Entrevistamos ebi-hime, criadora independente de visual novels

Conheça mais sobre a criadora que se destacou no cenário das visual novels indie.

em 10/10/2022


É difícil não ver visual novels pipocando no Switch e no Steam. Com o gênero ganhando o Ocidente cada vez mais, é ainda mais comum esbarrarmos com pequenas desenvolvedoras — e até mesmo criadores independentes — apostando nesse segmento.


Neste cenário, temos ebi-hime, que se destacou na internet com suas visual novels multitemáticas e que tivemos a chance de conhecer melhor nesta entrevista exclusiva.

Nintendo Blast: Obrigada por aceitar este convite! Para começar, pode nos contar mais sobre você?

ebi-hime: Olá e muito obrigada por me convidar para esta entrevista! Sinto-me lisonjeada!

Meu nome é ebi e eu vivo no Reino Unido. Sou uma produtora independente de visual novels e uma escritora que publicou alguns projetos ao longo dos anos. Talvez eu seja mais conhecida por minhas histórias de romance lésbico, mas gosto de escrever vários gêneros, incluindo ficção histórica, terror psicológico e comédia!

NB: De onde veio a ideia de criar visual novels? Você sempre sonhou em ser uma escritora ou isso é mais um hobby seu? Além disso, você tem alguma obra favorita dentre as quais você já publicou?

ebi: Eu sempre tive vontade de ser escritora desde que eu era criança. Sempre fui fã da série de livros Goosebumps, de R. L. Stine, (acho que tive todos os livros publicados) e eu costumava escrever minhas próprias histórias de terror, vagamente inspiradas em Goosebumps, em cadernos que meus pais compravam para mim. Ainda tenho essas histórias antigas que escrevi; aliás, acho que quando eu tinha uns sete anos, acho que escrevi minha primeira “história completa” (acompanhada de minhas próprias ilustrações) e me lembro de me sentir orgulhosa de mim e do meu feito. (risos)

Eu também costumava escrever várias fanfics quando eu era mais nova. Descobri o site Fanfiction.net quando eu tinha por volta dos 11 anos e eu escrevi e publiquei [no site] histórias para vários fandoms até meus 18 anos. Tenho certeza de que escrevi cerca de 3 milhões de palavras [em fanfics] durante esses anos, ou algo próximo disso.


Sempre gostei de escrever (e gosto de ler também), mas a primeira vez que a ideia de escrever visual novels me veio à cabeça foi quando conheci a série Umineko, de Ryukishi07, quando eu estava no último ano do Ensino Médio. Foi a primeira vez que li uma VN, e a combinação de arte (mesmo que as de Ryukishi07 não sejam as melhores), música e efeitos sonoros junto do texto foi muito emocionante [para mim]. 

Fiquei tão absorta em Umineko, que lembro que li episódios inteiros em coisa de dois ou três dias, o que é impressionante, já que a série é bem densa. Umineko realmente abriu meus olhos para o potencial de usar VNs como um meio [de mensagem] e sou apaixonada pelo gênero desde então!

Enquanto Umineko continua sendo minha VN preferida de todos os tempos, a minha favorita das que escrevi com certeza é All Ashes and Illusions. Acho o protagonista, Yuel, um personagem muito interessante, dado que ele é cheio de falhas e mentalmente instável, e não dói dizer que ele é agradável aos olhos. (risos)


NB: Em 2020, tive a oportunidade de analisar The Language of Love e, no início deste ano, Blackberry Honey, ambas no Switch (cortesia da Ratalaika Games), então fiquei bem animada quando vi Salome’s Kiss no Steam — e escrevi uma análise do jogo por conta própria. Percebi que as três visual novels são semelhantes em gênero, então quero perguntar: quais são seus gêneros favoritos e por quê?

ebi: Não acho que The Language of Love e Salome’s Kiss sejam tão semelhantes assim, exceto por serem visual novels. The Language of Love é uma história inspirada em animes e que se passa no Japão e fala de um romance fofinho entre um jovem universitário e uma mãe solo. Na maior parte do tempo, é leve e engraçada e não transmite tanta seriedade.

