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Análise: Loop8: Summer of Gods (Switch) tenta inovar, mas falha na execução

Loop8 prometia um sistema revolucionário de batalhas e de relações, mas infelizmente as coisas não deram muito certo.


Loop8: Summer of Gods é um simulador de relações que se passa na era Showa com elementos sobrenaturais e um sistema de batalha em turnos. Em vez de termos o padrão tradicional de RPGs em que devemos equipar nossos personagens e subir níveis para conseguir enfrentar inimigos mais fortes, Loop8 propõe inovar esse sistema substituindo essa fórmula eliminando totalmente os itens, equipamentos e níveis. Em vez disso, o rumo das batalhas e a força dos ataques é definido por meio das relações de amizade, afeto e ódio entre os personagens presentes.

O jogo é dividido em duas porções de gameplay: uma do mundo comum, onde podemos conversar com os personagens e presenciar eventos para fortalecer relações; e uma parte onde entramos na dimensão dos Kegais, criaturas ancestrais que ameaçam a humanidade desde tempos antigos. No papel, o sistema é bem interessante, mas na prática, podemos ver que o jogo sofre com um sistema extremamente repetitivo, batalhas sem muita estratégia e uma execução das relações interpessoais de forma extremamente simplória e superficial. A repetição poderia ser perdoada caso o restante do jogo desse uma sensação mais imersiva tanto em sua trama quanto em gameplay, porém, infelizmente, a execução de Loop8 se assemelha a uma tarefa cansativa e monótona.

Uma trama entre Deuses, humanos e Kegai

A história se passa em um mundo em que grande parte dos países foi destruída pela ameaça dos Kegai. Para sobreviver ao conflito, humanos construíram estações espaciais e parte da população se mudou para lá na esperança de fugir deles. O protagonista Nini é uma das pessoas que nasceu nessas estações, entretanto, o plano de escapatória dos humanos não vingou por muito tempo, pois após algumas décadas, o local onde Nini morava foi destruído, sendo o garoto um dos poucos sobreviventes do incidente, perdendo sua família e amigos no processo.
 
Após o acontecimento, Nini é forçado a voltar para a Terra e morar com sua avó e outro familiar de grau distante, mas de sua mesma idade. Seu nome é Konoha, e ela lhe apresenta sua nova cidade, Ashihara Nakatsu, uma pacata cidade no interior do Japão que misteriosamente não é atacada pelos Kegais. Tudo é novo para ele, e a gravidade da Terra é maçante para seu corpo acostumado ao espaço.

Em seu primeiro dia na nova escola, uma de suas colegas de classe, chamada Beni, que trajava orelhas e cauda de raposa, declara que os Kegais irão em breve atacar a cidade, pois a barreira foi quebrada, e agora todos devem se juntar para acumular bênçãos, lutando pela sobrevivência. A cada 5 dias, um Kegai irá possuir um dos habitantes de Ashihara Nakatsu e é Nini que deve descobrir como evitar a destruição do planeta. Viva sua vida como quiser, faça amizades, encontre romances, treine e estude, pois a ameaça dos Kegais está mais próxima do que imaginamos...
 
Essa é a trama inicial de Loop8. Inicialmente, ela parece ser até interessante, porém, logo damos de cara com uma progressão confusa e extremamente fragmentada. Informações são jogadas aparentemente sem conexão nenhuma e de forma ultra espaçada entre um evento e outro, eventos esses iniciados quando alcançamos certo nível de afinidade ou afeto com os personagens. Os eventos são curtos, genéricos e não conseguem convencer de que os personagens realmente são pessoas interessantes de se conhecer, mesmo alguns mistérios sendo jogados como tempero.


A forma que as questões são apresentadas devido a sua falta de construção, diálogos curtos e apresentação repentina mais parecem uma história nonsense do que realmente uma trama bem elaborada. A trama fará sentido realmente somente depois de dezenas e dezenas de horas e, mesmo assim, fica com a impressão de ser um enredo previsível e de baixa qualidade. Até tentei gostar de alguns personagens como Beni, Micchi, Ichika, Hori e Konoha, mas a execução de seus estereótipos é tão rasa e o processo de aumentar os níveis de amizade com os personagens é tão entediante que sinceramente sinto não valia o esforço.

Grind grind e grind mais um pouco

O sistema de relações se baseia em uma inteligência artificial denominada ‘sistema Karel’ e, supostamente, dependendo do humor gerado dos personagens, vontades e pontos de afeto, eles irão reagir de formas variadas. Esse sistema realmente existe, mas apenas isso, pois na prática, a maioria dos diálogos não passa de uma a quatro falas (quando existem) e um mundo de grind com as mesmas ações. É possível conversar com opções de diálogo do tipo conhecer melhor, elogiar, ser sincero, provocar, chamar para encontros e outros, mas as opções não criam conversas como se são esperadas, em vez disso, apenas uma mensagem genérica de “obrigado” ou de “não gostei” aparece.

