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Análise: Roommates (Switch) mostra um cotidiano estereotípico de universitários estadounidenses

Apesar de divertido, o dating sim erra a mão em vários aspectos.


Roommates é um dos vários dating sims desenvolvidos pela Winter Wolves (Nicole). Lançado originalmente no PC em 2014, o jogo chegou agora ao Switch e conta a história de um grupo de personagens que vivem juntos na Latin House. Com um elenco diverso, o jogo busca oferecer uma experiência de ambiente universitário estadunidense. Apesar de suas boas doses de humor e de algumas discussões interessantes com os personagens, a obra é bastante estereotipada e acaba caindo em vários equívocos.


Um grupo de esquisitinhos


A primeira coisa a se fazer em Roommates é escolher o seu personagem: Max ou Anne. O rapaz é um roqueiro que pouco se interessa nos estudos de fato, tendo como principal objetivo alavancar a sua banda. Já Anne é a típica garota estudiosa, cuja timidez a deixa um tanto reservada na maior parte do tempo, mas que gostaria de ter novas experiências na faculdade.

Ambos são novos moradores da república Latin House e ainda no início do jogo já é possível perceber a bagunça que é o local. Além dos protagonistas, mais quatro personagens moram lá. Dominic é o responsável pela república, um rapaz que se preocupa tanto em seguir regras que acaba confrontando os outros moradores com frequência e tem um desgosto bastante pessoal por Max.

Isabella é uma das figuras mais marcantes do jogo, sendo uma mulher de origem latina e que vive causando arruaças e arrancando suspiros por onde passa. Rakesh é um artista de origem indiana que vive se deixando levar pela inspiração e fazendo coisas altamente questionáveis por conta disso. A mais calma do lugar é Sally, uma garota vegana que busca sempre manter um pouco de harmonia na casa, mas também tem uma personalidade bastante forte para suas crenças pessoais.

Esses personagens são o foco de uma história de slice of life muito bem humorada. Acompanhamos um pouco do dia a dia deles, que obviamente acabam se metendo em altas confusões. A república é um lugar bastante caótico e o contexto universitário com direito a festas e momentos de estudo podem oferecer discussões interessantes sobre personalidade, convivência com pessoas diferentes e as decisões que tomamos na vida.

Porém, ao mesmo tempo, o jogo cai em determinados estereótipos que podem ser vistos de forma bastante negativa. Por exemplo, Rakesh é um rapaz indiano que frequentemente vira motivo de piada por dizer frases aleatórias, enquanto Isabella é uma garota latina que está frequentemente flertando com todo mundo que vê.

Além disso, diálogos com conotação preconceituosa e sexista são comuns, especialmente jogando com Max. Há em alguns pontos uma discussão a respeito desses aspectos, sendo Isabella em especial uma personagem cheia de nuances. No entanto, em alguns casos não há o devido tratamento do problema, ocasionando em alguns momentos de hipocrisia gritante.

Vida escolar, relacionamentos e organização


Apesar de boa parte do jogo funcionar como visual novel, Roommates é de forma mais específica um jogo de simulação. Cabe ao jogador definir o cronograma do seu personagem, estruturando seu ritmo de estudos e atividades extras. Dependendo das suas escolhas de atividades e das respostas oferecidas em eventos de história, o jogador tem a oportunidade de desenvolver um romance com os outros personagens.

Max pode se relacionar com Anne, Isabella, Sally ou Rakesh, enquanto Anne pode ficar com Max, Dominic, Rakesh ou Isabella. Isso implica que ambos os personagens possuem opções homoafetivas, apesar de uma maior quantidade de romances hétero. Apesar de ser possível tentar abrir várias frentes no início, essa não é uma possibilidade viável.

Cada personagem tem atributos que valoriza mais entre seis categorias (organizado, reflexivo, criativo, espontâneo, ativo e racional). Para aumentá-los é necessário escolher atividades específicas. Por exemplo, trabalhar em um escritório aumenta seu nível de racionalidade enquanto ir a uma peça de teatro te tornará mais criativo. Com tempo limitado para realizar as ações, é importante ter um foco para alcançar um final bom com o personagem desejado.

