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Análise: In Stars and Time (Switch): amizades e desafios em meio a loops temporais

Neste RPG indie, cabe ao jogador tentar derrotar um rei capaz de congelar o tempo.

In Stars and Time
é um RPG indie desenvolvido pela insertdisc5 e publicado pela Armor Games. A proposta do jogo gira em torno da premissa de um loop temporal com o jogador e sua equipe tentando salvar o mundo das garras de um rei que deseja congelar o tempo.

Um jovem introspectivo e amigos que são como uma família

In Stars and Time começa já no final da jornada de cinco guerreiros. Após várias tribulações que são apenas comentadas brevemente no jogo, eles estão prestes a enfrentar a batalha final contra um poderoso rei capaz de controlar o tempo.

Com laços já forjados pelo tempo de viagem juntos, os personagens são a grande alma da aventura. Como protagonista, temos Siffrin, um rapaz quieto e um tanto introvertido que está sempre usando uma grande capa e chapéu que lembram as vestimentas de um feiticeiro. Por algum motivo, ele tem dificuldade em lembrar palavras comuns e parece um pouco deslocado do resto do grupo em relação a algumas coisas. Ele também ama trocadilhos e boa parte das suas interações com os aliados são piadas que os outros personagens odeiam (ou fingem odiar para não alimentar o monstro do trocadilho).

Apesar dele ser o protagonista, o verdadeiro centro da equipe é Mirabelle, a única sobrevivente da Casa da Transformação, local em que o Rei se alojou. Assumindo para si o papel de escolhida, ela se viu com um grande dever em mãos e conseguiu a ajuda dos outros personagens em sua jornada.

Os outros personagens incluem o forte Isabeau, que é um pilar emocional para a equipe em vários momentos; a inteligente, mas um tanto ácida Odile; e o pequeno Bonnie, uma criança que deseja resgatar sua irmã mais velha. Cada um deles possui personalidades bem marcantes e todos     conseguem evitar ser clichês ambulantes.

O principal charme do jogo é ver como esses personagens são bem escritos e possuem um laço de amizade forte, mas realista. Até mesmo momentos pequenos de interação com objetos do cenário trazem diálogos interessantes que destacam as suas personalidades e os laços de afeto que eles formaram no tempo em que estiveram juntos antes do jogo começar.

Fracassos e o aspecto psicológico do loop

Apesar de todos os esforços do grupo, a jornada deles tende ao fracasso por uma série de motivos. Ao falhar, Siffrin tem a chance de voltar ao dia anterior ou para um ponto já visitado da Casa da Transformação.

Vale destacar que o jogador necessariamente vai passar por pelo menos alguns loops antes de conseguir chegar ao final da história. Embora seja algo interessante para a discussão da obra e a narrativa em particular, a estrutura da gameplay acaba parecendo um pouco rígida por conta disso.

Em termos da narrativa, isso também tem um impacto interessante no psicológico dos personagens, que é um elemento fundamental da experiência. As repetições pesam nas costas de Siffrin, que é o único capaz de se lembrar do que aconteceu e tenta carregar sozinho esse peso nas costas.

Ao interagir várias vezes com os mesmos personagens, ele ganha novas opções de diálogo, em um esforço para corrigir até mesmo alguns pequenos erros, mas não é apenas Siffrin que é bem explorado pelos diálogos, já que os outros aliados também possuem fragilidades e um lado humano e sensível que às vezes vem à tona. Mesmo assim, alguns jogadores podem sentir falta de ver mais do que aconteceu na história desses personagens antes em primeira mão.

Controlando o tempo

Como um RPG, uma parte importante da experiência de In Stars and Time é o combate baseado em turnos. Controlamos uma equipe de quatro personagens e temos a aparição ocasional de Bonnie como um ajudante. Cada um deles e dos oponentes são associados aos elementos pedra, papel e tesoura. Todos os ataques estão relacionados a um desses tipos, definindo assim se o dano será poderoso, normal ou fraco, dependendo do elemento inimigo.

Além dos ataques básicos, todos os aliados possuem técnicas de suporte que fazem diferença no combate. Siffrin é um personagem focado em agilidade, sendo capaz de acelerar toda a equipe, usar vários golpes de tesoura e passar o seu turno para um aliado. Mirabelle é a melhor da equipe em cura e consegue usar golpes de tesoura e papel.

