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Análise: Children of Morta é um bom indie para se jogar com um amigo no Switch

O roguelike parece ter sido feito para uma experiência de dois jogadores, mas falha em prender de verdade no single player.



Uma área sendo tomada por um mal antigo que, aos poucos, começa a ser consumida pela grande corrupção. Uma família que vive por ali há vários anos e, não por acaso, mora bem em cima de um templo mágico sagrado diretamente ligado ao combate dessa corrupção. Nada como salvar o mundo indo direto para o seu porão, não é mesmo?

Em Children of Morta, cabe a você (e, de preferência, mais um amigo) a tarefa de liderar a família Bergson nessa importante guerra contra as forças do mal. O título chega ao Switch como mais um dungeon crawler roguelike indie com gráficos adoráveis. Mas será que ele é só mais um dos muitos na multidão ou o conto dos guardiões da montanha de Morta consegue se destacar?

Antes de tudo, família

Por sorte, os Bergson são uma determinada família de guerreiros. E mesmo os que não estão preparados para a batalha logo no começo eventualmente acabam se unindo à causa. Durante o tutorial, você começa controlando o "pai", John, que com sua habilidade de usar o escudo atua como o típico "tanque" do time. Em pouco tempo, Linda, a filha mais velha, traz consigo o seu arco e flecha e ocupa o papel de primeiro personagem ranged (que ataca de longe) disponível no jogo. A partir daí já é possível jogar em dupla com algum amigo (a forma ideal) ou pelo menos escolher seu estilo de jogo preferido entre o pai e a filha.

Quanto aos outros quatro personagens, eles vão sendo introduzidos aos poucos por meio de cutscenes entre as idas aos calabouços de uma forma bem orgânica e interessante. A inclusão de cada novo Bergson na seleção de personagens é sempre precedida por uma longa narrativa pessoal que se desenrola aos poucos e de forma episódica. Todos têm um motivo para começar a lutar (ou para demorar até entrar na batalha), e conhecer essas histórias mais a fundo ajuda bastante na construção de uma personalidade marcante para cada um — mesmo que ninguém nunca fale nada, o que é o caso. 



A história, afinal, é parte essencial de Children of Morta — e ela transcorre quase como em um livro infantil. Os adoráveis gráficos minimalistas pintados à mão em pixel art, unidos à presença constante da estóica voz do narrador e às fluidas e suaves animações, contam a história dos Bergson antes, durante e depois das inúmeras runs típicas dos roguelikes. Os menus, por sinal, são todos integrados ao próprio espaço físico da casa da família. Por exemplo, os upgrades gerais para a família, como aumentar o dano, a vida, ganhar mais ouro e coisas do tipo, são feitos em diferentes cômodos da casa em que você "navega" como o menu. Alguns eventos relacionados a história acontecem ali na mesa de jantar no centro da casa ou do lado de fora no pátio ou na sacada, e é só descer as escadas logo no meio para acessar a área das dungeons.

As três grandes dungeons escondidas no porão dos Bergson são compostas geralmente por duas ou três fases que, por sua vez, se dividem em dois, três ou quatro níveis diferentes. É preciso acabar uma dungeon inteira para liberar a próxima e também acabar cada fase em ordem. Essas fases, no entanto, são sempre um pouco diferentes, graças à mecânica de geração aleatória tradicional dos roguelikes. O primeiro mundo tem uma temática de caverna, o segundo é um deserto e o terceiro um pouco industrial, porém eles não se diferem tanto assim entre si. Geralmente, você irá gastar maioria do seu tempo lidando com grandes hordas de inimigos (o que pode ser bastante difícil no começo) enquanto encontra algumas salas especiais com alguma side story ou itens específicos. 



A única coisa que se mantém no seu inventário após você ganhar ou perder uma run é o ouro coletado, mas vários itens passivos, ativos e upgrades para suas habilidades podem ser encontrados ao longo da jogatina. As primeiras partes de cada fase são bem mais complexas e, quanto mais tempo passa e mais itens são encontrados, tudo vai ficando mais simples — já que seu personagem simplesmente se torna um tanto overpowered.

Falando em melhorar os atributos dos membros da família, é claro que isso é possível em um jogo com forte elementos de RPG como Children of Morta. Cada personagem tem a sua própria skill tree detalhada com uma quantidade considerável de upgrades passivos e ativos. Você começa no nível com apenas uma habilidade e, aos poucos, abre um grande leque de novas opções. Inclusive, uma das coisas mais legais do título é que cada personagem também ativa habilidades passivas globais para toda família ao longo do tempo. Desde melhorar algum atributo para todo mundo, como a vida ou a velocidade de movimento, até alterações em algumas habilidades. Como o jogo deixa bem claro, a família realmente vem antes de tudo.

