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Análise: Cult of the Lamb (Switch) traz de tudo um pouco, mas não se especializa em nada

O misto de simulador e roguelite garante horas de jogatina, embora apresente sérios problemas de performance no Switch.


Simuladores não são novidade no mundo dos jogos, assim como roguelites e roguelikes. Exemplos são muitos, como as franquias Animal Crossing e até mesmo The Binding of Isaac. Cult of the Lamb traz alguns dos conceitos mais marcantes de simuladores e roguelites em uma proposta um tanto quanto inusitada, mas, infelizmente, não se aprofunda tanto neles e apresenta problemas de performance no Switch.

O silêncio dos inocentes — ou não

Em Cult of the Lamb, controlamos o último cordeiro existente no mundo. Prestes a ser sacrificado em um ritual, o jovem bichinho é salvo por um ser que se apresenta como The One Who Waits (Aquele que Espera). Contudo, isso não foi um mero ato de bondade: o pobre cordeirinho se torna a chave para que essa entidade possa ressurgir.

Para isso, o protagonista precisa não apenas conquistar fiéis para um terrível culto, mas também destruir os Old Ones, tidos como hereges, para que The One Who Waits possa, mais uma vez, andar entre os mortais. Desse modo, o carneirinho, que agora prega a palavra de seu patrono, Eldritch Abomination, parte em uma perigosa missão envolvendo fé, poderes sobrenaturais e ritos satânicos.

Isaac em Animal Crossing?

Como comentado no começo desta análise, Cult of the Lamb lembra bastante uma mescla de Animal Crossing com The Binding of Isaac, com os aspectos administrativos do simulador da Nintendo misturado com os elementos roguelite do clássico indie. Ao longo da campanha, precisamos visitar — e revisitar — as dungeons em busca de fiéis, materiais para construção, comida… e a lista segue.

O início do jogo, a bem da verdade, é arrastado, já que as mecânicas são introduzidas aos poucos conforme realizamos as tarefas. Contudo, quando finalmente atraímos fiéis para o culto e podemos “tocar o barco”, as coisas começam a ficar mais interessantes e a jornada do pobre cordeirinho para libertar The One Who Waits passa a fazer sentido.

Porém, isso não quer dizer que cuidar do rebanho seja uma tarefa fácil. Além da exploração de dungeons, precisamos administrar as atividades dos fiéis em nossa grande comunidade. É necessário que tenhamos comida sempre à disposição e que estejamos prontos para limpar as caquinhas (para não dizer outra palavra) deixadas pelos cultistas.

Como bons seres vivos, eles passam mal, ficam doentes, envelhecem e morrem. Cult of the Lamb gira em torno de um interminável ciclo de dia e noite ao qual precisamos nos atentar a cada cinco segundos. Se por um lado o jogo nos informa do que acontece em nosso sítio enquanto estamos derrotando inimigos e coletando recursos, por outro, nem sempre temos tempo hábil para evitar que o pior aconteça.


As ações executadas em combate e administração também são avaliadas pelos nossos adeptos. Se, de repente, um ou mais começarem a duvidar da palavra do cordeirinho, é capaz de o rebanho se perder para as mentiras dos infiéis. Até conseguirmos pegar o jeito da coisa, muito suor, lágrimas e sangue serão derramados.

Talvez a parte mais simples seja a exploração de dungeons. No melhor estilo dungeon crawler, temos áreas geradas aleatoriamente com os mais diversos tipos de inimigos para derrotar e seções para explorar. Começamos com uma arma aleatória e uma espécie de magia, que podem ser melhoradas quando tiramos a sorte nas cartas de tarô ou até mesmo antes de enfrentar um chefe.

Cada vez que concluímos uma seção, que nada mais é do que um conjunto de salas, somos apresentados a um grande fluxograma no qual podemos escolher qual caminho seguir. Às vezes, a próxima área pode nos garantir fiéis — normalmente envolvendo combate para libertá-los do sacrifício — ou até mesmo a coleta de recursos para melhorarmos nosso culto.

Ao fim de cada sequência de seções, somos colocados para enfrentar um minichefe. Repetir a dungeon algumas vezes nos permite lutar contra um dos Old Ones e libertar uma das amarras que aprisionam The One Who Waits. Quando finalmente completamos uma dungeon, ela se torna uma “terra de ninguém” e versões mais poderosas dos inimigos podem aparecer em cada seção.

Por ser uma espécie de roguelite, nossas conquistas não são perdidas em caso de derrota, embora possamos perder alguns dos itens que coletamos durante a jornada. É aqui que mora o perigo: expedições bem-sucedidas fazem com que os adeptos nos vejam com bons olhos, enquanto falhas podem custar a fé que eles depositam em nós.

