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Análise: Mayhem Brawler (Switch) é um paraíso de referências em forma de beat ‘em up

Percorra múltiplos caminhos na base da porrada para alcançar um mesmo objetivo em uma cidade de indivíduos superpoderosos.




Mayhem Brawler é um daqueles jogos que tenta se diferenciar dos demais no seu gênero por meio de uma linguagem que apele à bagagem cultural do seu público-alvo. Esse beat ‘em up chega pelas mãos da desenvolvedora e publisher turca Hero Concept, que descreve a si mesma como um estúdio que “desenvolve reimaginações visionárias de clássicos atemporais de jogos de fliperama”.


No caso de Mayhem Brawler, dá para dizer que essa missão de intenções nostálgicas foi cumprida, pois assim como na maioria dos chamados games de “briga de rua”, temos aqui um produto que não é muito denso, mas faz um bom trabalho em atender aos anseios de quem está com vontade de socar hordas de inimigos e curte o universo dos videogames e da cultura pop geek.

Todos os caminhos levam aos créditos

Mayhem City é uma cidade onde humanos e meta-humanos superpoderosos convivem. A força policial dessa metrópole é a Stronghold, cujos principais membros são os oficiais da unidade composta por Troy “Trouble” Statham, Jonah “Dolphin” Jordan e Grace “Star” Gardner. A história de Mayhem Brawler começa quando o trio é designado a verificar atividades suspeitas nas docas da cidade, dando início à investigação mais importante e perigosa das suas carreiras.




A campanha do jogo é composta por até sete estágios, mas isso não indica a quantidade total de fases que podemos visitar. Existem ao todo 12 cenários disponíveis, incluindo três possíveis finais diferentes para a investigação da Stronghold. Essa variedade está inserida em um sistema de ramificações pouco comum a beat ‘em ups.

Em determinados pontos da trama, nos deparamos com possibilidades de escolha do caminho a ser seguido, baseadas em informações dos nossos superiores e dicas fornecidas por inimigos derrotados. Essas escolhas envolvem os locais que queremos visitar e a decisão de prender ou soltar alguns dos meta-vilões após ouvirmos o que eles têm a dizer para justificar o que estavam fazendo.

Ainda que não seja algo convencional ao gênero, achei esse sistema de progressão muito acertado, pois ele fornece uma justificativa mais do que válida para a rejogabilidade, ao invés de simplesmente termos que repetir literalmente o mesmo trajeto várias vezes apenas para desbloquear conteúdo extra que pouco interessa ou acrescenta ao gameplay propriamente dito, considerando que a essa altura já desfrutamos bastante do que a experiência de pancadaria tem a oferecer.




Infelizmente, há um limite para o quão expansiva essa ramificação pode ser. Por mais que revisitar as fases para descobrir todos os caminhos e finais possíveis dê uma sobrevida bem-vinda ao gameplay, terminar a história em apenas sete cenários é meio desanimador, e nem mesmo os múltiplos finais evitam uma perda de interesse após poucas horas.

Outro diferencial de Mayhem Brawler em relação à maioria dos beat ‘em ups clássicos é a possibilidade de salvar o progresso entre uma fase e outra. Considerando a curta duração da campanha, essa função não tem tanto valor quanto em jogos mais extensos, mas é sempre bom ter a possibilidade de fazer pequenas pausas, sobretudo se considerarmos que precisamos fazer o trajeto de sete estágios ao menos três vezes para conferir todos os finais.

Falando em desbloquear conteúdo, terminar o modo Campanha pela primeira vez libera o Fliperama (Arcade), que nada mais é do que uma repetição da história do jogo, mas com apenas um estoque de vidas disponível por jogador. Ao passo que no modo regular a punição por perder todas as vidas é recomeçar a fase em que estamos, no Fliperama o game over é definitivo, em uma simulação fielmente frustrante do que acontecia quando não tínhamos mais fichas para pôr na máquina.

Agredindo com planejamento e sabedoria

Vamos ao que interessa: a porradaria! O combate de Mayhem Brawler tem uma mecânica de condições especiais que dá um toque interessantíssimo de variedade ao roteiro outrora maçante de muitos beat ‘em ups, de meramente apertar o botão de soco o tempo todo sem pensar muito.

Existem diversas condições especiais que afetam tanto os personagens controlados pelos jogadores quanto os inimigos. Elas são positivas ou negativas, e podem durar alguns segundos ou apenas cumprir seu efeito uma única vez. Cada condição é representada por um ícone que fica acima da cabeça do personagem sobre o qual elas estão sendo aplicadas.




Um detalhe muito interessante a respeito desse sistema é a maneira como ele é inserido no funcionamento das armas e golpes do jogo. Armas de contusão causam Atordoamento, enquanto armas de corte causam Hemorragia e projéteis deixam seus alvos sob efeito de Vulnerabilidade. Existem também ícones que indicam que um inimigo está prestes a realizar um ataque perigoso, ou que vai atacar assim que se levantar.

Pode parecer que a quantidade de condições é exagerada — e de fato você provavelmente vai passar o começo da jogatina pausando com frequência para conferir a lista no menu de opções, como aconteceu comigo —, mas não demora para nos acostumarmos a todos os efeitos e lembrarmos exatamente o que cada um significa. Só fiquei incomodado com a diagramação da lista quando a acessamos durante a ação, pois as descrições dos efeitos acabam se sobrepondo aos respectivos nomes e ícones, dificultando a leitura. Felizmente, ela pode ser vista no menu inicial com a diagramação correta.




Graças a essa mecânica, as lutas ganham um inusitado aspecto de estratégia que me surpreendeu positivamente. Muito me agradou ir aprendendo o que cada inimigo vai fazer de acordo com os símbolos que surgem acima deles e desenvolver o discernimento de saber as horas certas de atacar e defender. Como eu disse no começo das minhas palavras sobre o combate em geral, isso elimina bastante da repetitividade vista em muitos títulos do gênero.