Blackberry Honey, enquanto isso, é uma trama histórica com empregadas lésbicas, com um pouco de melodrama, mas tem um final feliz. Salome’s Kiss, por outro lado, é apenas… pornô miserável, eu acho? É uma história bem depressiva; inclusive, recebi um e-mail de um “fã”, logo após o lançamento da VN, questionando minhas questões morais, porque não dava para acreditar que eu me atrevi a escrever uma história tão perturbadora. (risos nervosos)

Acho que, como pode ser visto nessas três histórias, eu gosto bastante de brincar com cenários e gêneros. Tenho um fraco por ficção histórica, mas o que eu mais gosto de escrever são histórias trágicas, com personagens principais falhos, e que exploram as psicologias desses personagens.

Minhas histórias fofinhas e leves tendem a ser mais bem-recebidas (tanto The Language of Love quanto Blackberry Honey fizeram bastante sucesso dentro do padrão de VNs indies), mas não consigo evitar escrever sobre personagens que sofrem e outros que gostam de fazer pessoas sofrerem de volta. É muito divertido!


NB: Algo que também percebi nas visual novels mencionadas anteriormente é a pesquisa cuidadosa e precisa sobre os lugares descritos nas histórias, seus costumes (especialmente aqueles a respeito da Inglaterra Vitoriana do século 19) e mais. Você pode nos contar sobre seu processo criativo? Você adiciona suas próprias experiências nas histórias que escreve?

ebi: Não sei se tenho um “processo criativo” propriamente dito. Geralmente tenho ideias para minhas histórias de maneira bem aleatória: lendo livros ou até mesmo outras VNs, ouvindo música, vendo filmes e séries de TV, pesquisando coisas na internet, conversando com amigos etc., etc.
Tenho várias ideias praticamente todo dia, que eu sintetizo e misturo até chegar a uma ideia que me agrade o suficiente para colocar no papel (ou em um editor de textos). Eu mantive um documento no meu notebook nos últimos 5 anos, no qual anoto todas as minhas ideias — e tenho muito material nessa lista que ainda não usei. Não sei se conseguirei usar todas elas, mas vou tentar!

Sim, costumo adicionar minhas próprias experiências em algumas das minhas histórias (uma das minhas VNs mais antigas, Lily of the Valley, por exemplo, é bem pessoal), mas não em todas elas. Nunca fui uma empregada na Inglaterra Vitoriana, infelizmente, mas uma pessoa pode sonhar, não pode?


NB: Enquanto eu jogava Salome’s Kiss, percebi que a narrativa é mais madura — e sombria, claro. Você pretende escrever mais visual novels como essa?

ebi: Eu gosto de escrever histórias sombrias, então provavelmente trabalharei em mais conteúdo como Salome’s Kiss em algum momento no futuro. Acho que um dos meus lançamentos iniciais, Sweetest Monster, é mais sombrio que Salome [em termos de conteúdo], mas Ashes pode ser o grande vitorioso, apesar de eu não estar totalmente certa.

Tentei ser bem minuciosa enquanto eu revisava Ashes, mas tinha algumas cenas que achei tão desagradáveis, que eu não quis relê-las. Acho que isso quer dizer que elas foram bem escritas? Não sei, tenho que ver o que outras pessoas pensam!

NB: Você ganhou certa notoriedade na internet graças às suas visual novels GL (girls love), mas agora você está trabalhando em All Idleness and Ephemera, um projeto BL (boys love). Pode nos contar mais sobre o jogo que está por vir? O que podemos esperar dele?

ebi: Ephemera é um spin-off de Ashes protagonizado por Yuel, o protagonista de Ashes, e Tavi, o primo mais velho de Yuel e o único personagem cômico em um universo sombrio e depressivo, em um processo de “conhecer melhor um ao outro”, diferentemente do que eles fizeram em Ashes. (risos)

Eu escrevi Ephemera mais porque achei tão pesado escrever Ashes, como disse anteriormente, que quis explorar os mesmos personagens em um cenário um pouco mais alegre. A VN não tem tanto enredo na maior parte do tempo: é, em grande parte, uma história composta por cenas de sexo fofas e consensuais.

