia em completar uma série de lutas com diferentes regras uma atrás da outra para destravar power-ups, arenas e novos personagens. É algo que começa divertido, mas que, após mais de cinco horas de gameplay, fica cansativo.
A história do modo Campanha é contada por meio de HQs.

Esse mesmo design é aplicado no modo de desafios para personagens customizáveis. Battlegrounds permite que usuários criem seus próprios combatentes e arenas em um sistema de customização que é surpreendentemente profundo e detalhado. É possível alterar características físicas do personagem, roupas, animações, ataques especiais e, no caso dos ringues, pormenores como cor das cordas, estilo da plateia e padrões dos fogos de artifício do palco. É divertido criar principalmente os lutadores, mas, na hora de aumentar seus poderes, é necessário passar pelo Battleground Challenge, modo que consiste em cerca de 100 lutas que destravam habilidades, exigindo muito tempo para evoluir no game com lutas medianas.
Essa é a gigantesca árvore de desafios pelos quais o personagem customizável deve passar para se fortalecer.

Economia de quebrar as pernas

Há um recurso ainda mais controverso que dita a experiência geral de WWE 2K Battlegrounds: os Battle Bucks e Golden Bucks. Ambos são moedas digitais, sendo que os primeiros são conquistados jogando os diferentes modos e os segundos podem ser adquiridos com dinheiro real. Parte do conteúdo do título pode ser desbloqueado usando-os e a 2K Games ressalta que tudo pode ser destravado de graça com os Battle Bucks, o que realmente é verdade. No entanto, a publicadora esquece de avisar que muito do que o game oferece está atrás de paywalls excessivamente grandes para essa modalidade gratuita, o que incentiva as microtransações.

Uma quantidade enorme de coisas precisa dessas moedas para ser acessada: mais de 40 astros da WWE e seus cerca de 80 figurinos alternativos; mais de 90 itens, acessórios e poderes para os lutadores e ringues customizáveis; três tipos de aprimoramento para cada power-up; e até modos online. Cada uma delas exige um valor que varia de 1 mil a 12 mil Battle Bucks, enquanto uma luta vencida oferece cerca de 350 moedas desse tipo ao jogador. A matemática é clara: para conseguir tudo de graça, é preciso jogar muito.
Personagens lendários custam 12 mil Battle Bucks para serem destravados, com skins alternativas que custam 6 mil cada.

Enquanto isso, a quantia de Golden Bucks necessária para esses mesmos conteúdos fica na casa das centenas e o pacote mais barato à venda na Nintendo eShop oferece 500 deles. Ou seja, é muito mais fácil destravar tudo usando pagamentos de verdade. O título até tenta balancear essa dinâmica por meio de achievements diários, de um sistema de níveis que aumentam com pontos de experiência e de campeonatos online, todos premiando com os Battle Bucks gratuitos. Mesmo assim, a quantidade de desbloqueáveis é tanta que acaba não fazendo muito diferença. E o fato de alguns torneios pela internet terem encontrado dificuldades no matchmaking, mesmo com o crossplay entre consoles, também não facilita.

O que torna toda essa economia in-game ainda mais questionável é uma incompreensível necessidade de o jogo estar conectado à web para ela funcionar. Estando offline, é impossível receber Battle Bucks após os duelos ou por meio das conquistas diárias. Sem internet, o game também desativa algumas funções, como a capacidade de ganhar XP para aumentar níveis, a possibilidade de entrar no Battleground Challenge para melhorar seu personagem customizável e até mesmo a opção de criar lutadores e arenas.
Praticamente todo o sistema de progressão do game é desativado quando se está offline.

Porém, o mais desconcertante é que, estando desconectado, não é possível destravar novos atletas Superstars, mesmo com moedas já obtidas anteriormente. Eles simplesmente somem do menu. Isso faz com que jogar sem internet seja tempo perdido, pois absolutamente nenhum progresso relevante pode ser feito. Além disso, nada do que foi conquistado é salvo na nuvem via Nintendo Switch Online, pois o jogo não é compatível com o serviço. Então, torça para não perder seu save, senão terá que começar do zero.

Potencial perdido

WWE 2K Battlegrounds veio para corrigir a rota desastrosa que a série de luta livre vinha seguindo. De certa forma, ele faz isso, mas, ao voltar para o caminho certo, acaba encontrando um monte de problemas e acaba sendo nocauteado.

A apresentação é charmosa, mas demasiadamente genérica e inexpressiva. Seu combate é intuitivo, mas alguns de seus fatores tornam as disputas previsíveis ou injustas. Os ringues são criativos, mas seus elementos não fazem muita diferença na jogabilidade. Alguns modos de batalha são bons, mas outros são prejudicados por problemas de performance e inteligência artificial. Há muitos desbloqueáveis, incluindo vários lutadores, mas o processo para obtê-los incentiva microtransações com dinheiro real. A lista é longa.

Como eu disse no começo, o telecatch está nos primeiros lugares da minha lista de prazeres secretos. Battlegrounds pode até entrar nesse ranking, mas dificilmente estará no topo.

Prós

  • Apresentação inicialmente agradável, com personagens, cenário e golpes cartunescos;
  • Sistema de luta intuitivo, com potencial para se criar estratégias;
  • Modos um contra um são mais divertidos, especialmente aqueles que adicionam fator de risco e recompensa às batalhas;
  • Robusto modo de customização de personagens e arenas.

Contras

  • Falta de polimento nos modelos dos lutadores e dos espectadores da plateia, aparentando jogos de gerações passadas;
  • O desbalanceamento nos counters das lutas torna difícil revidar os oponentes, ao ponto de se tornar injusto;
  • Itens e elementos dos cenários pouco interferem nas partidas;
  • Lutas com três ou mais personagens sofrem com problemas de performance e de inteligência artificial dos CPUs;
  • Modos de jogo que exigem que se jogue muitas disputas para avançar, tornando-se cansativos;
  • A economia in-game incentiva a compra real de conteúdo para destravamento rápido de itens;
  • É necessário estar sempre online para obter moedas digitais gratuitas, para destravar alguns conteúdos e para acessar certos modos.
WWE 2K Battlegrounds - Switch/PC/PS4/XBO/Stadia - Nota: 6.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela 2K Games

Jornalista, analista de mídias, PcD e entusiasta de games desde que jogou Pokémon Azul no Game Boy Color nos anos 90. De lá para cá, tenta aproveitar ao máximo todos os consoles no pouco tempo que a vida adulta permite. Se não está escrevendo para o Blast ou demorando anos para zerar um jogo, está no Twitter (@DanielMorbi) e no Instagram (@danielmorbi_)
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google