Não esperava que absolutamente todas as minhas interações tivessem diálogos, porém, o volume de falas propriamente ditas é tão pequeno e disperso que me decepcionou muito. Além de, é claro, as conversas muitas vezes não terem muita graça. O ciclo do jogo se baseia em passar horas e horas escolhendo as mesmas opções para ganhar afeto e migalhas de conversas. O sistema de treinamento de status também é da mesma forma, uma repetição extrema sem nem ao menos uma animação de execução, como ocorre em outros raising simulators, como o próprio Gunparade March, trabalho anterior do diretor do jogo. Apenas uma tela preta e a tabela de status é mostrada. Isso traz uma sensação de baixa qualidade ao produto e incentiva cada vez menos o jogador a persistir em sua jornada. A falta de direção de animação é um problema constante no jogo, que mencionaremos novamente em outro momento.
 
Se ao menos as conversas fossem um pouco mais longas, talvez essa questão poderia ser melhor tolerada, mas acaba que as cenas muitas vezes não chegam a ter nem três minutos de diálogo, até mesmo nas cenas dos eventos. Esses  também são clichês e nem ao menos executam sua tarefa com diversão. Em um título que prometia uma grande inovação em um sistema robusto de interações com personagens e que praticamente tem como atração principal somente isso, ter eventos sem graça e sem profundidade é uma falha fatal.

Falta de otimização e variedade

Loops temporais ocorrem sempre que não conseguimos derrotar a ameaça Kegai em seu tempo limite de 5 dias, porém, a cada ciclo, praticamente nenhuma mudança ocorre. O máximo que parece em termos de diferença é a possibilidade de uma pessoa diferente do loop anterior ser possuída por um Kegai, dependendo de se ela tem um nível de relacionamento menor com Nini nesta rodada. Tudo estaria bem caso o processo dos loops fosse algo otimizado, ou ao menos rápido de se executar, porém, ao começarmos novamente o jogo em um novo loop, somos obrigados a ver a maior parte dos eventos que já vimos anteriormente em uma velocidade excruciante.

Repetição é um tema frequente em Loop8, mas não digo isso de uma maneira positiva, já farta de repetir as mesmas opções de conversa para receber uma recompensa quase inexistente da trama. Não bastasse apenas ter que selecionar as mesmas conversas, também temos que visitar diariamente os mesmos locais para receber bênçãos, bônus de atributos e relações que se mantém entre cada loop. Gostaria que os locais para esses benefícios tivessem sido mais variados, para pelo menos criar uma sensação de surpresa no jogador, mas os locais são sempre os mesmos pré-determinados ou recebidos em algumas conversas com os personagens e batalhas.

Há uma opção de ‘fast-forward’, mas ela é tão lenta que é melhor considerar que ela nem existe. Esmagar os botões freneticamente é mais rápido que usá-la, o que não deixa de ser um processo chato e repetitivo. Quaisquer eventos de afinidade e conversas (esparsas) que tivemos com os personagens, teremos que repetir sem nenhum skip e raramente com novidades. Loadings são constantes, chegando ao nível de existirem até mesmo ao se abrir o mapa, entrar no menu e outras atividades simples para os padrões atuais. O problema não existe apenas no Switch, mas está presente também em outras plataformas, como o PlayStation 4, apesar desses carregamentos estarem um pouco mais rápidos na plataforma da Sony.

Voltando ao ponto das animações, sua direção foi bem questionável. Temos uma quantidade de frames reduzidas que imagino ser proposital. Pessoalmente não me incomoda e até acho charmoso. O que me incomoda mesmo é que muitas vezes em eventos, ou até mesmo caminhando na cidade, os outros personagens ficam geralmente parados encarando o nada, sem nem ao menos uma animação de repouso. Não importa se são eventos ou não, somente o movimento mínimo necessário é realizado (como por exemplo a movimentação da boca) e isso acaba criando situações estranhas nas quais o movimento é descrito mas apenas imagens estáticas são apresentadas.

Em mérito da direção de arte, pelo menos a maioria dos personagens é bonita e seus modelos bem detalhados. Seus cenários desenhados também são lindos, mas de nada adianta ter um jogo bonito em algumas partes, mas mal trabalhado em outras. É como provar um prato que parece ser muito gostoso, mas ao dar a primeira mordida, perceber que tem um péssimo sabor. Pior ainda perceber que você vai ter que comer da mesma refeição diversas vezes.


Gostaria que houvesse uma variedade maior nas atividades que podemos fazer na cidade, como por exemplo, comprar presentes e entrar em mais lojas. Isso ajudaria muito no ciclo de repetição a se variar um pouco. Também ressalto novamente que a falta de animações para as ações do personagem em seus treinamentos é gritante e o mínimo exigido em um jogo de simulação do tipo. Jogos desde a década de 90 possuem coisas básicas como essa e é realmente uma incógnita o porquê Loop8 ter sido feito com tão poucos recursos. É necessário realmente um verdadeiro grind com poucas recompensas para conseguir aturar terminar o jogo.

