Feridas lancinantes
Until Then conta a história de Mark Borja, um jovem rapaz que, embora ainda esteja no ensino médio, mora sozinho porque seus pais tiveram que se mudar para o exterior. Em meio à adolescência, ele se vê encarando um pouco de falta de rumo e desmotivação com a escola.
Boa parte do tempo do rapaz é passada no celular, interagindo nas redes sociais e ficando até tarde acordado. Um dia, enquanto estava mais uma vez muito atrasado para a entrega de um dever, Mark corre loucamente pelos corredores da escola e acaba conhecendo Nicole, uma aluna recentemente transferida.
Esse encontro logo se torna um pontapé inicial para mudar sua vida e ajudá-lo a se focar mais em uma pequena paixão pessoal: o piano. No meio dessa história toda, porém, coisas estranhas estão acontecendo com o rapaz e a realidade ao seu redor.
A narrativa então combina um elemento de mistério sobrenatural com essa experiência de crescimento pessoal. Enquanto tenta se conectar com novos e velhos amigos, Mark terá que encarar traumas tanto pessoais quanto das pessoas que ele conhece, além de alguns arrependimentos.
De forma geral, a história é bem impactante e genuína, trabalhando bem as dores e angústias que eles encaram. Sem entrar em spoilers, há dramas de família e situações de vida que facilmente evocam empatia e fazem com que a história ressoe com o emocional do jogador.
Uma direção primorosa
Until Then é uma aventura narrativa e, por conta disso, o texto é o elemento central da experiência. O jogo não conta com dublagem dos personagens e não está disponível em português, sendo possível optar por legendas em inglês, espanhol, italiano, francês, alemão, filipino, japonês ou chinês simplificado.
Parte da experiência envolve andar por alguns cenários limitados e interagir com personagens e objetos. Em vários momentos, vemos Mark simplesmente parado enquanto mexe no seu celular com os olhos vidrados na tela e temos como ver o que aparece para ele e interagir com comentários, likes e compartilhamentos (o que também altera alguns diálogos). Há, ainda, alguns minigames específicos que são iniciados em momentos da trama, como na hora de brincar no parque com os amigos dele ou na hora de treinar para a apresentação de piano.
Nos momentos em que temos apenas diálogos, o jogo chama a atenção de forma bastante peculiar na sua direção. Em um mundo marcado por ilustrações em pixel art e ambientes 3D meticulosamente planejados para harmonizarem com o estilo, os desenvolvedores brincam com o jogo de câmera e a direção visual de uma forma que pouquíssimas obras conseguem.
Temos tanto uma forte expressividade dos personagens, com animações detalhadas, quanto uma exploração de ângulos de câmera sobre os ambientes para reforçar os momentos singelos de drama. Detalhes de iluminação, chuva e outros efeitos também são apresentados de uma forma que faz o conjunto todo parecer natural, o que só reforça o nível de esforço e qualidade da direção.
Pequenos detalhes
Isso não significa que o jogo é totalmente infalível na sua produção. Mesmo quando estamos falando dos personagens, há algumas cenas em que as expressões faciais deles podem ficar um pouco estranhas. Em geral, isso acontece em alguns raros momentos em que o hiperfoco na face deixa os olhares parecendo focados em um ângulo esquisito para a cena, mas é um nível de detalhe microscópico diante da alta qualidade de todo o resto.
Um problema mais frequente é a forma como os minigames, especialmente alguns que envolvem ritmo, não contam com um feedback sonoro adequado, deixando esse ponto para o visual. Os minigames são claramente tratados como algo menos importante e são partes bem pequenas da experiência como um todo. Isso é uma pena, já que é possível ver uma preocupação similar em outros momentos. Por exemplo, quando acompanhamos um grupinho de personagens aprendendo a tocar piano, podemos escutar os erros na trilha prestando atenção.
Por fim, ainda dá para destacar que não temos um log para reler as cenas nem uma forma de auto-play, funcionalidades que tornam experiências do gênero mais confortáveis. Porém, tanto isso quanto os outros problemas que mencionei são pontos muito pequenos diante da qualidade surpreendente da experiência central da narrativa.
Uma obra-prima narrativa
Until Then é uma aventura textual cuja narrativa impactante e belíssima direção fazem dela um forte exemplo do que o gênero é capaz. Trata-se de um jogo obrigatório para aproveitar, seja no Switch ou nas demais plataformas, especialmente para quem gosta do gênero ou de histórias de crescimento pessoal e dramas humanos.
Prós
- História comovente envolvendo um elemento sobrenatural, dramas pessoais e conexões entre seres humanos com dores genuínas;
- Direção visual primorosa que consegue explorar a expressividade dos personagens em pixel e ângulos dramáticos de câmera;
- Ambientes cuidadosamente planejados para criar um estilo harmônico com pixel art;
- Interação com as redes sociais bem feita e que se reflete um pouco na trama.
Contras
- Alguns minigames rítmicos não contam com bom feedback sonoro;
- Ausência de log e auto-play;
- Em alguns raros momentos, as expressões faciais dos personagens são estranhas.
Until Then — Switch/PC/PS5 — Nota: 9.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Alessandra Ribeiro
Análise produzida com cópia digital cedida pela Maximum Entertainment