No entanto, há alguns problemas nisso. Primeiramente, os eventos de história são frequentes e tomam o tempo do planejamento. Pior ainda, isso nem mesmo é indicado antes do jogador realizar a semana, o que significa que o planejamento do jogador será parcialmente descartado. Outra complicação é que as rotas para os finais bons não são tão simples e diretas, sendo indicado pelo próprio jogo que ele não te informará todas as chaves necessárias para os relacionamentos.
Nesta cena, é necessário favorecer Dominic para avançar na rota romântica de Rakesh.
Não basta fazer todas as escolhas que agradam o personagem que você gosta. Há algumas decisões cruciais para entrar no relacionamento desejado que podem ser contraintuitivas porque a opção indesejada fortalece o vínculo entre os personagens. É possível evitar as complicações usando bem os 24 saves disponíveis, mas esconder e mascarar as respostas necessárias é uma péssima escolha de design, incentivando o jogador a procurar um guia.

Ainda nessa questão da obtenção dos finais, vale destacar que o jogo conta com três níveis de dificuldade. A ideia é que eles mudem a velocidade de obtenção de atributos, fazendo com que o jogador possa ter mais ou menos maleabilidade no gerenciamento de seu calendário. Seria uma ótima ideia, mas na prática, isso não foi implementado no jogo. Testei tanto a versão fácil quanto difícil e não houve nenhuma diferença, sendo indicado claramente os mesmos valores para as atividades.

Além do erro de digitação, Dominic já tinha saído da cena.

Há ainda dois outros problemas que gostaria de ressaltar. Primeiramente é o fato de que é muito comum que textos e artes se contradigam. Tanto expressões corporais quanto roupas e até os fundos utilizados nos eventos podem ser completamente diferentes do que está sendo dito. O mais frequente é o texto falar que um personagem saiu e ele continuar na tela, mas há vários casos diferentes. O segundo problema são os erros de digitação, que são relativamente raros e não chegam a atrapalhar muito a leitura, mas podem ser incômodos.

Porém, também vale a pena destacar a trilha sonora de autoria de L33tStr33t Boys, cujas músicas são bastante vibrantes e se encaixam perfeitamente ao contexto universitário estadunidense. Algumas das trilhas seguem o estilo pop rock, o que se encaixa bem com a banda de Max e com os eventos da história. Em particular, Who You Live with Matters é muito boa para os momentos de tensão do grupo, enquanto My Name In Lights é um bom tema principal que gruda na cabeça e é marcante ver a banda tocar a música, mesmo sem uma CG especial para esse momento.


De forma geral, é difícil recomendar Roommates. Por um lado, a obra é bastante envolvente como um slice of life recheado de humor. Por outro, as escolhas de gameplay e o uso de estereótipos e preconceitos pode ser bastante desagradável. Mesmo tendo me divertido bastante com o jogo e achando ele um exemplar razoável do gênero, há exemplos melhores de visual novels e simuladores no Switch.

Prós

  • Boas doses de humor;
  • Trilha sonora vibrante que se encaixa muito bem ao contexto universitário estadunidense;
  • Possibilidade de escolha entre protagonista homem ou mulher com relacionamentos homoafetivos ou heteroafetivos;
  • Slice of life com discussões interessantes sobre personalidade e decisões de vida.

Contras

  • Eventos de história ignoram escolhas do jogador sem aviso prévio;
  • Finais bons podem exigir algumas escolhas contraintuitivas que o jogo não indica;
  • Personagens seguem estereótipos claros;
  • Diálogos preconceituosos são comuns;
  • Contradição ocasional entre descrição textual e as artes;
  • Alteração no nível de dificuldade não faz diferença;
  • Raros erros de digitação.
Roommates - Switch/PC/PS4/XBO - Nota: 6.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Diogo Mendes
Análise produzida com cópia digital cedida pela Ratalaika Games

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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