GameCube: jogos que nasceram originalmente no Nintendo 64

Protótipos do Nintendo 64 ganharam nova vida no GameCube, revelando bastidores de jogos reinventados, cancelados e transformados.

em 15/11/2025

A transição entre gerações de consoles costuma entregar histórias interessantes de jogos que começaram seu desenvolvimento em uma plataforma mais antiga, mas foram transferidos para a nova por diversas razões, seja por limitações técnicas, custo de produção ou estratégias de mercado.

No caso do Nintendo 64 e do GameCube, há alguns títulos memoráveis que ilustram bem esse fenômeno: foram idealizados ou prototipados para o N64, mas acabaram sendo lançados no GameCube. 

1080° Avalanche — a sequência que migrou do N64

Desde os primórdios do GameCube, a Nintendo buscava títulos que pudessem continuar ou expandir franquias já consagradas no N64. Um exemplo notável é o 1080° Avalanche, lançado em 2003 para o GameCube. Esse jogo é sequência direta de 1080° Snowboarding, que foi um grande sucesso no Nintendo 64.


A história de desenvolvimento mostra que houve, de fato, planos iniciais de produzir uma continuação para o N64 com a Left Field Productions. Porém, a pré-produção foi abortada nos primórdios, com o foco redirecionado para o GameCube, já anunciando seu poder de processamento gráfico mais moderno.

Com o projeto sob responsabilidade do estúdio interno Nintendo Software Technology (NST), o jogo foi retrabalhado para aproveitar os recursos do GameCube, resultando em pistas mais elaboradas, eventos como avalanches e suporte a multiplayer via LAN e tela dividida.

Star Fox Adventures — de Dinosaur Planet a uma aventura estrelada por Fox

Talvez um dos exemplos mais emblemáticos dessa migração seja o Star Fox Adventures. O jogo, lançado em 2002 para o GameCube, teve sua origem como um projeto totalmente diferente no Nintendo 64: um jogo chamado Dinosaur Planet.


Durante o desenvolvimento, Shigeru Miyamoto percebeu semelhanças entre os designs dos personagens de Dinosaur Planet e os da série Star Fox, então sugeriu a inclusão de Fox McCloud, e a Rare foi orientada a reformular o jogo para encaixá-lo no universo de Star Fox — aproveitando todo o trabalho já feito, mas mudando de console para o GameCube.

O resultado foi uma aventura de ação com forte componente de exploração, bem diferente do tradicional shooter espacial da franquia. Apesar das críticas por fugir do estilo clássico, ele se tornou um marco da biblioteca do GameCube e uma curiosidade interessante para quem acompanha a evolução dos projetos da Nintendo.

Eternal Darkness: Sanity’s Requiem — horror psicológico que nasceu no N64

Outro caso fascinante é Eternal Darkness: Sanity’s Requiem, um jogo de horror psicológico lançado para o GameCube em 2002. A sua equipe desenvolvedora, a Silicon Knights, havia iniciado o projeto para o Nintendo 64.


Segundo relatos, a versão para N64 teria exigido um cartucho de capacidade muito grande, com gravações de voz, sons surround e uso opcional do Expansion Pak, o que tornava o desenvolvimento caro e tecnicamente desafiante. Com a iminência do lançamento do GameCube, a Nintendo decidiu migrar o título para a plataforma a laser, aproveitando a mídia de disco óptico e reduzindo custos de produção.

A mudança exigiu refazer muitos componentes, como motor gráfico, arte e som, mas também permitiu que o sistema de "sanidade" (sanity meter), uma das mecânicas mais inovadoras do jogo, fosse implementado com mais ambição. O resultado foi um jogo cult que até hoje é lembrado como um dos mais originais no GameCube.

Resident Evil 0 — do protótipo de N64 ao terror no GameCube

Também no universo do horror, Resident Evil 0 tem uma origem curiosa: a Capcom realmente começou a desenvolver uma versão para o Nintendo 64, mas acabou transferindo o projeto para o GameCube.


Há registros de uma demonstração da versão N64 apresentada em convenções como a Tokyo Game Show e a E3, com cenas iniciais mostrando um trem (onde começa o jogo) e até a mecânica de troca de personagens (Rebecca Chambers e Billy), elementos que sobrevieram à versão final do GameCube.

Apesar de o protótipo para N64 nunca ter sido lançado comercialmente, essa mudança ressaltou a ambição da Capcom em usar um hardware mais poderoso para entregar gráficos, animações e ambientes mais vivos, algo que o GameCube permitiu de forma mais eficaz do que o cartucho N64.

Cubivore: Survival of the Fittest — a bizarrice poligonal que sobreviveu

Entre os títulos mais exóticos da transição, temos Cubivore: Survival of the Fittest, um jogo de ação/aventura desenvolvido pela Saru Brunei em parceria com a Intelligent Systems. Ele foi lançado para o GameCube, mas o desenvolvimento começou originalmente para o Nintendo 64, usando o periférico 64DD.


