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Análise: Tales of Symphonia Remastered (Switch) tem seu brilho ofuscado por falhas técnicas

Uma versão portátil de um título querido que tinha tudo para dar certo, porém acabou dando errado devido a uma otimização malfeita.


Tales of Symphonia foi lançado originalmente em 2003 para GameCube. O jogo é conhecido por ser o primeiro título da série Tales of desenvolvido totalmente em 3D e foi um dos grandes responsáveis pela popularização da série no ocidente. Agora, 20 anos depois, com Tales of Symphonia Remastered, temos a chance de retornar ao mundo de Sylvarant em um console da Nintendo. Porém, diversas falhas técnicas ofuscam o brilho da obra nesta nova adaptação.

A jornada de uma garota para salvar um mundo em decadência



Sylvarant, o mundo em que a trama se passa, se encontra em estado de crise. Com sua fonte de mana quase esgotada, diversos efeitos negativos estão acontecendo no planeta. Plantações não crescem o suficiente, antigas habilidades foram perdidas, a tecnologia está estagnada e encontros com monstros são frequentes neste mundo decadente. Para reverter o processo do esvaziamento de mana e evitar a extinção da vida no planeta, há um único método conhecido.

Uma escolhida, dita ser descendente de anjos, deve completar uma jornada árdua atravessando o mundo. Quebrando selos e orando perante seus altares, é possível fazer com que a mana novamente flua na terra, porém, há muitas gerações o ritual não é completado até seu final. Por um acaso, em Tales of Symphonia, tomamos o papel de Lloyd, o melhor amigo da atual escolhida, Colette, e este decide acompanhar sua amiga de infância em sua jornada. No entanto, o caminho para a salvação do mundo possui mais sacrifícios do que eles esperavam…
 
A história, apesar de seu tom inicial um pouco cliché de “salvar o mundo”, está recheada de reviravoltas, momentos dramáticos e temas interessantes. Grande parte disso se dá devido ao protagonista não ser “o escolhido”, e sim sua desastrada amiga de infância. A trama possui uma boa dose de tópicos mais pesados, que chegam até a impressionar em um jogo com uma direção de arte tão contrastante. Alguns dos pontos trabalhados na obra são preconceito entre raças, escravidão, sacrifício, egocentrismo, crenças infundadas em autoridades, traumas psicológicos e consequências de ações.

Nove companheiros de batalha para explorar Sylvarant e além!


No geral, cada um dos integrantes da equipe, no total nove pessoas, ajuda na complexidade e no tecer da trama, que é apresentada lentamente ao redor de aproximadamente 60 horas. Os personagens possuem características bem distintas entre si, e são fáceis de se diferenciar um do outro.

Um ponto interessante da série Tales of é que os personagens têm relações bem definidas não somente com Lloyd, mas sim também entre outros integrantes do grupo. Isso é bastante aparente em seu sistema de skits, em que temos diálogos extras nos quais os personagens interagem com cada momento da história e têm conversas casuais entre si. Nisso, brigas, romances e amizades são apresentados para o jogador de uma forma bem natural e divertida, devido a seu aspecto opcional.


Grande parte do jogo também é narrada, inclusive suas skits, o que contribui ainda mais para sua natureza emocional. A dublagem em inglês possui menos cenas com vozes, o que é uma pena, apesar de eu pessoalmente preferir jogar meus jogos com vozes em japonês. E mesmo em japonês, algumas cenas são completamente silenciosas.

No quesito de trama ou personagens, não há do que se queixar mais intensamente. Seu gameplay, apesar de comum hoje em dia, era revolucionário para a época, sendo um dos poucos RPGs a seguirem o estilo de ação em vez das conhecidas batalhas em turno. Há uma câmera fixa no personagem e esse deve selecionar um inimigo para ficar no mesmo plano, podendo assim atacá-lo.


Esse sistema de câmera em específico é incomum, porém, não é desagradável. Achei de certa forma até curioso, pois é necessário ficar de olho no plano dos outros inimigos, administrando o tempo necessário para chegar até lá, além de ser prazeroso conseguir calcular formas de acertar inimigos em mais de um plano com um bom timing.

