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NEO: The World Ends with You (Switch) parece um ótimo action-JRPG, mas sem muitas inovações

Sua demo garante que é um JRPG que faz jus a uma IP cheia de personalidade e estilo, mas deixa dúvidas quanto à originalidade de trama e combate.




NEO: The World Ends with You (Switch) é um action-JRPG, previsto para ser lançado dia 27 de julho de 2021 para PS4 e Switch, com publicação pela Square Enix e desenvolvimento também dela, mas em parceria com a h.a.n.d. (Hokkaido Artists' Network and Development), uma empresa que já trabalhou com a Square Enix no passado em jogos para portáteis, como Kingdom Hearts: 358/2 Days (DS), em 2009, e como a versão Remix de The World Ends with You, lançada em 2018 para Switch e mobile.


Contando com Tetsuya Nomura entre seus produtores e designers, NEO: The World Ends with You chega com a difícil tarefa de suceder o clássico The World Ends with You (doravante apenas “TWEWY”) — também produzido e desenhado por Nomura — que foi originalmente desenvolvido para Nintendo DS em parceria com a Jupiter (estúdio conhecido por seus trabalhos na série Picross).

Em 2007, TWEWY foi um dos vários bem-sucedidos lançamentos da Square para o portátil de sétima geração Nintendo. O jogo era cheio de personalidade. Assim como a série Shin Megami Tensei, possuía uma ambientação inspirada em parte do Japão, mas mais especificamente focava-se na “cultura de rua” do distrito de Shibuya, em Tokyo,  tinha uma narrativa com estilo de mangás e enredo, trama e elenco de personagens de grande originalidade e engenhosidade. Além disso, o jogo trazia mecânicas únicas de action-RPG que aproveitavam a característica caneca (Stylus) do DS não só para a interface do jogo e a movimentação do personagem mas também, e principalmente, para a execução de golpes, combos e habilidades utilizando-se de diferentes movimentos traçados na tela inferior do DS.

Na sequência, e como já é possível perceber por sua demo, NEO: The World Ends with You conserva aquele estilo visual arruaceiro do clássico do DS. Isso tanto nos cenários — inclusive passando-se em alguns locais iguais (mas adaptados para uma perspectiva 3D) — quanto no estilo dos personagens, trilha sonora, premissa de enredo e estrutura narrativa à moda dos mangás. Contudo, as mecânicas de combate agora são de Hack ’n’ slash e, apesar de algumas particularidades e maiores limitações, guardam mais semelhança com a ação de jogos como Kingdom Hearts do que com a de seu mencionado antecessor de DS.

Nesta matéria você poderá conferir algumas coisas do que já podemos concluir pela demo atualmente disponível para Nintendo Switch. O título, porém, que chegará em breve (27 de julho) conta com algumas das mentes mais brilhantes da Square Enix e também muitos dos membros da equipe original de TWEWY e não deve ser subestimado em sua capacidade de surpreender-nos para além do que já se encontra na demo.

Apenas para lembrar dos seus diretores, temos Hiroyuki Ito e Tatsuya Kando. O primeiro, Ito, é um dos mais importantes nomes da Square Enix, dirigiu Final Fantasy VI, IX e XII — considerados por muitos alguns dos melhores da série (e os favoritos desse que vos fala) —, além de ter sido o criador do ATB (Active Time Battle), sistema de batalha utilizado na série Final Fantasy do IV até o IX, além de adaptado em outros RPGs fora dessa série. O segundo, Kando, foi um dos diretores de TWEWY e também é conhecido por dirigir ou supervisionar as animações da série Kingdom Hearts desde sua origem no PS2.

Veja nos próximos tópicos o que esses e outros nomes por trás dessa aguardada sequência de The World Ends with You (DS) estão trazendo para o híbrido da Nintendo.



Os dois primeiros dias na nova Shibuya

Na demo ora disponibilizada de NEO: The World Ends with You, o jogador controlará Rindo, que conta ainda com a ajuda de um pequeno grupo de amigos — principalmente Fret e Minamoto — em um “jogo do ceifador” (Reaper’s Game); uma espécie de jogo de sobrevivência.

A competição se passa em uma dimensão paralela e invisível ao mundo real chamada “Underground” que, porém, pode intervir na realidade das pessoas. Essa dimensão é habitada por “ruídos” (criaturas de nome Noise),  nome  coerente com o design do protagonista anterior da série, Neku, que está sempre ouvindo música (as mesmas que o jogador pode ouvir) em seu MP3 com headset. Tal competição, porém, não é apenas contra essas criaturas, mas também, indiretamente, com outros jogadores, em pares, que tentarão chegar ao final do jogo (teoricamente após sete dias) e, ao vencerem, voltarão à vida no mundo real.