Algumas dessas condições fazem parte do arsenal de habilidades dos protagonistas. Além de combinações padrão de golpes, pulos e arranques, que incluem socos comuns e um ataque especial que pode ser desferido em área ou em linha reta, cada integrante do trio de destaque da Stronghold pode causar certos efeitos.

Trouble, o mais balanceado da equipe, possui garras extremamente afiadas que infligem Hemorragia, mas também pode deixar os inimigos atordoados com seus chutes; Dolphin, um grandalhão meta-humano que lembra mais um tubarão do que um golfinho, causa Atordoamento e Vulnerabilidade com suas pancadas de alto impacto; e Star, que é mais ágil, porém mais fraca, pode voar e também aplica Atordoamento e Vulnerabilidade com seus golpes de energia cinética.




Curiosamente, os diferentes níveis de dificuldade não alteram parâmetros como dano causado e recebido ou reflexos e tempo de resposta dos inimigos. As mudanças estão na quantidade de vidas que temos em estoque, que diminui conforme a dificuldade aumenta, e no tamanho da barra de vida dos inimigos, que aí sim cresce de maneira proporcional ao nível do desafio escolhido para a jogatina.

A pontuação é outro elemento que nos faz pensar mais cuidadosamente em nossas estratégias de batalha. Acertar golpes consecutivos gera um combo, o que está longe de ser uma novidade, mas que aqui é quebrado caso sejamos atingidos antes de ele ser concluído, o que nos faz perder os pontos que receberíamos se isso acontecesse. Uma vida extra é ganha a cada 6000 pontos, tornando esse sistema de combos essencial para evitar um game over, principalmente no modo Fliperama, onde as vidas são um recurso ainda mais precioso.

Um mar de referências para encher o Capitão América de orgulho

Não é só o combate que enriquece o conteúdo de Mayhem Brawler. A metalinguagem está presente ao longo de toda a trama, com diálogos recheados de referências e vários momentos de homenagens e quebras da quarta parede. A cultura pop geek está muito bem contemplada.




O enredo é contado pelo ponto de vista da Star, em cutscenes no formato de páginas de histórias em quadrinhos que mostram a heroína usando uma espécie de Twitter para expor as reflexões que faz durante o trabalho. Às suas publicações, seguem respostas e conversas protagonizadas por versões fictícias de integrantes da Hero Concept no papel de cidadãos de Mayhem City, alguns a apoiando, outros criticando.

Durante nossas andanças pelos cantos da cidade, temos figuras como uma moradora de rua nos fornecendo dicas de combate típicas de um NPC e sendo considerada instável, uma inimiga sarcasticamente questionando sua presença em um videogame e até uma menção à prisão de um bêbado que estava gritando o nome de um dos golpes mais famosos da história dos games de luta.

Identificar as inúmeras referências acaba sendo um dos grandes baratos do gameplay, além de mais um fator de incentivo à rejogabilidade. Até mesmo eu, que nunca fui um consumidor ávido de quadrinhos de super-heróis, me diverti identificando, por exemplo, a menção à clássica capa da edição 141 dos Fabulosos X-Men, que começa o famoso arco Dias de um Futuro Esquecido. Mayhem Brawler é um prato cheio para quem curte esse tipo de escolha de desenvolvimento.




Para completar uma experiência narrativa redondinha, o jogo tem legendas em português, e mesmo com deslizes ocasionais, os textos foram muito bem adaptados e traduzidos, com gírias, maneirismos e flexões fielmente correspondentes à nossa linguagem atual. Rola até um “eita” em determinado momento da história.

Um festival de surras curto, mas robusto

Mayhem Brawler não é um beat ‘em up duradouro, mas certamente garante uma trocação de socos divertida e surpreendentemente estratégica enquanto tiver conteúdo a oferecer. Seu sistema de escolha de caminhos injeta uma considerável dose extra de tempo de jogo, e a mecânica de condições especiais ajuda a evitar que a jogatina caia na mesmice.

Fica bem evidente o esforço da Hero Concept em trazer um título de briga de rua que não se resuma a atacar indiscriminadamente e ignorar completamente a trama, e pelo menos no que diz respeito à ambientação e caracterização dos personagens e do universo que eles habitam, certamente dá para dizer que houve êxito. Quem curte um tempero a mais na fórmula convencional do gênero tem entretenimento garantido pelas ruas de Mayhem City.

Prós

  • O sistema de decisões aplicado na campanha melhora e incentiva bastante o fator replay;
  • A mecânica de condições especiais traz variedade e estratégia à fórmula comumente maçante de simplesmente apertar o botão de soco o tempo todo;
  • Possibilidade de salvar o progresso da campanha entre as fases;
  • Boa tradução dos textos para o português brasileiro, com uma adaptação fiel do vocabulário atual do nosso idioma;
  • A metalinguagem aplicada na caracterização e na ambientação do universo do jogo e dos personagens é um prato cheio de referências à cultura pop geek.

Contras

  • Mesmo com a variedade proporcionada pelas ramificações do sistema de decisões, o tempo de jogo ainda é muito curto;
  • A diagramação da lista de condições especiais quando a acessamos durante a ação, com as descrições dos efeitos se sobrepondo aos respectivos nomes e ícones, dificulta a leitura.
Mayhem Brawler - Switch/PC/PS4/XBO - Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: João Gabriel Haddad
Análise produzida com cópia digital cedida pela Hero Concept


Apaixonado por jogos desde criança, principalmente pela Nintendo. Seja Indie ou AAA, os videogames vão estar sempre no meu coraçãozinho, com um espaço especial para multiplayers!
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