Já Isabeau é mais ofensivo com seus poderes de pedra, tendo a capacidade de alterar a defesa de aliados e o ataque e a defesa de inimigos. Ele também pode passar o turno como Siffrin. Por fim, Odile é capaz de analisar o inimigo durante o combate e utilizar técnicas de dano dos três tipos.

In Stars and Time usa um sistema de combo no qual conseguir realizar cinco golpes consecutivos do mesmo tipo implica em um ataque especial combinado que não apenas causa dano massivo a todos os inimigos, como também recupera a vida dos aliados. Com isso, é interessante ter em mente a ordem em que eles são encadeados para além de pensar apenas no dano imediato. Vale destacar que em vez de pontos de magia ou algum sistema similar, temos um cooldown de turnos sem poder usar a mesma técnica.

Para poder controlar os turnos, é importante usar bem as formas de passar turno, os buffs/debuffs, itens e a possibilidade de defender. Essas ações não estão associadas a nenhum elemento, evitando quebrar um combo de ataques. Junto com o balanceamento do combate, com inimigos comuns que causam altas quantidades de dano, temos um sistema simples, mas que ainda demanda um bom entendimento estratégico.

Destruição e reconstrução

Por conta da estrutura cíclica da experiência, In Stars and Time tende a ser um tanto repetitivo. Os loops realmente repetem diálogos com apenas pequenas variações, e os personagens aliados ficam mais fracos toda vez que voltamos a pontos anteriores da trama e exploramos novamente as áreas, que são poucas para o padrão do gênero.

O jogo até tem alguns mecanismos para ajudar o jogador, reduzindo o quão enfadonha essa repetição tenderia a ser. Diálogos já lidos podem ser acelerados, habilidades desbloqueadas podem ser equipadas como memórias pelos aliados, mantemos os equipamentos obtidos e a força do protagonista permanece, e até podemos dar saltos para pontos no futuro após visitar um momento mais antigo. Porém, o incômodo de fazer as mesmas coisas novamente persiste.

Outro ponto que pode ser bem incômodo para a experiência é a distribuição dos save points, pois não é possível salvar em qualquer lugar, apenas em áreas específicas. Embora seja algo já feito várias vezes no gênero, isso é especialmente inconveniente aqui porque só é possível salvar nos momentos de transição de andares na dungeon. Uma vez que o jogador avança, ele fica impossibilitado de voltar e precisa explorar o andar todo ou morrer antes de conseguir salvar novamente.

Caso o jogador morra nesse período, os seus aliados perderão a experiência até ali, mas as batalhas realizadas dão pontos que podem ser gastos para desbloquear as portas anteriormente abertas na próxima exploração ou ir a um momento mais avançado no tempo. A possibilidade de perder progresso se torna um dos elementos de tensão da experiência, mas, em vez de um desafio interessante, pode ser um incômodo para alguns jogadores.

Também senti falta de um log, ou seja, um registro de diálogos. Para um título no qual a leitura é tão importante, faria bastante diferença ter essa opção para conferir os textos recém-lidos.

Sobre tempo e amizade

In Stars and Time
explora um curioso conceito de loop temporal no final de uma jornada de RPG. O resultado é um curioso mini-RPG em que os personagens bem construídos são o ponto alto da experiência. Para quem gosta de obras mais experimentais dentro do gênero, é uma fácil recomendação.

Prós

  • Personagens carismáticos e bem-escritos;
  • Vários diálogos curiosos que ajudam a desenvolver as personalidades individuais e as dinâmicas do grupo;
  • Sistema de combate que incentiva o controle dos turnos e o encadeamento de golpes do mesmo tipo.

Contras

  • Algumas situações da história são feitas para que o jogador não possa prosseguir sem recomeçar;
  • Dentro da dungeon, só é possível salvar nos trechos entre andares e não é possível voltar ao andar anterior sem morrer;
  • Tanto a história quanto a gameplay acabam se tornando bastante repetitivos pela natureza da proposta;
  • Ausência de log.
In Stars and Time — Switch/PC/PS4/PS5 — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Armor Games

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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