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Análise: Birthday of Midnight é cativante e bem inspirado, mas por muito pouco tempo

Um título bem-vindo para jogadores casuais de action-puzzle.




Desenvolvido pelo estúdio independente Petite Games e publicado pela Ratalaika Games, Birthday of Midnight (Switch) é um carismático jogo 2D de action-puzzle com mecânica ao estilo de minigolfe. O título é ambientado em uma noite de aniversário solitária e repleta de desafios distribuídos em mais de 70 níveis separados entre “fáceis”, “moderados” e “difíceis”.


De modo geral, o jogo é um pequeno encanto, em termos de estética, física e simplicidade de gameplay. Contudo, apesar da brevidade da campanha, trata-se de um encanto que tende a se perder em meio à monotonia e à falta de criatividade em seu level design. Confira mais detalhes nesta análise.



Uma estética simples, carismática e solitária

Algo que não dá para se dizer de Birthday of Midnight é que ele não seja suficientemente bem inspirado, ao menos quanto à sua arte e roteiro. Em todo lugar, afinal, é fácil fazer paralelos com excelentes clássicos indies. A começar por sua narrativa simples e inusitada que lembra, não em conteúdo, mas em forma, como começa e termina The Binding of Isaac (Multi).

Em síntese, o enredo de Birthday of Midnight pode ser facilmente descrito como uma série de desafios subterrâneos enfrentados pelo protagonista (Midnight) após, no meio de sua comemoração de aniversário, cair em uma fenda na terra; a qual abriu-se subitamente abaixo do personagem. A partir disso, o objetivo do jogador será conduzi-lo de volta à superfície para reencontrar seus familiares e comer seu merecido bolo.




Do ponto de vista visual, talvez os paralelos mais fáceis sejam Limbo (Switch), Super Meat Boy (Multi) e World of Goo (Multi), ainda que Birthday of Midnight esteja muito longe de alcançar o nível de excelência expressiva de Limbo e menos ainda o nível de engenhosidade dos dois últimos títulos mencionados.

O título da Petite Games é todo desenhado em cenários escuros, cavernosos, com um fundo levemente azulado e focos de luz quase sempre brancos (mas, às vezes, avermelhados). Pelo caminho, encontram-se também vários objetos (balões, alavancas, engrenagens etc.) e placas com dicas, avisos e comentários de humor, lembrando a mesma função desses objetos em World of Goo, embora as placas do mundo de Midnight não sejam empregadas com a mesma maestria do memorável pintor de placas (Sign Painter) de World of Goo.




Infelizmente, as placas de Birthday of Midnight não são utilizadas tão bem quanto poderiam. Seus avisos costumam ser óbvios, nem sempre suas dicas são úteis e muitas vezes os comentários não são suficientemente bem-humorados, mesmo que também haja pontos altos nesse último aspecto. Além disso, a existência dessas placas é pouco integrada com o enredo do jogo.

Para ficar em apenas um exemplo de placa mal implementada, há um momento em que uma delas aparece avisando o jogador que existem cubos que desaparecerão ao serem tocados. Contudo, essa mecânica já havia sido experimentada em fases anteriores, de modo que esse comentário seria mais útil na ocasião da introdução dessas caixas.




Por tudo isso, o emprego das placas, ainda que um bom adicional ao título, torna-se um elemento que pode vir a ser progressivamente ignorado pelo jogador; especialmente quando precisar gastar ações desnecessárias para se aproximar delas e poder lê-las.

De resto, a ambientação pode soar um tanto monótona, mas funciona bem em passar um ar carismático e solitário. Um forte suporte para essa boa ambientação é a trilha sonora de piano, quase sempre em tom menor e ritmo lento ou moderado. Ainda que conte com poucas e simples composições, todas são harmonias minimalistas bem construídas em seus detalhes, consistindo de acordes arpejados e melodias bem espaçadas com tom levemente tenso, de suspense e mistério, que pode se encerrar com um “final feliz”, ao passar de uma fase, ou com um soco nas teclas graves do teclado, caso o jogador caia em alguma armadilha. Confira no vídeo abaixo um pouco da dinâmica da trilha sonora.

Gameplay consistente e intuitivo, mas com uma progressão repetitiva e mal planejada

A jogabilidade de Birthday of Midnight é bastante intuitiva. O gameplay pode ser resumido a lançar o personagem em forma de cubo na direção apontada por um dos analógicos, cuja força também é determinada pela pressão exercida no analógico em determinada direção. Contudo, o controle do personagem pelo analógico não é muito preciso, principalmente no Joy Con, e continua impreciso também pela tela sensível ao toque.