No decorrer da Demo, Rindo e seus amigos serão introduzidos a esse jogo, suas mecânicas, seus inimigos e receberão um tutorial sobre como utilizar habilidades especiais nessa dimensão, como a de ler pensamentos dos humanos. A demo se passa nos dois primeiros dias do jogo, onde haverá algumas missões envolvendo combates e também exploração na cidade, para que se possa conhecer alguns de seus locais (poder comer em lanchonetes etc.) e inclusive experimentar a aplicação da mecânica de ler mentes e até manipular pensamentos de humanos etc.

Novos e antigos personagens para mais páginas de mangá

O clássico de DS tinha, como de costume nos trabalhos de Nomura, personagens jovens em estilo de anime com características próprias bem marcantes (especialmente o protagonista). De forma coerente com o tema do projeto, essas características tinham a ver com elementos da cultura de rua de Shibuya, como, entre outras coisas, skate, celular flip, MP3, headset, corrente, moletom estilo canguru, capuz, gorro grande, cabelo tingido, e o principal, pins (broches personalizados em forma de botão).

Os pins possuíam e ainda possuem funções mecânicas importantes na série: a cada um deles é atribuído um tipo de habilidade que só pode ser utilizada enquanto o personagem o traz consigo. Desse modo, enquanto um personagem porta um pin e utiliza sua habilidade em combate, o item pode evoluir, tornando sua habilidade mais poderosa e, eventualmente, até levando o pin a se transformar em um outro, trazendo-lhe uma habilidade semelhante, mas superior à anterior.




Pois bem... além dos pins, também vários daqueles elementos da Shibuya do primeiro TWEWY estão, com suas devidas adaptações, presentes nos personagens de NEO: The World Ends with You. Não só porque vários personagens estão de volta (como Koki Kariya, Uzuki Yashiro e vários outros, incluso o clássico protagonista, Neku, ou Phones, como é apelidado), mas também pelos novos personagens, como as principais estrelas da demo, Fret, Nagi, Sho Minamoto (já presente no primeiro TWEWY) e um aparente novo protagonista da série, Rindo.

Tanto esses quanto aqueles utilizam roupas e acessórios condizentes com o conceito da série, com algumas atualizações para a atual época de Shibuya. A mais notável é a mudança no tipo dos celulares, algo muito presente nas animações, mecânicas e menus da série. Agora o modelo dos celulares não é mais flip, mas sim smartphones convencionais; uma mudança já feita na adaptação para anime do clássico The World Ends with You. Outro acréscimo interessante de acessório é uma máscara usada (total ou parcialmente) pelo protagonista Rindo, lembrando o período de pandemia de COVID-19 durante o qual ocorreu grande parte do desenvolvimento do jogo.



A interação entre esses personagens, como no título anterior, dá-se por encontros com NPCs estáticos nas ruas do distrito de Tokyo cujas interações são representadas em quadros de mangá parcialmente animados acompanhados com balões de diálogo e dublagem (ao menos nos principais momentos de conversação).

A linguagem do texto (em japonês ou em inglês),  assim como já ocorria no título anterior, emprega gírias, vocábulos e expressões do cotidiano urbano juvenil e descontraído da cultura popular. Naturalmente tal linguajar na região de Shibuya, bem como em parte da cultura popular norte-americana (de onde se baseia a localização em inglês), sofreu modificações desde mais de uma década do lançamento do título de DS. Por essa razão, novas contrações, convenções, gírias e vocábulos (como “i was hopin u could give [...]”, “that was a total breeze!”, termos como ‘cringey’ etc.), e até emojis de celular (alguns aludindo a personagens de Final Fantasy) fazem parte do roteiro de NEO: The World Ends with You.



Rap, hip-hop, hardrock e metal, Hack’n’slash e novidades de level design

Em consonância com as ruas largas e movimentadas abraçadas por prédios altos e esguios e cortadas por sinuosos becos repletos de grafites nas paredes, há uma trilha sonora sempre presente, com predominância dos gêneros pop, hip-hop e rap, em peças como “Wander Around Shibuya”, mas várias também misturadas com traços de metal (portanto, Nu metal), como “Storm” e “Set Me Free”, e outras ainda de puro hard rock, como “Your Ocean” e “Senseless struggle”. Vale lembrar que algumas das faixas da OST já estavam presentes no título anterior da série, como “Someday”, mas com algumas poucas modificações.

