Brincadeiras à parte, é fato que a saudade e o apego emocional podem prejudicar a nossa análise crítica, fazendo com que coisas, épocas e até mesmo relações do passado pareçam ser muito melhores do que realmente foram um dia.
Felizmente, Earthion, shoot’em up 16-bits desenvolvido pela lendária Ancient (do igualmente lendário Yuzo Koshiro), consegue escapar dessa armadilha, provando ser um shooter espacial que merece ser conferido e jogado pelos fãs do gênero — mesmo aqueles que não tiveram contato com a nostálgica era de ouro do estilo.
Quando a fúria também se manifesta no espaço sideral
No universo de Earthion, os recursos naturais da Terra já se esgotaram. Como resultado, grande parte da humanidade fugiu para Marte (aqui, um planeta colonizado e finalmente habitável).
Porém, quando invasores alienígenas hostis lançam um ataque à Terra, aqueles que ainda vivem no planeta não têm escolha, a não ser provar a sua força nesse momento de crise e revidar.
E é aí que você surge: no papel da pesquisadora ambiental Azusa Takanashi, você tem a missão de pilotar o caça espacial de última geração YK-IIA e coordenar o contra-ataque mais importante da história. Perder não é uma opção.
Retornando à gênese, com estilo
Em termos de jogabilidade, Earthion é um verdadeiro clássico moderno, traço explicado em grande parte pelo seu desenvolvimento, originalmente conduzido para o saudoso SEGA Mega Drive. Logo, na prática, é importante ressaltar que, com este lançamento, recebemos em 2025 um novo (e autêntico) jogo 16-bits.
Sim, em um cenário no qual muitos desenvolvedores se gabam pela estética ou pelo estilo retrô de seus games, a obra da Ancient se sai como verdadeiramente legítima nesse quesito — tanto que a estreia em cartucho para o console da SEGA está prevista para ocorrer em 2026, sob a publicadora Limited Run Games.
Sendo objetivo, porém, esse “retorno à gênese” tem aspectos positivos e também negativos. Começando pelos prós, Earthion será instantaneamente apreciado por quem, assim como eu, viveu o que a época dos 16-bits e a saudosa guerra dos consoles (tem como esquecer?) tinha a oferecer.
Pois é: da construção dos menus e efeitos sonoros típicos do “Megão” à estética colorida e vibrante em cada pixel, passando pela jogabilidade que prioriza a ação aos tutoriais, a nostalgia com um leve toque moderno é sentida de imediato, e consegue contagiar do primeiro ao último momento com o jogo.
A campanha do título é dividida em oito fases de rolagem horizontal, nas quais o objetivo primário é bastante simples: destruir as ameaças espaciais antes que elas façam o mesmo com você. Para ajudar na missão, sua nave YK-IIA conta com um sistema de upgrades e também pode mudar e aprimorar sua forma de atirar em tempo real, tocando nos itens encontrados no campo de batalha.
Já a dificuldade do jogo segue os padrões do gênero, com boa visibilidade de projéteis, mas uma tendência ao bullet hell nas dificuldades mais altas. Caso você, como eu, esteja um pouco enferrujado, a dica aqui é colocar no modo fácil (são quatro níveis disponíveis de dificuldade) até se acostumar com a proposta — o desafio mais brando também é uma ótima chance de conhecer os vários modos de disparo da navinha.
E, claro, como esperado, os chefes são um destaque à parte, tanto no desafio imposto quanto nos visuais. Graças às décadas de experiência, a Ancient soube usar os limites de hardware do Mega Drive com maestria, produzindo um verdadeiro espetáculo retrô nesses momentos. Para os nostálgicos por um tempo que não volta, a emoção e a diversão estão garantidas, então.
Panela velha é que faz comida boa?
Mas, feitos os elogios, é preciso mencionar onde Earthion desliza. Primeiramente, a sua campanha é curta para os padrões atuais da indústria: os jogadores mais habilidosos certamente não demorarão muito tempo para dominar as oito fases disponíveis, e, por mais que existam desafios opcionais e outras opções de dificuldade, fica um gostinho agridoce de “quero mais” na boca quando se nota a brevidade da criação.
O resgate de um sistema de créditos e passwords para registrar o progresso também só serve para lembrar o quanto esses sistemas são ultrapassados: a menos que você queira mergulhar de cabeça na nostalgia e dar um jeito de anotar as senhas (pelo menos agora dá para usar fotos ou capturas de tela em vez de lápis e papel), é difícil não sentir falta de um salvamento automático (ou até dos infames save states).
A dinâmica de aprender jogando (quem aí lembra que antigamente era assim?) também pode ser irritante para os jogadores mais novos, acostumados a um breve tutorial antes do início das campanhas. É bem verdade que há um pequeno manual escondido nas configurações, mas ainda assim acredito que a aventura poderia se beneficiar com melhorias nesse sentido.
Um verdadeiro elo com o passado
Já nos aspectos técnicos, Earthion se sai muito bem: dado o seu desenvolvimento para Mega Drive, o que vemos nas plataformas modernas, como o Switch, é uma emulação própria, sem quaisquer problemas de performance e repleta de benefícios visuais tanto no televisor quanto no modo portátil.
Sim, embora a apresentação padrão emule um display 4:3 e conte com um filtro CRT — simulando as TVs de tubo de antigamente —, há bastante flexibilidade nas configurações para o jogador escolher como deseja que o jogo seja apresentado, das molduras ilustradas à forma de renderização dos pixels.
A trilha sonora, assinada por Yuzo Koshiro, também mostra que o mestre continua na ótima forma que o consagrou como um dos grandes nomes da Game Music, ainda na década de 1990. Particularmente, gostei bastante dos temas Endless Horizon e Cosmic Tier, e a presença de opções dedicadas à renderização do áudio é um aceno importante aos entusiastas, capazes de apreciar as diferenças de som entre os vários modelos do Mega Drive.
Por fim, uma ótima notícia para os fãs brasileiros é a localização para PT-BR, que precisa ser ativada nas opções. Para quem um dia sonhou em ver os jogos traduzidos para o nosso idioma lá nos anos 1990, é um feliz lembrete de que a indústria evoluiu e que o nosso mercado finalmente está sendo reconhecido como um dos maiores e mais promissores do mundo.
Uma divertida e imperdível viagem no tempo
Earthion cumpre o seu propósito, entregando um verdadeiro clássico moderno que consegue envolver e divertir independentemente do seu óbvio apelo nostálgico. No fim, fãs das obras 16-bits se sentirão em casa com este lançamento, mas novatos e curiosos também encontrarão divertimento aqui. Em suma, vale a pena viajar no tempo e salvar o planeta como fazíamos lá na década de 1990.
Prós
- Em pleno 2025, entrega uma obra de coração noventista que prova por que a geração 16-bits é considerada por muitos o auge dos shoot’em ups;
- As quatro opções de dificuldade incluídas acomodam tanto novatos quanto veteranos e garantem a conclusão da campanha;
- A trilha sonora assinada por Yuzo Koshiro é um destaque à parte e um deleite para os ouvidos;
- Múltiplas opções de customização de imagem e som agradarão aos entusiastas, assim como a emulação de boa qualidade, sem problemas de performance no Switch;
- Localização em PT-BR.
Contras
- A campanha é curta para os padrões atuais;
- Os sistemas de créditos e passwords se provam antiquados;
- A ausência de um tutorial propriamente dito pode incomodar jogadores que não cresceram nas décadas de 1980 e 1990.
Earthion — PC/PS4/PS5/XSX/Switch — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Vitor Tibério
Análise produzida com cópia digital cedida pela Limited Run Games










