Algumas uniões simplesmente parecem tão naturais para existir. Banana no arroz e feijão, pipoca e cinema, pássaro-palito e crocodilos, mamão com açúcar, Naruto e Sakura, Link e Zelda, vodka e morango, chuva e sono… e, de surpresa, a Koei Tecmo ousa trazer uma nova dupla com WARRIORS: Abyss, título spin-off que une suas duas franquias estilo musou, Dynasty Warriors e Samurai Warriors, com a jogabilidade roguelike.
Em um belo dia, o rei do Inferno Enma (que parece mais um adolescente que acabou de entrar na puberdade) convoca o jogador do mundo dos vivos para o plano astral, dizendo que o demônio Gouma, anteriormente preso nos círculos mais profundos do submundo, usurpou o trono do garoto e destruiu o equilíbrio no pós vida. Assim, com a ajuda do elenco das duas franquias (que abrange personagens históricos da era dos Três Reinos da China e do período Sengoku do Japão), Enma declara guerra contra o invasor e suas hordas ilimitadas de almas penadas amaldiçoadas.
Apesar do pretexto interessante, é por aí que fica a história. Mesmo que Enma seja bem carismático, a trama é absurdamente rasa, com um pouco de lore adicionada com alguns diários sobre o rei do Inferno mas apenas isso — o que é uma grande decepção, visto que o elenco é massivo.
São 100 personagens somando as duas séries e seria muito legal ver a interação entre esses personagens, uma vez que um novato possa ficar extremamente confuso sobre as conexões entre as forças, suas personalidades e histórias. É bem notável que o orçamento de desenvolvimento do jogo foi bem baixo, com um menu ridiculamente simples e diversas animações recicladas de jogos anteriores da franquia para criar os movesets das tropas, além de músicas reutilizadas de títulos anteriores (excelentes trilhas, no entanto).
LEGIÃO!
No entanto, Abyss acerta em cheio na sua proposta de jogo. O estilo musou de enfrentar exércitos de buchas de canhão encaixou perfeitamente com a jogabilidade roguelike, na qual se desbrava níveis a fim enquanto vai melhorando gradativamente, perdendo e repetindo o ciclo. O estilo pode parecer entediante e o progresso pode soar em vão, mas logo se percebe a beleza e nuances da experiência.
Ao derrotar inimigos, dois tipos de moeda são coletadas: Tears of Blood são usadas para comprar melhorias temporárias em caldeirões mágicos, esvaindo quando se é derrotado; Karma Embers, por outro lado, permanecem mesmo após a derrota e sendo usadas para liberar novos personagens e melhorar gradativamente os status gerais do jogo como força, vida, resistência e velocidade. Uma evolução lenta, mas coesa com ambos os estilos e a sensação de melhorar a cada nova tentativa é igualmente prazerosa.
Como dito, são 100 personagens para escolher, cada um operando da mesma forma, mas singulares de suas próprias maneiras, respondendo muito bem e sem delay algum. O botão Y é o ataque normal, enquanto o X é o ataque especial e, na medida que vai executando os combos, o herói escolhido pode chamar um aliado (seis ao todo) para adicionar mais dano contra os inimigos.
Tudo bastante bombástico e primeiramente confuso, porém logo se tornando divertido e natural, sem contar os golpes supremos, pintando a tela com explosões e espetáculo, seja com o ataque solo do jogador ou um ataque em conjunto com todas as unidades. Mesmo que os visuais sejam um pouco datados, o impacto da batalha faz tudo parecer um show da arte da guerra.
Infelizmente, Abyss comete alguns erros bem crassos que impedem sua glória total. Para começar, os campos de batalha são espaços imensos, mas pouco exploráveis. Nos títulos oroginais, esses espaços grandes fazem sentido para conter as hordas inimigas e poder atacar livremente. Mas em ABYSS? São simplesmente desnecessários, uma vez que mal dá para explorá-los e só demonstram um vazio inútil.
O jogo também está em inglês, mais uma vez mostrando a teimosia da Koei Tecmo em adaptar a franquia Warriors para nosso idioma. Porém, o erro mais severo está em sua performance: quando recebi o jogo para análise, fiquei pasmo com o tempo de carregamento não apenas inicial, mas entre os dois únicos menus antes de começar o jogo (o principal e a árvore na qual se desbloqueia novos personagens).
E então veio a espera para começar o jogo. Quase um minuto para iniciar a partida, depois ficar meramente jogando por 15 segundos nos primeiros cenários (onde os inimigos são ridiculamente fracos, presságio para o perigo iminente) e esperar mais 45 segundos para simplesmente jogar menos que isso. A Koei Tecmo já prometeu uma atualização para melhorar a performance, mas ainda é um insulto que o jogo foi lançado nesse padrão, visto que ambos os gêneros prezam pela rapidez e ação.
Romance e guerra
WARRIORS: Abyss é um título interessante que junta ambas as séries, falha em atingir o potencial de seu crossover, mas acerta em cheio na proposta da união inusitada. Apesar dos tropeços idiotas, o valor da experiência continua absurdamente alto e viciante.
Um roteiro melhor e esperar menos para a ação seriam muito bem-vindos, mas o resultado final ainda vale muito a pena — libertar o Inferno nunca pareceu tão interessante.
- Combinação de musou e roguelike é genial, natural e deve ser replicada;
- Comandos que respondem muito bem e sem delays na gameplay;
- Elenco robusto de 100 personagens, cada um com combos diferentes e representando bem ambas as franquias;
- Jogabilidade visceral e extremamente viciante, com alto fator replay.
Contras
- História ridiculamente rasa e desinteressante, mesmo Enma sendo bastante carismático;
- Apesar da união de elencos, fator crossover é insultantemente ignorado;
- Ausência de legendas em português;
- Tempo de carregamento longo e abusivo;
- Visuais em geral bastante simples e reciclados.
Warriors: ABYSS — PC/PS4/PS5/XSX/Switch— Nota: 8.0Versão utilizada para análise: Switch
Análise produzida com cópia digital cedida pela Koei Tecmo
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli