Cinco anos depois, em 1999, chegava a sequência, esta que é bem mais lembrada e ampliou ainda mais os horizontes do seu antecessor, sendo citada como um dos melhores jogos de todos os tempos. Agora, para celebrar os 25 anos de seu lançamento, a Nightdive Studios traz System Shock 2: 25th Anniversary Remaster para uma nova geração desbravar onde ninguém pode te ouvir gritar. Venha comigo, vamos nos perder no espaço.
Recruta Zero
Não é necessário jogar o primeiro jogo para entender a história deste relançamento, mas para fins de contexto, eis um breve resumo: situado em 2072, um hacker é flagrado tentando roubar dados da estação espacial Citadel, propriedade da corporação TriOptimum. Edward Diego, um corrupto executivo da corporação, oferece perdão ao protagonista se ele hackear SHODAN, a I.A. da estação, para assim roubar dados de uma arma biológica. Logicamente, tudo dá errado, com SHODAN enlouquecendo, ganhando um complexo de Deus e corrompendo todos na estação, transformando em monstros ciborgues e determinada a erradicar a humanidade. Por sorte, o hacker consegue salvar o dia.Em System Shock 2, estamos em 2114, com nosso protagonista sendo um soldado que embarca na nave Von Braun, uma maravilha tecnológica nascida da colaboração entre a TriOptimum e a UNN, um consulado de nações para fiscalizar anticorrupção de megaempresas para impedir que os eventos do jogo anterior se repitam. Cinco meses antes de a história do jogo começar, um pedido de socorro é interceptado no planeta Tau Ceti V e, quando a equipe de resgate chega, não encontra ninguém além de estranhos ovos. Trazendo para a nave para serem estudados, os ovos eclodiram e deram à luz parasitas anelídeos que lentamente mataram ou corromperam todos na nave.
Isto é, quase todos. Nosso protagonista estava em sono criogênico e conseguiu se safar do massacre. Ele é acordado por outra sobrevivente, a Drª. Janice Polito, que o orienta pelos corredores perigosos da nave. Eventualmente, o soldado se depara com SHODAN, tendo sobrevivido aos eventos do jogo anterior e invadido a nave e, forçadamente, assume a posição de orientadora, guiando-o na incursão contra os monstros e tentar, de alguma forma, sobreviver a esse pesadelo.
Teatro de horror
A trama é extremamente interessante e imersiva, com reviravoltas extremamente efetivas e uma progressão única: como estamos presenciando o pós de um massacre, encontramos gravações de áudios da tripulação, relatando seus pensamentos, descontentamentos e até mortes por meio desses registros. Mas o storytelling não fica relegado apenas aos áudios. A Von Braun deve ser um dos ambientes de jogos mais bem escritos que eu já vi, sem hipérboles.A forma como a nave é dividida em setores específicos, como casa de máquinas, recreação e ala médica, e como cada sala é interligada fazem tudo parecer real, como se tivesse sido planejada por pessoas reais e estamos vendo o que já foi o lar de uma tripulação. A própria localização dos corpos conta uma história, como um cadáver encostado na parede com uma escopeta apontada para a cabeça ou um grupo de mortos perto de uma mesa de sinuca. E, obviamente, SHODAN é uma vilã incrível. Mesmo com a ameaça de XERXES (a I.A. que controla a Von Braun) também tendo enlouquecido, a onipresença de SHODAN com seus insultos e temperamento frio fazem dela uma presença constante e memorável, digna de estar entre os melhores vilões dos games.
Em questão de performance, System Shock 2: 25th Anniversary Remaster está muito bem feito, cortesia da equipe de desenvolvimento ter usado diversos mods criados por fãs para o polimento do jogo, o que é muito legal e mostra o comprometimento com o renascimento do clássico. Além disso, seu tempo de carregamento é extremamente rápido, seja para começar o jogo, cruzar áreas ou retornar o save, caso tenha cometido um erro. Sendo um remaster e não um remake, é possível ver umas rugas do tempo como a animação limitada dos inimigos, os comandos serem um pouco travados e certos clippings de textura, mas nada que realmente destrua a imersão ou jogabilidade. Além disso, houve alguns momentos bem raros que o jogo fechou sem explicação alguma, obrigando-me a voltar um pouco no meu progresso; mas, como disse, momentos raros.