Vida e morte nas batalhas contra Kegai, mas mesmo assim...

O combate do título consiste em batalhas em turno. Após Nini descobrir qual dos habitantes da cidade foi possuído pelo Kegai, ele deve entrar em um portal para a dimensão do ‘Underworld’, lar dos Kegais. Lá, o jovem deve, junto com dois companheiros selecionados, derrotar o inimigo que está possuindo um de seus colegas. Existem algumas habilidades desbloqueadas conforme crescemos no jogo, mesmo assim, a estratégia para vencer os chefes é pouca. Há a opção de se atacar com “amizade”, “afeto” ou “ódio”, o que altera um pouco seu dano e a agressividade dos chefes, mas é só isso mesmo.

Apenas usar o comando de ataque mais forte o tempo todo é suficiente para ganhar as batalhas. Isso é, torcendo para que seus aliados, controlados por inteligência artificial, ajam de forma adequada. Caso não consiga vencer, provavelmente falta aumentar status na outra porção do jogo e não há muito além disso a se fazer. 
 Alguns desafios antes do chefe estão espalhados no mapa, geralmente esses são apenas um checador de atributos e nada mais, se você tem atributos, você passa, se não, repete o loop. 

Realmente não consegui sentir nenhuma emoção nos combates ou nessa parte do jogo, apesar das animações de combate serem bem mais agradáveis que as do mundo comum. Elas chegam às vezes até serem belas, mesmo com a quantidade reduzida de frames e me pergunto por que não fizeram o restante das animações com o mesmo carinho.

Caso o jogador vá enfrentar um chefe e não tenha afinidade suficiente com ele, não há escolha se não matar o hospedeiro do Kegai. Quando há afinidade, pode-se salvar a pessoa e uma opção de comando aparece, o que acaba sendo redundante, pois quase não há repercussão de se matar alguém no jogo e nenhum motivo para não o salvar.

O design dos chefes é interessante e baseado em criaturas mitológicas japonesas e isso é bem refrescante, porém não salva o restante do sistema, que além de sua parte estética com animações e designs, não tem muito mais a oferecer. Batalhas em turnos podem ser interessantes, como mostram os títulos “Etrian Odyssey”, “Shin Megami Tensei” e “Dragon Quest”, uma pena que Loop8 não conseguiu criar um sistema divertido.

Jogue por sua conta e risco

Em meio a um sistema de relações desinteressantes, um plot confuso, personagens sem profundidade, má otimização do jogo e batalhas sem estratégia, fica difícil encontrar pontos positivos em Loop8. Seus cenários em alguns momentos são certamente bonitos, as personagens femininas também têm belos modelos e um design fofo, mas a falta de otimização, falta de profundidade e quantidade dos diálogos e eventos do jogo, sistema extremamente repetitivo, trama confusa e mal elaborada e combates sem emoções certamente não fazem Loop8 um jogo que eu recomende para outras pessoas exceto aquelas que são fãs hardcore de Gunparade March. É realmente uma pena, pois eu queria muito gostar do jogo e acredito que, se ele tivesse sido melhor trabalhado, teria se tornado uma boa obra.

Prós

  • Bonitos modelos 3D das personagens femininas, com designs bem-feitos;
  • Chefes com direção de arte diferente do padrão dos RPG japoneses;
  • Alguns cenários parecem desenhados e são muito belos;
  • Proposta diferente do tradicional.

Contras

  • Falta de diálogos realmente interessantes;
  • Sistema extremamente repetitivo e sem recompensas para justificar;
  • Trama confusa, sem graça e apresentada de forma inconsistente;
  • Fast-Forward não funciona como esperado;
  • Batalhas sem emoção, se resumindo apenas a selecionar o mesmo golpe sempre;
  • Loadings constantes para os padrões atuais;
  • Poucas animações além dos combates, personagens estáticos nos cenários;
  • Eventos curtos para um esforço grande para os alcançar;
  • Bônus estão sempre nos mesmos locais, sendo previsíveis;
  • Impossibilidade de pular conversas passadas;
  • A maior parte do jogo se passa aumentando atributos em telas genéricas;
  • Personagens que não te instigam a querer realmente sua amizade;
  • Pouquíssima variedade de atividades;
  • Ciclos longos e sem nenhuma novidade entre eles;
  • Sensação de produto de baixa qualidade.

Loop8: Summer of Gods — Nota: 5.0
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Thais Santos
Análise produzida com cópia digital cedida pela XSEED


Fascinada pela cultura japonesa dos anos '80, '90 e '00. Ama livros, mangás, sua gata maluca, mahou shoujo e jogos. Em especial Dragon Quest, Fire Emblem, Famicom Detective Club, Okami, JRPGs, retrô, Bishoujo & Otome games. Sempre em busca de jogos estranhos ou com propostas inusitadas. Estuda japonês nas horas vagas para conhecer mais obras do tipo.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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