Já a exploração do mundo é menos atrativa. O mapa é um pouco difícil de se orientar, principalmente quando é preciso achar uma nova área. Nessas situações, não é incomum se perder com apenas com direções vagas como “vá ao noroeste”. Isso se torna mais frustrante devido uma boa quantidade de monstros que se aproximam muito mais rápido do que o jogador, sendo os encontros incessantes em certos momentos. Situação esta que se agrava com uma série de falhas técnicas, que serão mais detalhadas em outro tópico.


De qualquer forma, é possível usar sua montaria para amenizar esse problema, porém, a forma de desbloqueá-la inicialmente é confusa. No jogo, é dito que para ativar o Long-range Mode deve-se encontrar torres espalhadas. Para minha surpresa, as tais “torres” não passavam de pedras, que facilmente pareciam ignoráveis no cenário. Mas bem, isso é um detalhe que após o jogador aprender pela primeira vez, logo estará habituado e procurando as tais pedras.

20 anos depois, como é possível ter tantas falhas técnicas em um novo sistema?

Até o momento, comentei propositalmente de aspectos positivos e negativos que poderiam ser analisados nas versões anteriores da mesma forma. Infelizmente, uma série de problemas na nova adaptação para Switch faz com que Tales of Symphonia Remastered perca grande parte de seu brilho, predominando um aspecto desleixado, como se tivesse sido lançado sem muita consideração.
 
O título, no GameCube, rodava a 60 fps e em todas as novas versões sua taxa de frames foi reduzida para 30 fps. Sendo uma obra de ação em sua essência, isso afeta negativamente a fluidez dos combates. Não somente a taxa de frame continua em sua forma reduzida, existem diversos momentos em que o jogo fica abaixo de 30 fps. É bem comum que isso ocorra em regiões que possuem partículas especiais, como desertos e templos temáticos,  além de batalhas. Certos detalhes de animação também foram omitidos do remaster.
 

Loadings duram cerca de 5 segundos e são seguidos por mais algum tempo em uma tela sem nem o indicador de carregamento. Não foram poucas as vezes que achei que meu jogo iria crashar ou que meu console havia pifado devido a essa estranheza. As pausas são particularmente mais chatas no mapa, uma vez que após cada batalha há um loading. Não importa se você joga no modo portátil ou docked, a performance é a mesma. Irritante, frustrante, mas aturável...

Nos combates, em vez de uma transição de tela, temos um clarão completamente branco em nossos olhos. Isso é particularmente estressante, principalmente para pessoas como eu, que possuem fotossensibilidade. Sem contar que isso também pode ser perigoso para pessoas com tendências a ataques epilépticos.

Essa ausência de transição vai contra com a proposta do console, em ser um aparelho portátil, pois jogar Tales of Symphonia Remastered em ambientes escuros é quase um atestado de dor nos olhos, restringindo assim o ambiente em que se pode jogar confortavelmente.
 

Outro ponto que incomoda muito são os menus, totalmente pretos, sem nenhuma decoração. Nem ao menos uma textura. Na versão de GameCube, o jogo costumava colocar o fundo do cenário com desfoco nessas telas. Na versão de Switch, um hardware muito mais avançado, por algum motivo isso não ocorre. E pior, em vez de ao menos implementarem alguma imagem para não ter essa destonação esquisita com o restante da direção de arte do jogo, nada foi feito. A impressão que fica é que estamos jogando algum título de RPG Maker rudimentar, que não teve tempo ainda de colocar uma imagem de fundo.

Continuando nos menus, as fotos dos personagens são pixeladas e parecem de baixa qualidade. Isso não muda no modo portátil ou modo TV. Uma das coisas que aprecio em títulos remasterizados é ver a arte de meus personagens queridos em alta qualidade, coisa que o contrário foi feito nesta versão, novamente sem explicação. Momentos emocionais ficam menos marcantes quando nos lembramos de que algo está errado.

