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Análise: Secret Kiss is Sweet and Tender (Switch) é apenas uma visual novel esteticamente agradável — e nada mais

Artisticamente falando, a visual novel agrada, mas a trama não recebeu o mesmo tratamento — especialmente com um corte desnecessário de conteúdo.



Depois de algumas polêmicas, incluindo um banimento do Steam devido ao seu conteúdo,  Secret Kiss is Sweet and Tender finalmente chegou à eShop das demais regiões do globo. Contudo, dadas a minha curiosidade e a incerteza de um lançamento ocidental à época, tratei de dar um jeito de comprar o jogo pela loja virtual japonesa no dia do lançamento.


Foi um tiro no escuro, confesso, pois sempre fico com um pé atrás quando algum jogo, sobretudo visual novels, aborda o subgênero girls love. Geralmente, a maioria desse conteúdo é voltada ao público masculino, com uma grande fetichização do relacionamento entre duas mulheres, sendo a série A Kiss for the Petals (Sono Hanabira ni Kuchizuke wo, ou simplesmente Sono Hanabira) um ótimo exemplo disso.

Felizmente, Secret Kiss, apesar de algumas CGs mais ousadas de fanservice, traz uma bonitinha história de amor entre duas mulheres, bem ao estilo mamão com açúcar. Contudo, a trama não recebeu o mesmo tratamento da apresentação audiovisual do jogo e o péssimo trabalho com a tradução impede que a visual novel seja totalmente aproveitada por quem não é fluente em japonês.

secret kiss is sweet and tender switch

“Professora, o que é se apaixonar?”

A trama gira em torno de Konami Izuho, professora em treinamento (algo equivalente aos estágios do curso de Licenciatura), e Ema Serizawa, uma das estudantes da classe pela qual Konami é responsável. Depois de um tour pela escola, a professora é surpreendida por um beijo de sua aluna, que lhe pergunta o que significa apaixonar-se por alguém.

Qual não é a surpresa de Konami ao descobrir que Ema não apenas é a ilustradora que tanto admira, como também que elas dividirão o alojamento estudantil. A princípio, a relação entre as duas é uma troca de favores: a professora pode acompanhar de perto a rotina de sua artista favorita em troca de ajudá-la a encontrar inspiração para novos desenhos.

A partir daí, o dia a dia das protagonistas no alojamento passa a ser compartilhado, com direito até a tomar banho e dormir juntas, em uma relação que, inicialmente, nada mais é do que um toma lá, dá cá. Porém, pouco a pouco, professora e aluna começam a desenvolver sentimentos que vão além de admiração e inspiração.

A culpa não é da história

Apesar de a relação entre professor e aluno ser um tanto quanto problemática na nossa sociedade devido a inúmeros fatores, essa temática é muito explorada em obras de ficção, sobretudo quadrinhos. Contudo, o foco desta análise não é problematizar esse tipo de relacionamento, mas sim dizer se o jogo funciona ou não e por quê.

Do ponto de vista literário, a premissa de Secret Kiss é interessante e promissora e, não fosse sua péssima execução, teríamos mais uma ótima visual novel linear com temática LGBTQIA+ disponível no Switch. Infelizmente, só consigo destacar dois pontos positivos do jogo: sua apresentação audiovisual, com destaque para a dublagem integral em japonês para as protagonistas, e o total suporte à tela de toque do console — algo que deveria ser obrigatório a todas as obras do gênero disponíveis no Switch, na minha opinião.

Graficamente falando, a modelagem das protagonistas usando o sistema E-mote (cuja popularidade veio da série Nekopara) é bem-feita e os cenários e CGs são bonitamente ilustrados. A trilha sonora também contribui com a ambientação e as situações pelas quais as protagonistas passam, gerando uma imersão muito mais que bem-vinda conforme acompanhamos o desenvolvimento desse romance inusitado.

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Por outro lado, os problemas são muitos e chega a ser difícil elencá-los, mas talvez o mais grave seja o desenvolvimento da história. Secret Kiss tem apenas três horas de duração, algo que não seria problema se houvesse, de fato, uma estrutura começo-meio-fim coerente, sem passar a ideia de uma trama “corrida” — o que não é o caso aqui, como é possível deduzir.

Contudo, eis o agravante da versão para Switch: toda a parte que aprofunda o relacionamento entre Konami e Ema, que funciona como um pós-jogo, foi cortada devido ao conteúdo explícito de cunho sexual. Tive a oportunidade de conferir esse “pós-jogo” na versão para PCe, na minha opinião, as CGs e o texto poderiam ser adaptados sem nenhum comprometimento do entendimento. Afinal, o corte dessa “safadeza”, como gosta de comentar meu colega Davi, faz com a versão para Switch fique incompleta e, de certo modo, insatisfatória.

Outro grandessíssimo ponto negativo é a péssima localização ocidental. A tradução para o inglês é descuidada, com vários erros de grafia de palavras e uma estruturação de diálogos que segue a gramática japonesa, que por muitas vezes me obrigou a relê-los mais de uma vez para entender a ideia que estava sendo passada naquele momento específico.

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O ápice dessa tradução malfeita, que aparentemente não foi revisada antes do lançamento do produto final, é a presença de palavras e expressões em japonês cujas equivalências em inglês estão entre parênteses — algo que passa completamente a sensação de animes distribuídos por fansubbers no início dos anos 2000. É muito comum encontrar expressões idiomáticas que perdem o sentido quando traduzidas, mas essa edição lamentável explicita o amadorismo dos responsáveis pela localização ocidental de Secret Kiss e a falta de compromisso para com o público deste lado do globo.

De positivo, só a arte e o uso da tela de toque do console — o resto deixa a desejar 

Sinceramente falando, não consegui aproveitar Secret Kiss is Sweet and Tender em nenhum momento. Digo, a história é um romance mamão com açúcar que, apesar de clichê e previsível, tinha de tudo para ser mais uma ótima recomendação LGBTQIA+ no Switch, ainda mais fazendo uso total da tela sensível ao toque. Infelizmente, o corte desnecessário de um conteúdo que poderia ter sido facilmente adaptado em vez de removido compromete a trama como um todo, fazendo com que o jogo se perca dentro de sua proposta, que é justamente mostrar o desenvolvimento da relação entre as protagonistas.

Além disso, do ponto de vista literário, a péssima e amadora localização para o Ocidente, graças a uma tradução descuidada e malfeita, tira todo o prazer da leitura. A versão para PC não corrige os problemas textuais, mas pelo menos traz a história completa; a de Switch, por outro lado, é jogar dinheiro fora.

Prós

  • Apresentação audiovisual excelente, especialmente as CGs;
  • Enredo promissor;
  • Dublagem em japonês integral para as protagonistas;
  • Temática LGBTQIA+ (girls love);
  • Total suporte à tela de toque do Switch.

Contras

  • Corte desnecessário de conteúdo, comprometendo a trama como um todo;
  • Tradução desleixada e amadora para o inglês, prejudicando a fluidez da leitura em diversos momentos.
Secret Kiss is Sweet and Tender — PC/Switch — Nota 4.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital adquirida pela redatora

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por 0range0ceans
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