A escolha por traços mais pesados de rock parecem ainda combinar com o estilo dos personagens e das ruas de Shibuya ao mesmo tempo em que dão uma diferenciada neste título em relação ao seu antecessor de DS. Essa ênfase maior em rock, alternada, por vezes, com um ritmo rápido e sincopado de rap, e quase sempre em andamento rápido e com sons graves de guitarra, combina especialmente bem para os combates. Isso agora mais do que nunca na franquia, já que o gameplay em batalhas está muito mais dinâmico e frenético.


Enquanto anda pelos diferentes cenários de Shibuya, o jogador pode alternar entre a visão do mundo real e uma visão “para-dimensional”, por assim dizer, que permite observar inimigos e interagir com pensamentos dos humanos. No caso em que Rindo passe por perto dos inimigos, será perseguido por eles e em pouco tempo entrará em combate automaticamente, mas, antes disso, há algum tempo para, se assim quiser, acumular mais inimigos para enfrentar em sequência.

As batalhas ocorrem em um cenário paralelo, após um loading que pode variar de algo entre 5 a 10 seg., sendo 5 ou até menos no caso de o jogador migrar de uma batalha para outra em seguida, em vez do cenário de passeio para o de batalha.

Só mais um jogo de sete dias?

NEO: The World Ends with You, pelo que já é possível avaliar, é um título promissor em muitos aspectos. Primeiramente, o design dos novos personagens e suas personalidades fazem jus ao estilo de arte e produção de Nomura na Square Enix e estão dentro do esperado para os fãs de seus trabalhos. Além disso, a execução do conceito da franquia nos cenários, nas mecânicas, na linguagem e na trilha sonora, ainda que com modificações, preserva as qualidades que tornaram o título de DS único, e Tatsuya Kando (que fora diretor daquele projeto e desse) deve ter tido um grande papel nisso.

Muitas novidades também foram bem-vindas, como o aprimoramento gráfico, a movimentação em 3D pelos becos das ruas e o trabalho sobre o roteiro, tanto escrito quanto dublado (com ótima atuação em inglês e japonês, diga-se de passagem). Por outro lado, as principais dúvidas quanto à qualidade desse próximo action-RPG para Switch pairam sobre a narrativa, as mecânicas de Hack ’n’ slash e, em menor grau, sua performance no console, já que o tempo de loading é um tanto alto às vezes e há ocasionais quedas de quadro em algumas batalhas.

Do ponto de vista da dinâmica de combate, agora o jogador pode fazer ações ofensivas e se movimentar em controles tradicionais, além de também alternar entre personagens da party com facilidade, cada qual utilizando um pin específico (previamente equipado), inclusive podendo fazer combos com eles. Mas tais mecânicas podem não satisfazer àqueles que esperavam algo original ao nível que o antecessor oferecia com as duas telas do DS e a Stylus.

Mesmo considerando controles tradicionais, é natural que os fãs esperassem algo mais único para esse jogo, sobretudo se lembrarmos que Hiroyuki Ito criou sistemas únicos de RPG como o já mencionado ATB para Final Fantasy IV — que proporciona tempo de espera distinto para diferentes personagens (de diferentes classes) da party em batalha por turno —  e o próprio ADB (Active Dimension Battle) para Final Fantasy XII, que proporciona algo intermediário entre RPG tradicional e action-RPG. Claro, apesar disso, as mecânicas do novo TWEWY são fluidas e bem funcionais, e devem garantir a diversão da grande maioria dos jogadores.

Quanto ao ponto da narrativa, a dúvida que resta também é semelhante. A premissa de NEO: The World Ends with You é a mesma: o velho jogo de sete dias com rotinas diárias de missões que intercalam exploração, interações de pensamento ou de diálogo e combate. Como se desenrolará a trama desse jogo? Ela terá reviravoltas e revelações como no anterior? E ainda que tenha... serão tão impactantes mesmo o jogador já sabendo sobre como funciona esse universo? E que novidades os novos e os antigos personagens trarão para enriquecer o enredo? Dúvidas que só poderão ser sanadas com o lançamento do título, mas que deixam uma “pulga atrás da orelha”.
 
Revisão: Icaro Sousa

Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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