Uma ótima experiência multiplayer

Roguelikes focados em exploração de dungeons, mesmo que de certa forma infinitos, tendem a se tornar repetitivos em pouco tempo — e esse também é o caso de Children of Morta. O modo single player, por exemplo, intriga mais pela dificuldade elevada do começo da história do que por qualquer envolvimento maior com o gameplay ou a própria narrativa. Sem falar que, jogando sozinho, o progresso pode vir a ser bastante lento e frustrante. No single player, se você morreu, acaba por ali mesmo. Já no modo para dois jogadores, você e seu amigo podem potencialmente ficar vivos para sempre, uma vez que é possível reviver o aliado que perdeu todos os pontos de vida.

Jogar sozinho pode até ser bom para algumas sessões descontraídas, principalmente em modo portátil, mas o título brilha mesmo no seu multiplayer. Só é difícil de entender por que um jogo tão focado em uma família e em todos os seus membros é limitado a apenas dois jogadores. Children of Morta teria sido perfeito com um modo para quatro jogadores. Provavelmente a implementação não teria sido tão simples e decidiram limitar a experiência para garantir a integridade do jogo — e, pelo menos, a fórmula funciona muito bem para duas pessoas.


O ponto alto de Children of Morta é seu gameplay desafiador e interessante (pelo menos durante as primeiras horas de jogo) e o ápice da experiência realmente é durante o modo multijogador. Correr o mapa inteiro fugindo de hordas ridiculamente grandes de inimigos com um amigo é o melhor que o título tem a oferecer.

Há todo um foco na história, com longas cutscenes lotadas de exposição em que o narrador fala sem parar sobre espíritos mitológicos e momentos sensíveis entre a família, só que tudo é meio difícil de acompanhar ou prestar atenção. A narrativa muitas vezes dá uma freada repentina no ritmo do jogo e obriga você (e seu amigo) a parar um pouco e tentar acompanhar mais uma longa narração. A intenção certamente era povoar os lindos gráficos com uma bela história à altura, mas infelizmente isso não é alcançado. 



Outro problema expressivo do título é a otimização da sua performance no Switch. Prepare-se para esperar bastante tempo em todo e qualquer loading, desde a simples abertura do jogo até a entrada em dungeons. Além disso, é normal que ocorra um ocasional slowdown ou outro durante a aventura, mas o maior problema é relacionado à parte sonora. Por alguma razão, o som de Children of Morta tende a dessincronizar da ação que ocorre na tela. Chega a ser engraçado: aos poucos, alguns efeitos sonoros vão ficando atrasados e o atraso fica cada vez maior. Os sons acumulados eventualmente se unem em uma grande bola de som que torna a experiência insuportável. Não acontece toda hora, mas eu fui obrigado a acabar algumas runs com o som da TV no "mudo".

Outra coisa que atrapalha um pouco é a presença ou não de inimigos durante a batalha, que pode ser confusa. Algumas salas só abrem após você derrotar todos os lacaios, só que algumas vezes esses inimigos ficam presos nas paredes, obrigando você a atacar cada cantinho da sala até encontrá-los para seguir em frente. 



Apesar de algumas falhas, Children of Morta é um indie charmoso, bem feito e bastante divertido para dois jogadores. A curva de dificuldade é um pouco estranha. O começo do jogo é extremamente difícil e o final oferece pouco desafio, já que graças aos vários upgrades disponíveis geralmente você chega no último mundo forte demais. É uma pena também que não exista qualquer tipo de conteúdo post game — eu esperava no mínimo uma fase extra ou um personagem secreto, já que ainda faltava "upar" várias skills para diversos membros da família.

No entanto, a jornada até o final definitivamente agrada. Cada um dos seis personagens tem o seu estilo bem marcado e o jogo incentiva você a usar todos eles. São vários itens, habilidades e inimigos para conhecer. Eventualmente, a aventura fica sim repetitiva e não tem mais nada a oferecer, mas o caminho até lá não é dos piores. Junte-se a um amigo e dê uma chance para Children of Morta algum dia. 


Prós 

  • Ótima experiência para dois jogadores;
  • Lindos gráficos pixel art pintados à mão e uma animação fluida e agradável.
  • Bom sistema de level up dos membros da família.
  • Bastante desafiador e intrigante até certo ponto.

Contras

  • O single player não cativa tanto quanto o modo para dois jogadores; 
  • O jogo começa muito difícil e fica cada vez mais fácil ao longo do tempo;
  • Slowdowns, carregamentos longos e alguns bugs atrapalham a experiência;
  • A história não empolga muito e é um tanto difícil de acompanhar.
Children of Morta - Switch/PC/PS4/XBO - Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Jorge Neto
Análise produzida com cópia digital cedida pela 11 bit studios

Escreve para o Nintendo Blast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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