Enquanto a parte da ação seja um tanto quanto fácil de entender e dominar, o mesmo não pode ser dito da administração do culto. Todas as melhorias são obtidas por meio da fé e da devoção dos fiéis, implicando em saber designá-los para as tarefas certas e manter a pregação em dia.

Com a devoção, que é obtida por meio das rezas, podemos habilitar novas estruturas para o acampamento, enquanto a fé faz com que nossos fiéis subam de nível;, dessa forma, ganhamos acesso a novas doutrinas e capacidades combativas. Outro ponto interessante disso tudo é o fato de que os adeptos contam com características, que vão de ceticismo à probabilidade de adoecer.

Saber racionar os recursos também é uma faca de dois gumes, já que as melhorias requerem bastante investimento. Às vezes, gastar dinheiro para garantir mais terras para plantio pode nos comprometer a longo prazo, já que o ouro pode ser refinado em barras, que servem como combustível para megafones, estruturas capazes de acelerar a produção dos fiéis dentro de seu alcance.

Desse modo, temos uma jornada baseada em muitas tentativas e erros, algo que infelizmente deixa o jogo repetitivo a longo prazo, sobretudo a parte de dungeon crawler. Claro, a não ser que você seja como eu e goste de grinding, não se importando com as inúmeras tarefas repetitivas.


Aquele quê de Happy Tree Friends

Se você não entendeu a referência, eu explico: por trás da fofura, existem elementos brutalmente grotescos; porém, se você preza pela sua sanidade, não procure por Happy Tree Friends no Google e se contente com minha explicação bem resumida.

Se mesmo assim você não captou a ideia, basta saber que Cult of the Lamb tem um visual fofinho e cartunesco que disfarça — e muito — todos os ensinamentos do anticristo. Ou seja, o jogo é para quem tem estômago para sacrificar um fiel como se fosse a coisa mais normal do mundo.

Claro que não dá para resumir um jogo apenas por sua qualidade audiovisual, então outro grande ponto positivo é a diversidade que a aventura satânica proporciona. Podemos customizar nossos adeptos, com direito a troca de nomes e aparências, e também escolher que rumo seguir com as doutrinas. Para minha surpresa, existem algumas opções mais “pacifistas”, como respeito aos idosos — só não sei se fico feliz com isso.


Contudo, além da já citada repetição, a performance de Cult of the Lamb no Switch deixa a desejar, tanto no modo TV quanto no portátil. Em vários momentos a jogatina é afetada por engasgos e quedas na taxa de quadros, e, se você tiver azar suficiente, travamentos que nos obrigam a reiniciar o jogo. Essas falhas técnicas comprometem a diversão como um todo e houve momentos em que precisei deixar o Switch de lado porque a performance conseguiu consumir mais a minha paciência que o grinding em si.

Outro aspecto que vale a pena mencionar, mas que eu não considero tão prejudicial à jogatina, é a falta do português brasileiro, até a data de publicação desta análise, entre os idiomas disponíveis, algo que existe na versão para PC. Por fim, quero deixar avisado que, por mais que interessantes que pareçam, as ideias de diferentes gêneros são pouco desenvolvidas, fazendo com que jogadores mais exigentes não se sintam tão atraídos.

Você tem um minuto para ouvir a palavra do cordeirinho, nosso doutrinador?

Cult of the Lamb pega elementos de franquias bem conceituadas no mercado, como The Binding of Isaac e Animal Crossing, e as aplica em um jogo que nos remete ao humor duvidoso de Happy Tree Friends. Além de oferecer horas de conteúdo, mesmo que baseadas em grinding, e diversas opções de customização tanto de fiéis quanto de doutrinas e outras melhorias, o título traz uma apresentação audiovisual impecável e que consegue nos seduzir a fazer parte desse culto satânico estranhamente fofo.

Por outro lado, a performance no Switch prejudica a jogatina, que, por si só, pode se tornar repetitiva com o tempo. Sendo assim, enquanto essas falhas pontuais não forem corrigidas, fica difícil a recomendação no console híbrido da Nintendo.

Prós

  • Boa combinação entre dungeon crawler, roguelite e simulador;
  • Ótima apresentação audiovisual;
  • Muitas opções de customização em diversos aspectos;
  • Horas de jogatina garantidas;
  • Equilíbrio justo entre os elementos de jogo.

Contras

  • Repetitivo com o tempo, sobretudo devido ao grinding;
  • Boas ideias combinadas, mas pouco exploradas;
  • Sérios problemas de performance que afetam a jogatina no Switch;
  • Sem opção do português brasileiro na lista de idiomas do jogo no Switch.
Cult of the Lamb — PS5/PS4/XBX/XBO/PC/Switch — Nota: 7.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Devolver Digital

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por 0range0ceans
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