Alguns meses depois, aqui estamos nós, presenciando a nova aventura de terror da Bloober Team, conhecida pelo desenvolvimento do remake de Silent Hill 2, de Blair Witch e da trilogia Layers of Fear. Belos gráficos e uma boa premissa não simplesmente sustentam um jogo, porém, então venha comigo, vamos descer até esse inferno.
Tarefa maldita
No futuro, a humanidade praticamente não existe. Em meados da década de 1980, a Terra foi afetada por um evento misterioso chamado A Mudança, que alterou as pessoas, transformando-as em aberrações distorcidas e sedentas por matança conhecidas agora como Órfãos. Com isso, a misteriosa organização Coletivo envia seus agentes ainda mais misteriosos, conhecidos como Viajantes, para encontrar dobras temporais e extrair informações da calamidade e resquícios da sociedade morta.
Controlamos a Viajante ND-3576, inicialmente com a tarefa de encontrar outro agente que teve sua comunicação interrompida. Ao encontrar o cadáver dele, ela jura dar continuidade à tarefa do parceiro caído: encontrar Edward Wisniewski. Com isso, a Viajante mergulha na insanidade das ruínas de Nova Alvorada, a cidade que um dia era prometida como o pináculo da Polônia e um dos pontos centrais da Mudança, descobrindo traições e horrores que cantaram o início do fim da humanidade.
Ecos de uma sociedade morta
A história e sua lore são alguns dos pontos mais fortes de Cronos. Nova Alvorada (baseada na região de Nowa Wuta, da Polônia, país de origem da Bloober Team) é uma cidade devastada e grotesca, coberta de poeira, paredes de carne viva, corpos espalhados e enormes destroços do que já foi parte de uma próspera cidade. Os mistérios, como o propósito do Coletivo e a origem da Mudança, são bastante envolventes, sendo lentamente revelados por meio de áudios de testemunhas do caos e cartas e jornais detalhando pensamentos e progressão da Mudança, tudo muito bem traduzido para o português brasileiro, inclusive as pichações e letreiros em polonês, colocando uma pequena tradução na tela do que está escrito. Todos esses coletáveis podem ser acessados a qualquer momento após serem pegos, o que é bem legal.
A ambientação é extremamente imersiva, com poucas músicas para criar uma atmosfera opressora e sombria, além de uma inevitável comparação com a realidade desértica que nosso mundo sofreu com a pandemia de COVID-19, com anúncios tratando tanto a Mudança quanto o pavor do socialismo como algo terrível e que deveria ser evitado ou ignorado. A iluminação extremamente limitada oferecida principalmente pela minúscula lanterna do traje poderia ser vista como um ponto negativo, mas ela cumpre muito bem o papel de causar ansiedade e dúvida diante do que tem na escuridão. E sobre nossa protagonista, da mesma forma que Samus, Gordon Freeman e tantos outros protagonistas silenciosos em situações precárias conseguem emanar carisma por suas ações, a Viajante é uma protagonista bastante carismática pela forma robótica e precisa que age.
Seus comentários pontuais, apresentando uma devoção cega ao Coletivo, são quebrados momentaneamente por momentos mais calmos como acariciar gatos e certas partes em que o jogador tem a opção de oferecer uma resposta que soe mais natural ao interagir com um NPC. Não altera muito a história, mas são momentos que apresentam uma humanidade resguardada (ou até selada) dentro do traje opaco.
Fome
Como um bom survival horror, absolutamente tudo está contra as chances do jogador e recursos são extremamente escassos, com pouca munição à disposição e espaço de armazenamento. Não é um cenário incomum a Viajante se encontrar sem munição ou kits de reparos, forçando-a a pensar bem em como gastar os recursos, seja mirando bem nos Órfãos ou craftando munição e kits sabiamente, sendo que os itens de confecção são separados em um pequeno armazenamento igualmente limitado.
Apesar do pânico inicial de sentir que está ficando sem, é possível encontrar estes recursos pelo cenário, como no chão, escondidos em caixas ou caídos por inimigos ao serem mortos. Isso cria uma progressão natural e satisfatória do jogo, impulsionando a exploração dos ambientes, descobrindo segredos e presenciando de camarote o epílogo do Armagedom.
Não apenas isso, mas os maiores aliados que a Viajante pode ter são os já mencionados gatos. Estes bichanos não servem apenas como momentos de suavidade no meio do inferno como são coletáveis extremamente importantes, oferecendo chaves para abrir locais secretos e Núcleos, o item crucial para as melhorias do traje da Viajante, como aumentar sua resistência e seu espaço de armazenamento.
Em benefício dos Órfãos
Infestando a Polônia pós-apocalíptica temos os Órfãos, os resquícios da humanidade após a pandemia da Mudança. Essas aberrações insanas são tenebrosas e sua principal individualidade comparada com outros monstros do gênero é sua capacidade de fundir com compatriotas caídos e ficarem mais fortes, velozes e resistentes, de acordo com o inimigo morto que devoram. Exemplo: existem os básicos, com o ataque básico de bater com seus tentáculos; também tem os atiradores de ácido, menos resistentes mas com poder de fogo; os blindados, com o corpo praticamente coberto por uma proteção e sendo necessário acertar a única parte exposta para matá-los. Quando um Órfão encontra outro morto, o vivo vai imediatamente querer fundir com o cadáver e ficar mais forte, assimilando as habilidades e criando um desafio maior.
Para impedir a fusão, é extremamente recomendado atear fogo nos corpos por meio de granadas inflamáveis ou explodindo botijões de gás (não se preocupe, as chamas não afetam a Viajante). E para enfrentar as aberrações, a Viajante tem um pequeno arsenal de fogo como pistola e escopeta, podendo atirar normalmente ou carregar o tiro, aumentando o poder de fogo e incapacitando os monstros mais rapidamente ao custo de deixar nossa protagonista vulnerável enquanto carrega a arma. A câmera é um pouco lenta, mesmo regulando a velocidade nas opções (que, aliás, têm uma grande variedade para cumprir regras de acessibilidade, o que é muito legal) e a mira é pequena demais em algumas armas, causando mais frustração do que um desafio interessante no começo, mas a adaptação é rápida com as imperfeições.
Os Órfãos são inimigos legais mas não muito impressionantes. Claro, é inegável que os bichos são assustadores, um imenso desafio para matar e uma satisfação ainda maior ao vencer todos em uma horda para poder respirar aliviado, mas a referência a outros monstros é clara, aludindo aos zumbis de Resident Evil com uma pitada da Coisa de O Enigma do Outro Mundo e, principalmente, os Necromorphs de Dead Space. A inspiração não é algo ruim, mas poderia ter um pouco mais de variedade entre os monstros ou até mesmo um bestiário para entender melhor como eles funcionam. Mesmo assim, os sustos são garantidos, com o sufoco de ficar em corredores apertados rodeado por esses monstros — o mais fino dos sucos do horror.
Escuridão gargântua
Agora jaz a dúvida que roda desde o primeiro trailer lá na Direct de julho: como o jogo está no Switch 2? Muito bem, na verdade. Os gráficos estão muito bonitos, rodando bem firmes tanto no modo portátil quanto na televisão, com um tempo de carregamento extremamente curto (seja para começar o jogo ou para retornar à exploração após uma trágica morte). Cronos ainda suporta as funcionalidades de giroscópio e mouse, respondendo muito bem e aumentando ainda mais a imersão no pesadelo.
A única falha da conversão do jogo ao hardware da Nintendo são as texturas do cenário (e até de NPCs em algumas cutscenes) que, de vez em quando, parecem incompletas ou ainda carregando. Não é um problema que arruina o jogo, apenas uma inevitabilidade pela conversão e que ocorre em momentos específicos porque, ao se aproximar, os detalhes ficam mais ricos e emanando toda sua glória grotesca.
O gueto de Nova Alvorada
Cronos: The New Dawn é um dos melhores títulos da primeira leva de jogos third parties no Switch 2. Com uma história interessante, imersão assustadora e mistérios a serem resolvidos, é uma excelente porta de entrada para o gênero de terror no novo console da Nintendo. Com o anúncio dos mais recentes Resident Evil ao Switch 2, esperamos que eles façam tão bonito no feio quanto Cronos.
Prós
- História envolvente, com lore bem construída e paralelos com eventos recentes de nosso mundo;
- Atmosfera muito bem feita, com trilha sonora praticamente ausente mas de alta qualidade;
- Inimigos assustadores que trazem um bom desafio;
- Protagonista misteriosa mas carismática;
- Muito bem traduzido para o português brasileiro;
- Recursos escassos que obrigam a adaptabilidade e o potencial máximo da jogabilidade;
- Roda sem problemas no Switch 2, sendo visualmente muito bonito e com carregamentos rápidos;
- Coletáveis legais, ampliando o escopo da história. Além de gatos.
Contras
- Alguns engasgos nas texturas quando se está longe de pontos no ambiente;
- Apesar da mecânica de fusão ser legal e visualmente assustadora, Órfãos são inimigos genéricos em conceito.
Cronos: The New Dawn — PC/PS5/XSX/Switch 2 — Nota: 8.5Versão utilizada para análise: Switch 2
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia cedida pela Bloober Team







