20 anos de Pokémon, 20 lições de Game Design - #07: Fomentando comunidades

Com o decorrer dos anos, a legião de pokemaníacos só aumentou — e não há previsão para diminuir.

em 09/02/2016
Todo jogo moderno tem uma comunidade à sua volta, sendo ele multiplayer ou não. É normal que fãs se reúnam, conversem sobre o título, procurem dicas, façam fanarts e interajam entre si. Isso é ainda mais verdadeiro se a obra em questão é competitiva. As comunidades é que mantêm o jogo vivo, com a opinião e feedback do público sendo de suma importância para o desenvolvimento contínuo do game.


Pokémon, claro, tem sua comunidade — uma das mais antigas e fortes dentro do mundo dos games, diga-se de passagem. Mas ela não surgiu de forma “espontânea”; a série conseguiu fomentar de forma consciente o seu nascimento e crescimento. Várias decisões de mercado e game design foram usadas de forma deliberada com esse propósito.

Obviamente, muitos jogos bem-sucedidos — especialmente MOBAS e MMOs — também fazem isso. Entretanto, quando Pokémon surgiu, a internet não era algo comum. Enquanto alguns games de PC, como Quake, tiveram suas comunidades incubadas nos primórdios da net, funcionalidades online não passavam de meros experimentos confinados nos consoles e portáteis. Assim, Pokémon teve que criar uma comunidade da única forma que lhe era possível: obrigando os jogadores a interagirem um com os outros na vida real.

Moldado para o bolso

Muito se fala que os portáteis da Nintendo devem muito de seu sucesso a Pokémon. Mas a recíproca é verdadeira: a série não teria metade de seu sucesso se não fosse criada com o Game Boy em mente. Muitas de suas mecânicas partem do princípio de que o jogador pode levar o game consigo para qualquer lugar.
A primeira e mais óbvia mecânica a fazer uso disso é o multiplayer. Em 1997, experiências portáteis eram primariamente individuais. Poder batalhar com os amigos em qualquer lugar tornava Pokémon muito mais social. Contudo, para que isso funcionasse era necessário que, além dos dois jogadores terem Game Boys e uma cópia do jogo, algum deles tivesse um Link Cable.

Outras mecânicas além do competitivo foram implementadas para justificar a compra do acessório, mesmo para os jogadores que não gostam de desafiar os amigos. A mais clara era a existência de duas versões diferentes do mesmo título — Red & Blue, Gold & Silver, Ruby & Sapphire, e assim por diante.

Essa separação não tem objetivo puramente comercial. Muito mais do que uma forma de extorsão, o propósito dessa decisão era fazer com que os jogadores interagissem entre si. Mesmo que alguém decidisse ignorar completamente o multiplayer, graças a essa característica ainda havia benefícios em comprar um Link Cable e jogar com outras pessoas.

Apenas com a ajuda de alguém era possível completar a Pokédex, já que alguns monstros eram exclusivos de uma ou outra versão. Isso obrigava o Pokémon Trainer a procurar ativamente parceiros para trocar monstrinhos. Mesmo que todas as crianças da rua decidissem comprar a mesma versão do jogo, interagir com outros treinadores ainda era benéfico, com evoluções só possíveis de se conseguir a partir de trocas e Pokémon com diferentes IVs.

Iterações futuras adicionaram ainda mais recursos para incentivar a comunicação entre jogadores. Berry Blenders, bases secretas, troca de itens e TMs, Friend Safari… Mesmo o jogador mais solitário tem algum motivo para jogar “sozinho junto”.

Pessoal x Digital

Hoje em dia, a internet não é só comum, como essencial. A maioria esmagadora dos games possui algum tipo de funcionalidade online — e Pokémon não é exceção. Entretanto, é interessante perceber como a comunidade da série pouco mudou mesmo com o novo paradigma. A verdade é que a franquia não precisava da internet para aumentar sua popularidade. Quando a ferramenta começou a ser timidamente implementada na quarta geração, a legião de pokemaníacos já dominava o mundo.
O mundo!
Por ser anterior à era digital, a comunidade de Pokémon possui suas particularidades. A mais notável é a importância da presença física dos jogadores — talvez somente comparável às comunidades de jogos de luta, que foram fomentadas no arcades. Mesmo hoje em dia, mecânicas que promovem encontros entre os treinadores de Pokémon continuam a ser adicionadas, como é o caso dos Mystery Gifts e monstrinhos distribuídos em eventos.

É o tipo de coisa que funciona infinitamente melhor nos EUA e Japão, onde os eventos são frequentes, mas a intenção não é alienar jogadores geograficamente isolados. O intuito é reunir as pessoas, perpetuando essa característica física da comunidade. Essa propriedade é incentivada mesmo sem a participação ativa da Nintendo, pelos próprios jogadores, através de eventos e campeonatos locais.
Inveja.
Infelizmente, nesse aspecto a série dá exemplos positivos e negativos. Por um lado, a Nintendo e Pokémon Company entendem muito bem as peculiaridades de sua comunidade, promovendo eventos e campeonatos com regularidade. Por outro, o potencial que a internet teria para torná-la ainda mais ativa é desperdiçado. As funcionalidades online dos jogos da franquia não passam do básico, com a maioria da movimentação dentro dos meios digitais sendo feita por grupos extraoficiais como Smogon. Bem, não é como se estivessem faltando pokemaníacos no mundo, certo?

Revisão: Robson Júnior
Capa: Felipe Araújo
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