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Análise: Tinker Racers (Switch) é uma pequena diversão pelos cômodos da casa

Jogo brasileiro comete pequenos deslizes, mas cria um bom jogo de corrida.

Quando eu era pequeno, a Fórmula 1 era uma mania nacional. Ayrton Senna era um piloto admirado internacionalmente, que disputava campeonatos e inspirava adultos e crianças. Todo domingo em que havia um Grande Prêmio, eu pegava meus carrinhos e imaginava um circuito na sala de casa, brincando de ultrapassar os adversários e, claro, causando alguns acidentes.


Caso você que me acompanha neste texto seja de uma outra geração, ainda assim é provável que se lembre de quando sua casa era um mundo que podia servir de cenário para qualquer uma das suas brincadeiras. Seja com os antigos bonecos do Comandos em Ação ou com os Hot Wheels mais modernos.

O estúdio brasileiro Rumbora Party Games mergulhou nessa nostalgia da infância e desenvolveu Tinker Racers, que tem como cenário os cômodos de uma casa, como a sala, a cozinha e um escritório. O título transborda esse carinho em cada detalhe de sua execução.

Contudo, esse tom lúdico não deve ser confundido com infantilidade ou facilidade. Mais do que simplesmente cruzar a linha de chegada, o formato aqui é de um jogo de corrida de sobrevivência frenético, em que qualquer erro pode ser fatal.

Carinho nos detalhes


O Rumbora é um estúdio que até então tinha apenas alguns projetos, apresentando aqui seu primeiro lançamento internacional. A tela inicial conta com um singelo toque brasileiro, com uma Bic em cima de uma mesa. Mesmo que seja uma marca francesa, essas canetas estão tão incorporadas à nossa cultura que a nada discreta presença ali não deixa de ser uma piscadela aos brasileiros.

Tinker Racers apresenta uma visão aérea, o que favorece a ambientação. Usando o motor Unity3D, o estilo é simples, mas os cenários são bastante detalhados. Ventiladores, impressoras, tábua de carne e outros objetos comuns do cotidiano são reproduzidos com esmero, o que facilita a imersão.

Não se trata apenas de deixar o jogo agradável aos olhos, pois o ambiente é deliciosamente interativo. O ventilador ligado interfere na estabilidade dos carrinhos, a folha que sai da impressora encobre a visão, a pipoca que cai da panela vira obstáculo na pista que passa pelo fogão.

A parte do circuito é muito simples, traçado com linhas de giz, ketchup ou tinta guache e poucos dados na tela. Essa fluidez com que se pode sair do traçado permite que se encontre meios criativos para realizar ultrapassagens ou evitar um trecho congestionado.


Aliás, a IA é perfeitamente equilibrada, sem fazer os inimigos parecerem tolos ou avançados demais. Com uma curva de aprendizagem muito suave, Tinker Racers se mantém sempre agradável e desafiador.

Modos de jogo

No modo principal, o desafio consiste em liderar a volta e deixar os outros para trás a ponto de saírem da tela. Ao fazer isso, ganha-se um ponto. Quem atingir cinco pontos primeiro vence a corrida.

Mas isso não é tudo. A palavra tinker do título pode ser traduzida como funileiro, destacando assim o fato de que os carros podem sofrer danos. Essa característica adiciona um aspecto interessante ao gameplay, aumentando a dificuldade em estágios mais avançados.

Na parte inferior da tela, há um contador com o percentual de integridade dos veículos. Todos começam com 100% e esse número vai diminuindo à medida que colidem com rivais, obstáculos ou outras armadilhas do cenário.

Obviamente, Tinker Racers não segue pelo caminho realista, o que significa que o desempenho não é afetado pelos danos. Porém, a partir dos 50% o carrinho apresenta um efeito visual de curto-circuito. E zerar o contador equivale a perder automaticamente a corrida.

Essa proposta certamente mantém os jogadores em alerta, pois os erros serão fatais para a vitória. Nesse sentido, o game não é injusto. O sucesso depende da sua habilidade, o que é garantido pelo esquema de controles simples, polido e bem executado, que responde com perfeição.

Passar pelo modo campanha é praticamente obrigatório, pois é a única forma de desbloquear os circuitos para jogar nas outras modalidades. São alternativas comuns ao gênero, incluindo treino livre pelo percurso, corrida contra o relógio, cooperativo local para até quatro jogadores e um modo mais tradicional para completar as voltas sem o percentual de integridade do veículo.


Um extra interessante é o modo escuro que pode ser desbloqueado, que se mostra um bom jeito de dar nova vida aos percursos. Revisitá-los com os faróis ligados e baixa visibilidade proporciona uma experiência diferente, ainda que seja um pouco rasa.

Pequenas derrapagens

O grande ponto negativo de Tinker Racers é a variedade limitada de cenários e circuitos. Embora existam várias pistas, passar no mínimo seis vezes pela mesa de jantar ou em frente ao monitor do escritório gera a sensação de potencial perdido. Fica uma vontade de explorar novos cantos da casa, o que contribuiria para aumentar a curta duração do jogo.

Quem sabe em uma sequência possamos ver um percurso passando pela pia do banheiro, pela janela do quarto ou por obstáculos no jardim. Pessoalmente, porém, senti falta do apelo à nostalgia que o título me causou se completar com uma passada pelo tapete da sala. Seria um toque simples, mas carinhoso.

Há também pequenas quedas de frame rate quando a câmera se afasta ao máximo para mostrar muitos carrinhos em pontos diferentes do cenário. Não é nada gritante ou que prejudique muito a jogabilidade, mas é digno de nota.

Tinker Racers é fruto do excelente trabalho de três pessoas. Com uma proposta simples, direta e cheia de nostalgia infantil, os brasileiros do estúdio Rumbora entretêm e mantêm o desafio oferecendo ótimos controles.


Os cenários criativos e bem construídos divertem nas primeiras incursões, mas o sorriso deixa o rosto devido à repetição. Ainda assim, o jogo nunca se torna enjoativo, deixando o anseio por uma sequência mais completa.

Prós

  • Controles respondem com eficiência;
  • Cenários envolventes e interativos;
  • Dificuldade bem equilibrada.

Contras

  • Curta duração;
  • Variedade limitada de cenários;
  • Pequenas e pontuais quedas de frame rate.
Tinker Racers — PC/Switch/PS4/XOne — Nota: 8.0

Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Diogo Mendes

Análise produzida com cópia digital cedida pela QUByte Interactive

Nascido no mesmo dia que Manoel Bandeira (mas com alguns anos de distância), perdido em Angra dos Reis (dos pobres e dos bobos da corte também), sob a influência da MPB, do rock e de coisas esquisitas como a Björk. Professor de história, acostumado a estar à margem de tudo e de todos por ser fora de moda. Gamer velho de guerra, comecei no Atari e até hoje não largo os mascotes - antes rivais - Mario e Sonic.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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