Fire Emblem: não há problema em jogar no modo Casual

Algumas pessoas só querem aproveitar a história e não há nada de errado nisso.

em 18/07/2020
Fire Emblem é uma franquia criada em 1990 pela Intelligent Systems para NES. Em abril deste ano, a série completou 30 anos e já conta com 16 jogos principais, com alguns remakes entre eles, e quatro spin-offs. Para iniciar esta discussão, no entanto, deixaremos os títulos secundários de lado.


Fire Emblem é classificado como um TRPG, sigla para tactical role-playing game, gênero que prioriza o raciocínio tático sobre a estratégia. Embora esses dois termos possam até parecer intercambiáveis, escondem uma diferença sutil: a tática prioriza o micro, isto é, objetivos que podem ser alcançados em um curto prazo, enquanto a estratégia foca no macro, que pode ser visto como um propósito maior.

Apesar de a tática fazer parte da estratégia, ao transportar essas definições para os jogos, ficará mais fácil de entender a diferença entre um termo e outro. No caso de Fire Emblem, os jogos giram em torno de recrutar personagens, treiná-los e dar fim a uma guerra ou impedir a ressurreição de um demônio.

Embora Fire Emblem não seja tão difícil para quem já estiver acostumado com o gênero, várias particularidades podem alterar o resultado de um combate, sobretudo o famigerado RNG (do inglês, random number generator, gerador de número aleatório), um dos principais motivos para a raiva dos jogadores de TRPGs. Os jogos da franquia em questão possuem, acima de tudo, outro fator determinante: o sistema de permadeath, no qual um personagem derrotado é perdido para sempre.

Devido a esse sistema, jogadores podem demorar horas para completar um mapa, uma vez que os movimentos devem ser minuciosamente calculados. Imagine, então, a frustração que é ter que recomeçar a batalha porque um posicionamento errado fez com que seu general fosse morto por um mago inimigo.
Não foi uma boa ideia deixar a Tana na mira de um arqueiro...
A constante de tentativa e erro era o modus operandi da série até o lançamento de Fire Emblem: New Mystery of the Emblem (DS), em 2010. Neste remake do terceiro título da franquia, foi adicionado um novo modo de jogo, o Casual, que se opõe ao tradicional Classic ao permitir que personagens abatidos em combate apenas se retirem do campo de batalha temporariamente, podendo ser usados nas missões conseguintes.
Tela de seleção de modo em New Mystery of the Emblem
A adição do modo Casual gerou certo rebuliço na comunidade (fandom) de Fire Emblem. Muitos jogadores veteranos se revoltaram com a “quebra de tradição” e começaram a alegar que quem opta pelo Casual não está “jogando Fire Emblem de verdade”.

No meu caso, o primeiro contato com a franquia foi por meio de Fire Emblem Fates (3DS) e, até então, eu preferia ficar longe de jogos do gênero. Não porque nunca tive interesse, mas porque sabia que minha falta de habilidade para com jogos de estratégia com certeza me desmotivaria, fazendo com que eu largasse o jogo por terminar.

Sendo ainda mais sincera, só me atrevi a jogar Fire Emblem Echoes: Shadows of Valentia (3DS) e Fire Emblem: Three Houses (Switch) no modo Classic porque são dois títulos que permitem voltar os turnos caso sejam cometidos erros. Mesmo assim, me senti bastante pressionada planejando cada movimento que devia ser feito em cada turno. Precisei, muitas vezes, dar pausas de horas antes de prosseguir na história.
Divine Pulse em Three Houses


Fire Emblem possui personagens carismáticos e o apego a eles faz com que perdê-los em combate seja doloroso demais. Ano passado, quando me atrevi a jogar pela primeira vez Fire Emblem: The Sacred Stones (GBA), perdi as contas de quantas vezes me revoltei tentando recrutar Joshua no capítulo 5. Mesmo bem no começo do jogo, já me sentia apegada a Ross, Lute, Colm e Neimi, e reiniciava o capítulo porque um deles morria ou pela perda de Natasha, única personagem capaz de habilitar o recrutamento de Joshua. Isso sem contar as vezes em que eu levava game over com a derrota de Eirika, uma das protagonistas de Sacred Stones.

Ao comparar Sacred Stones com Fates, senti falta do modo Casual. Não que o Classic do título de GBA fosse extremamente difícil, mas perder personagens aos quais me dediquei com tanto afinco fez com que eu me sentisse uma completa fracassada. No jogo de 3DS, por exemplo, por mais que a derrota de um personagem mais treinado fizesse diferença na hora de completar um mapa – e precisei refazer alguns até pegar a manha de Fire Emblem como um todo –, ele estaria disponível para a missão seguinte. Não me senti pressionada nesse quesito.

Mesmo em Shadows of Valentia e Three Houses, me esforcei para não precisar usar a mecânica de voltar os turnos. Reclamei bastante com meus amigos a respeito de como os mapas se tornavam desnecessariamente mais longos e complexos, e eu raramente conseguia jogar mais de dois consecutivamente. Cheguei até a ficar com dor de cabeça, porque sou do tipo de pessoa que “devora” os jogos assim que coloca as mãos neles.
Fala de Silque ao ser derrotada no Casual mode
Fala de Silque ao ser derrotada no Classic mode
Adorei a história de Sacred Stones, Shadows of Valentia e Three Houses. Fates pode até ter derrapado no roteiro, mas é um jogo especial para mim. No entanto, em termos de aproveitamento, consegui curtir mais a experiência ao jogar no modo Casual. Foi possível ter maior dedicação à história que ao pensamento tático e isso me rendeu menos dor de cabeça e mais entretenimento.

Não que eu não goste de desafios, tanto que já joguei dois títulos no Classic e estou me desafiando a jogar os mais antigos agora. Fire Emblem se tornou essencial na minha biblioteca e tenho mais de 1.200 horas registradas no 3DS, divididas entre todos os títulos disponíveis para o portátil – e ainda pretendo terminar Fates e Awakening no Classic.

Querer aproveitar a história e explorar o potencial narrativo dos personagens não anula o desafio da parte tática dos jogos da série. Pelo contrário: jogar no modo Casual só me fez ficar ainda mais interessada por Fire Emblem. Foi minha porta de entrada para a franquia e, se hoje consigo entender a mecânica dela, é porque tive a oportunidade de errar sem ser punida por isso. Quero conhecer mais sobre o universo e os personagens que tanto adoro e, de maneira geral, considero que o modo Casual foi importante para tomar a decisão de mergulhar verdadeiramente nesse universo.

Então, repito: não há problema algum em ser um jogador casual.

O importante, afinal, é se divertir
Arte por ぴりひば (Pirihiba)
 
Revisão: Davi Sousa
Arte de capa (Byleth e Sothis): astarsor
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Também conhecida como Lilac, é jornalista e atualmente trabalha com assessoria de imprensa. Fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por Heru.
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