As skits também sofrem do mesmo mal, com os personagens pixelados flutuando em um buraco negro de escuridão. Tudo isso retira a imersão e, apesar de serem falhas banais, tiram o prazer de se jogar, graças à sensação opressiva de descuido. Seriamente me pergunto o que estavam pensando quando aprovaram que o jogo fosse lançado dessa forma, ainda mais para um título tão querido de uma empresa consolidada no mercado.
 

Fora dos menus, a apresentação gráfica ainda tem problemas. A remasterização de texturas, principalmente em cenários e em personagens secundários, tem aspecto artificial e borrado, como se tivessem sido jogadas em um programa de upscaling por inteligência artificial sem nenhuma correção manual. Olhos borrados, sombras estranhas, roupas com aspectos sujos não são raridade. É muito triste ver que um jogo remasterizado parece hoje em dia feio em comparação com o que era há 20 anos. Tales of Symphonia simplesmente não merecia esse tratamento.

Uma das propagandas feitas para o remaster era a possibilidade de dar skip em cenas do jogo. Se essa mecânica tivesse sido implementada como esperado, seria bem útil, pois o jogo possui múltiplos finais e diversas escolhas, e pular eventos seria uma mão na roda para complecionistas. Não estou falando no passado à toa, pois é possível pular apenas as skits (que já são opcionais) e algumas poucas animações, fazendo que essa “novidade” seja basicamente inutilizada.
 

Um exemplo a não se seguir

Em conclusão, Tales of Symphonia Remastered é um bom jogo que teve a infelicidade de receber uma má remasterização, ou melhor “demasterização”. É possível sim, completar o título em sua plenitude no console, porém, não é a melhor forma de se jogar, principalmente quando existem outras distribuições oficiais mais em conta e, ainda que com falhas, com menos erros que essa versão em específico.
 
Há algum mérito em se jogar um RPG longo como Tales of Symphonia no Switch, pois pode-se jogar no conforto de sua cama. Só que os pontos positivos param por aí, na portabilidade e nos méritos que a obra conquistou antigamente. Entre a última versão do jogo, houve um período de sete anos. Tempo, supostamente, não deveria ser um problema para refinar outra adaptação. Fico pessoalmente muito entristecida com a situação e repito que o jogo merecia muito mais.
 

Podemos apenas torcer para que parte dos problemas sejam resolvidos em uma futura atualização, como a produtora Bandai Namco anunciou recentemente, mas suas falhas parecem tão enraizadas que não tenho confiança de que um dia as novas versões irão se comparar ao jogo original de GameCube, um console muito mais antiquado.

Prós

  •  Portabilidade em um RPG que pode facilmente ultrapassar 60 horas;
  • Personagens carismáticos, cada um com seu papel e relações;
  • Trama interessante, cheia de reviravoltas e temas sensíveis;
  • Combate envelheceu de forma razoável.

Contras

  • Repleto de falhas técnicas que não estavam presentes no jogo original;
  • Gráficos borrados, com aparência artificial nos cenários e detalhes dos personagens;
  • Slowdowns e quedas nas taxas de frames;
  • Apresentação de menus vazia e destoante com o restante da obra;
  • Carregamentos constantes;
  • Incômodo jogando em ambientes escuros;
  • Skips implementados apenas parcialmente, em pouquíssimos momentos;
  • Artes dos personagens pixeladas;
  • Exploração um pouco confusa.
Tales of Symphonia Remastered — Nota: 6.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Thais Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela Bandai Namco


Fascinada pela cultura japonesa dos anos '80, '90 e '00. Ama livros, mangás, sua gata maluca, mahou shoujo e jogos. Em especial Dragon Quest, Fire Emblem, Famicom Detective Club, Okami, JRPGs, retrô, Bishoujo & Otome games. Sempre em busca de jogos estranhos ou com propostas inusitadas. Estuda japonês nas horas vagas para conhecer mais obras do tipo.
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