Por gentileza, mate
System Shock 2 é uma curiosa mistura de FPS com elementos de RPG, tendo sido um precursor dos jogos já mencionados, nos quais devemos evoluir para sobreviver, especialmente diante da seleta galeria de inimigos, que varia levemente e é extremamente desafiadora. Logo quando começamos o jogo, pegamos o básico do combate e interatividade, aprendendo os tipos diferentes de armas e sua utilidade (tanto no sentido que certas munições funcionam melhor contra certos inimigos quanto a durabilidade delas, desgastando com o tempo até quebrarem), a opção de hackear eletrônicos ao bel prazer (como ganhar descontos em máquinas de vendas, melhorar a efetividade do arsenal e até mesmo ganhar controle de torretas) e poderes psíquicos utilizando implantes cibernéticos (como curar ferimentos, disparar ataques de energia e melhorar a velocidade).Toda essa explicação é jogada no nosso colo e parece bastante confusa e intimidadora. No começo, é muito. São muitas explicações e escolhas rápidas na construção inicial de nosso soldado. Mas lentamente o sistema caótico começa a fazer sentido e tudo parece bem natural, ao passo que trocar de equipamentos é bastante rápido e eficaz, seja selecionando rapidamente pelo acesso rápido ou pegando no inventário. E por falar nele, o soldado tem à disposição um inventário bastante limitado pelo jogo todo, mesmo aumentando sua capacidade. Mas isso não é algo ruim, indo de encontro com a proposta de limitação em um ambiente hostil como a Von Braun. E a melhor coisa é que, ao descartar um item, ele não some. Ele vai ficar no chão até que o jogador o use, uma forma eficiente de manter materiais e ainda se localizar na nave.
Espalhados pela Von Braun estão terminais que são usados para melhorar os status do jogador como sua força para aumentar seu arsenal e ataques físicos, melhorar sua eficiência com armas, novos poderes psíquicos e técnicas mecânicas de manutenção e hackeamento, além de terminais específicos para melhorias internas do personagem como a disponibilidade de um minimapa (recomendo fortemente que esta seja a primeira melhoria) e ficar invisível a robôs quando o alarme for hackeado. A sensação de evolução é bastante evidente, especialmente ao pesquisar componentes desconhecidos para entender melhor os inimigos e dar mais dano ou o simples ato de conseguir hackear mais facilmente um sistema sem ter medo de acionar um alarme.
Rage Against The Machine
System Shock 2 é um jogo fantástico, mas que envelheceu bem mal em alguns aspectos. Não digo em relação às rugas que mencionei antes, mas aos seus menus. São muitos menus que, apesar de cada um fazer sentido e entender suas utilidades, estão separados de forma bastante mal intuitiva, precisando apertar o ZR ou ZL para chegar onde você quiser ou com o cursor, ao abri-lo com o botão -. São preciosos minutos que, no meio de um tiroteio, podem ser fatais. Além disso, a falta de explicação pode ser confusa no começo.Eu fiquei bons minutos tentando entender como funciona a mencionada pesquisa, com a tela simplesmente falando “selecionar”. Com isso, eu apertei com A e achei que era preciso levar até o menu de pesquisa, mas isso se provou inútil. Foi até eu entender que era para apertar o botão Y que o processo começava. System Shock 2 seria bastante melhorado se tivesse suporte à tela de toque (e, no caso do Switch 2, ao mouse). É interessante notar que os mods, presentes na versão de PC, estão ausentes na versão de Switch, sendo alguns deles bem legais como ter a opção de jogar com os gráficos originais.
Em análises passadas, eu disse que todo relançamento que se preze deve incluir rascunhos e desenvolvimento de seus jogos para fins de preservação e curiosidade. Esse meu pensamento se estende inclusive para ports de remakes, e System Shock 2: 25th Anniversary Remaster cumpre muito bem essa tarefa, trazendo uma coleção muito boa de rascunhos, desenvolvimento, vídeos, áudios cortados e até mesmo detonados. É tudo muito bem feito, é notável o carinho do time de desenvolvimento e da comunidade de fãs com esse título. Infelizmente o jogo e esses deleites não têm opção de tradução para português brasileiro.
Daisy Bell
System Shock 2: 25th Anniversary Remaster é com certeza um dos melhores jogos que joguei este ano. Eu sempre escutei coisas excelentes sobre ele e este relançamento chegou às expectativas e foi além. Pequenos empecilhos não mancham a reputação desse clássico do FPS e de terror, carregado por ambientação macabra, músicas esparsas para criar um clima aterrorizador, uma vilã carismática e jogabilidade afiada.Agora, se as estrelas se alinharem, o primeiro jogo pode chegar à Nintendo (seja seu remaster ou seu remake). Até lá, está dispensado, seu inseto.
Prós
- História envolvente, com reviravoltas e ambientação assustadora bastante imersivas;
- Exploração extensa do cenário, com a Von Braun sendo um ambiente complexo e realista;
- Jogabilidade desafiadora mas sem ser frustrante, impulsionando o jogador a evoluir mesmo que na marra;
- Extensa galeria de making of.
Contras
- Ausência de localização PTBR;
- Sistema de menus pouco intuitivo, que poderia ser facilmente corrigido com recurso touch e outros retoques.
System Shock 2: 25th Anniversary Remaster — PC/PS5/XSX/Switch — Nota: 9.0Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Nightdive Studios