Acho que é bem doce (foi um bom enxaguante bucal depois de trabalhar em Ashes), porém pessoas que preferem alguma coisa mais estruturada ou séria podem não se importar [em conferir o jogo]. Além disso, os dois personagens envolvidos são primos de primeiro grau, o que pode afastar algumas pessoas — mas ambos são da realeza, então isso é bem normal, certo…? (risos nervosos) 

NB: A maioria das suas visual novels têm um patch adulto disponível para download gratuitamente, e claro que as cenas 18+ são apenas um complemento para a história principal, mas, infelizmente, parece que a Nintendo não aprova nenhum tipo de erotismo em jogos para Switch — embora haja vários jogos focados em fanservice disponíveis na eShop. Qual é a sua opinião sobre o assunto?

ebi: Honestamente, não me preocupo tanto com isso. Tento escrever minhas cenas de sexo de um modo que elas complementem a história, seja dando mais informações sobre os personagens envolvidos ou mostrando como suas relações se desenvolveram, mas elas [as cenas de sexo] tendem a ser uma porção bem pequena do texto nas minhas histórias.

The Language of Love, por exemplo, é um romance, mas tem apenas uma passagem sexual de aproximadamente 3.000 palavras. Não acho que cortar a história com uma tela preta destrua a narrativa. É um bônus legal ter pessoas que querem ver o desfecho do relacionamento entre Mitsuki e Kyouko, mas não é essencial.

Acho que as cenas de sexo em Salome e Ashes, contudo, são mais importantes para o enredo, então deixá-las de fora pode ser bem desafiador. Acho que ambas as histórias são mais impactantes com o conteúdo 18+, então é uma pena que essas VNs tenham que ser cortadas se eu quiser lançá-las nos consoles. Fazer o quê.


NB: Ainda sobre o Switch, podemos esperar que All Ashes and Illusions e Salome’s Kiss cheguem à eShop em breve?

ebi: Salome’s Kiss é um possível candidato para um port para os consoles, desde que eu consiga remover seu conteúdo sexual explícito. Eu prefiro fazer isso, porque acho que as cenas de sexo complementam a história, mas a narrativa pode funcionar sem elas também: você só precisa imaginar o que acontece durante a tela preta.

A respeito de Ashes, porém, acho que nunca receberá port. Mesmo que você remova todo o conteúdo sexual explícito da história, os personagens falam muito sobre sexo. Sexo é literalmente uma das maiores motivações de Yuel — sua relação doentia com sexo é uma grande parte de sua personalidade —, então fazer uma versão completamente “limpa” da história seria bem desafiador.

NB: Algo que muitos dos seus fãs brasileiros parecem sentir falta nos seus trabalhos é uma tradução/localização em português brasileiro. Você pretende trabalhar nisso no futuro?

ebi: É bem improvável que eu traduza minhas visual novels para o português brasileiro. VNs indie são bem nichadas em geral e tendem a não dar muito retorno [financeiro]. Às vezes, tenho dificuldade até para deixar meus projetos como estão, então traduzir minhas histórias para outras línguas seria uma despesa a mais que pode vir a não compensar para mim a longo prazo.

Sou uma mulher solo e financio todos os meus projetos do meu próprio bolso, então preciso planejar a verba cuidadosamente se eu quiser continuar no mercado.

NB: Para terminar esta entrevista, há mais alguma coisa que você queira falar, ou deixar uma mensagem para seus fãs brasileiros?

ebi: Quero agradecer a todo mundo que lê minhas histórias, especialmente pessoas que as leem mesmo quando não estão disponíveis em sua língua materna. É muito gratificante, principalmente considerando quão difícil pode ser lucrar com visual novels. Eu literalmente não seria capaz de fazer o que faço sem o apoio de vocês, e eu valorizo muito cada um de vocês!

E se você ainda não o fez, leia Ashes. Yuel é muito fofo, e muito, muito falho, mas principalmente muito fofo!


Se você gostou de conhecer mais sobre o trabalho de ebi-hime, não deixe de acompanhá-la no Twitter e em seu blog.

Revisão: Thais Santos
Capa: Gabriela Perpetua Santana da Silva
As respostas foram editadas por motivo de clareza e/ou tamanho.

Também conhecida como Lilac, é fã de jogos de plataforma no geral, especialmente os da era 16-bits, com gosto adquirido por RPGs e visual novels ao longo dos anos. Fora os games, não dispensa livros e quadrinhos. Prefere ser chamada por Ju e não consegue viver sem música. Sempre de olho nas redes sociais, mas raramente postando nelas. Icon por Heru
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