Fora essa mecânica básica, herdada do título anterior do estúdio, Midnight Deluxe (Switch), há poucas novidades, e essas infelizmente não foram bem aproveitadas. Entretanto, são visíveis melhoras em vários pontos, como no enredo, ainda que simples, no tamanho da campanha (agora há mais que o dobro de fases) e nos novos elementos interativos durante o gameplay.

O jogador agora também precisará interagir mais com certos objetos, obstáculos e outras variáveis de alguns cenários. Há momentos, por exemplo, em que o jogador precisará entrar em portais para chegar a outro local, coletar chaves ou mover alavancas para liberar alguns caminhos ou até utilizar forças gravitacionais a seu favor.

Sua simplicidade mecânica, porém, não é nenhum problema em si. Prova disso é que muitos jogos incríveis, como Super Meat Boy e Limbo, já foram baseados em poucas mecânicas tão simples e intuitivas quanto e, no entanto, conseguiram entregar experiências criativas, marcantes e variadas. Infelizmente, esse não é o caso de Birthday of Midnight.

A cada nova mecânica introduzida, como caixas que desaparecem, balões, portais, lasers, gravitação etc., é possível imaginar muitas ideias interessantes a serem exploradas em fases posteriores, mas acaba que raramente surgem fases que desenvolvem bem o potencial dessas mecânicas. O que não significa que não haja, aqui e ali, alguns bons desenvolvimentos de mecânicas apresentadas em fases anteriores.

Contudo, quase sempre as fases de Birthday of Midnight permanecem na superficialidade, enfatizando a habilidade do jogador em lidar com mais obstáculos e, às vezes, também exigindo um pouco de tempo de reação. Desse modo, muitas vezes os action-puzzles carecem de criatividade e diversidade quanto ao level design, pelo que acaba por oferecer pouquíssimos desafios mentais e físicos, incipientes e repetitivos.

A progressão de dificuldade também não é boa. Em primeiro lugar, por não terem fases muito desafiadoras. Em segundo, pela questionável consistência da progressão. Muitas fases entre as supostamente “difíceis” poderiam estar entre as “fáceis” ou pelo menos “moderado”. Em terceiro lugar, pela forma com que os objetos e variáveis do level design são subutilizados em relação ao seu potencial. Potencial este, vale destacar, que é assegurado por outros jogos que já empregaram recursos iguais ou muito semelhantes em títulos de puzzle e plataforma.

Por fim, vale também destacar que muitas fases são parecidas entre si. Para tornar um nível posterior mais difícil que um outro, por vezes os desenvolvedores não fizeram mais do que adicionar alguns obstáculos extras. A título de exemplo, compare as duas imagens abaixo, as quais são, respectivamente, uma de nível “fácil” e outra de nível “difícil”.






Uma experiência encantadora, ainda que com um encanto breve e frágil

Apesar das limitações e dos problemas no level design, Birthday of Midnight é recomendável para amantes de jogos de action-puzzle mais casuais, um importante público para os portáteis da Nintendo, desde o Tetris de Game Boy, e sobretudo importante no DS. No Switch, porém, a experiência portátil pode ficar um tanto comprometida, devido à falta de precisão pela tela sensível ao toque e também pelo analógico do Joy Con, sendo mais indicado o uso do Pro Controller, mas nada que possa barrar o progresso, já que não se trata de um jogo muito desafiador.

Por outro lado, o público mais exigente de puzzle, ou mesmo de action-puzzle em particular, muito provavelmente não se contentará com esse título da Petite Games. Podem lhe agradar alguns conceitos artísticos, a trilha sonora e até alguns momentos de gameplay, mas é bem possível que se decepcione pela repetitividade, a falta de criatividade do level design, a falta de aproveitamento das mecânicas propostas, entre outras coisas, como o fraco nível de de desafios e a campanha muito curta.

Birthday of Midnight já está disponível na eShop dos Estados Unidos, mas ainda não no catálogo da eShop brasileira.

Prós

  • Trilha sonora agradável;
  • Visual carismático;
  • Jogabilidade intuitiva e consistente;
  • Temática com personalidade.

Contras

  • Pouco desafiador;
  • Problemas na progressão dos níveis em relação à dificuldade;
  • Controles um tanto imprecisos;
  • Deixa a desejar em variedade de cenários;
  • Baixa criatividade em termos de mecânica e level design.
Birthday of Midnight – PC/XBO/XSX/PS5/PS4/Switch – Nota: 6.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Felipe Fina Franco
Análise produzida com cópia digital cedida pela Ratalaika Games

Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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