O conceito era bastante singular: criaturas cúbicas (os Cubivores) devoram umas às outras para evoluir, mudar de forma e ficar mais fortes. O protótipo para N64/64DD não vingou, mas os desenvolvedores migraram para o GameCube e mantiveram a essência visual simples, quase "lembrando gráficos de N64", mesmo na versão final.

O mais curioso de Cubivore é que, através de vazamentos na internet de versões jogáveis do título para o Nintendo 64, é possível notar que as versões são muito similares, não tendo, principalmente, grandes mudanças na parte visual do jogo.

Kirby Air Ride — de remix de N64 a corrida futurista no GameCube

Finalmente, Kirby Air Ride, lançado para o GameCube em 2003, também tem raízes no Nintendo 64. Durante o início do desenvolvimento, ele era conhecido como Kirby Bowl 64 ou Kirby Ball 64 .


Em eventos como a estreia do N64 na Shoshinkai de 1995, uma demo do jogo mostrava uma versão já bastante próxima da ideia final: Kirby rolando em formato esférico, competindo em pistas ou rolando sobre obstáculos. Com o tempo, o conceito evoluiu bastante — passou por diferentes protótipos até se tornar a corrida aérea com hovercrafts e modos de cidade que virou a versão oficial de GameCube.

A mudança para o GameCube permitiu expandir as ideias: suporte a LAN multiplayer, três modos (Air Ride, Top Ride e City Trial) e gráficos mais polidos, algo difícil de implementar com a limitação técnica do N64 original.

Projetos perdidos, rumores e transições que nunca se concretizaram

Quando falamos de jogos que teriam migrado do Nintendo 64 para o GameCube, existe um terreno curioso em que rumores, pitches internos e lendas de bastidores se misturam. O caso mais famoso é o lendário “Metroid 64”, frequentemente imaginado pelos fãs na época do N64. Desenvolvedores da Nintendo já comentaram que ideias foram discutidas, mas nunca passaram do estágio conceitual — o que fez Metroid Prime, já criado para o GameCube, ser interpretado por muitos como a evolução espiritual de algo que, na verdade, nunca existiu de fato.


Rumores semelhantes cercam títulos como Die Hard Vendetta, ocasionalmente apontado como um projeto que teria começado no N64, embora não existam registros concretos que sustentem isso além de coincidências estéticas e da proximidade temporal com a geração anterior. Já Metal Gear Solid: The Twin Snakes às vezes aparece nessas listas por associação indireta: a Silicon Knights, responsável pelo remake, realmente tinha projetos iniciados no N64 (Eternal Darkness), mas Twin Snakes nunca foi planejado para o console de 64-bits.

Até mesmo Pikmin é citado como fruto de experimentos tardios do N64, já que Miyamoto mencionou ter brincado com ideias relacionadas a grupos de personagens antes do GameCube. Ainda assim, não há sinal de prototipagem real — o conceito só ganhou forma quando o poder do novo hardware permitiu exibir dezenas de criaturas simultâneas com fluidez. 

No fim, boa parte dessas histórias permanece no campo das suposições, compondo o folclore que envolve a transição entre o N64 e o GameCube e enriquecendo o imaginário sobre jogos que poderiam ter existido, mas ficaram apenas como ecos de uma geração que estava prestes a mudar.

Migrações bem vindas

Títulos como  1080° Avalanche, Star Fox Adventures, Eternal Darkness, Resident Evil 0, Cubivore e Kirby Air Ride mostram como a mudança de console entre gerações pode alterar profundamente o destino de um jogo.


Seja por limitações de mídia, custo de produção ou simplesmente por ambições criativas, muitos desenvolvedores optaram por migrar seus projetos do Nintendo 64 para o GameCube. Essa transição não só permitiu que ideias mais ousadas fossem realizadas, mas também ajudou a compor um catálogo diversificado e inovador para o GameCube.

Ao revisitar essa história, vemos que o potencial criativo muitas vezes depende não apenas da imaginação dos desenvolvedores, mas também das ferramentas tecnológicas disponíveis — e o salto entre o N64 e o GameCube foi decisivo para muitos desses jogos se tornassem realidade.

Revisão: Vitor Tibério
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Fernando Lorde
Fernando Paixão Rosa, normalmente referenciado por Lorde, está escrevendo pela internet afora há mais de dez anos e com alguns livros publicados. Escutando música 24h/dia, fã de cultura pop em suas muitas manifestações e mais fã ainda das IP's da Nintendo. Registrando as aventuras nos games no Instagram (@lordeverse) e Twitch (@lordeverso).
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