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Análise: SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake (Switch) é um bom retorno de Bob Esponja aos jogos de plataforma

O game da Purple Lamp traz desafios cativantes em uma viagem por diferentes mundos da série animada da Nickelodeon.

Arte principal de SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake em que os personagens são sugados por um portal interdimensional

Quer um choque de realidade de que estamos envelhecendo? Aí está: Bob Esponja Calça Quadrada completará 24 anos em 2023. A franquia subaquática da Nickelodeon está entre as séries animadas mais longevas da história do entretenimento e marcou diferentes gerações não só na televisão, mas em consoles de videogames também.



O personagem está presente nos games desde a época do Game Boy Color, mas é por suas aventuras de plataforma 3D lançadas para GameCube, PlayStation 2 e Xbox que ele é lembrado com nostalgia pelos millennials que assistiam ao desenho.

Um desses títulos foi repaginado em 2020 na forma de SpongeBob SquarePants: Battle for Bikini Bottom – Rehydrated. O remake produzido pelo estúdio austríaco Purple Lamp e lançado pela THQ Nordic alcançou bons resultados financeiros, vendendo mais de dois milhões de cópias pelo mundo.

Com isso, as duas empresas se juntaram novamente para voltar à Fenda do Biquíni, desta vez com um jogo inédito: SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake. Com jogabilidade e enredo simples, mas cativantes, a nova entrada encapsula bem o espírito da série e dos games de plataforma tridimensionais, embora problemas de design atravanquem a experiência.

Desenho interativo

Em termos de história, The Cosmic Shake segue aquele princípio estimulado há anos de que jogos de plataforma não precisam de grandes narrativas para serem agradáveis. Isso pode soar estranho para um game baseado em uma franquia cujos desenhos animados se caracterizam por enredos dinâmicos e humor non-sense; no entanto, há um charme até onde o roteiro e a apresentação do jogo se arriscam a ir.

Neste script original, Bob Esponja e Patrick Estrela conhecem a misteriosa cartomante Madame Kassandra, vendedora de tesouros dos sete mares. Ela oferece aos amigos um frasco de Lágrimas da Sereia, um sabão mágico capaz de garantir os desejos daqueles que assoprarem bolhas com ele.

Com sua positividade inquestionável, Bob começa a desejar tudo de bom para seus amigos, mas descobre que o item é do Rei Netuno e não deve ser utilizado por mortais. O excesso de desejos causa uma ruptura na Fenda do Biquini, tragando personagens, locações e outros moradores da cidade para diferentes universos no espaço-tempo. Agora, cabe aos heróis viajar para esses mundos e recuperar o que foi perdido.
Imagem de Madame Kassandra, uma sereia de cor roxa, cabelos roxos e olhso de cores diferentes, se apresentando ao Bob Esponja em SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake.
Madame Kassandra se apresenta a Bob Esponja e Patrick


Essa contextualização acontece em questão de minutos, após um breve tutorial dos controles. A sensação é de que os desenvolvedores quiseram tirar a história do caminho o mais rápido possível para fazer a jogabilidade brilhar.

Além disso, não há imprevisibilidade na narrativa. Desde o começo, o game deixa extremamente claro, por meio de insinuações sarcásticas, quem é o real vilão do enredo e contra quem a última luta será. Sem querer dar spoilers, mas é possível que você também já tenha sacado isso lendo os parágrafos anteriores.

Entretanto, a simpatia do roteiro não está na sua estrutura geral, mas nos pequenos momentos. Diálogos, falas individuais e piadinhas visuais estão cheios da ironia característica da série. Verdade seja dita: é um humor nada complexo, mas cada trocadilho e ilustração surreal que aparece durante a jogatina é capaz de tirar risadas.

Essa graça se faz ainda mais presente para nós, brasileiros, porque o jogo está 100% em português do Brasil, uma novidade para os jogos da franquia. Não só o enredo foi bem localizado, com piadas que só fariam sentido no nosso idioma, como todos os personagens foram dublados pelos atuais atores da animação.

Ouvir as vozes de Wendel Bezerra como Bob Esponja, Marco Antônio Abreu como Patrick, Marcelo Pissardini como Lula Molusco, Letícia Quinto como Sandy e de todo o elenco não só traz a nostalgia para quem acompanhava o seriado nos anos 2000 e facilita a compreensão para as crianças de hoje, como também reforça a qualidade da dublagem nacional. Dos personagens principais aos NPCs, todos têm um trabalho de voz excelente, dando a impressão de se estar assistindo a um episódio interativo do desenho.

As situações em que a dublagem é prejudicada devem-se a questões puramente técnicas. Há poucas vezes em que as falas em português não encaixam nas cenas escritas em inglês, o que provoca algumas interrupções nos diálogos, mas nada que comprometa a experiência. 

O que, de fato, atrapalha é o fato de Bob Esponja constantemente e aleatoriamente falar frases de efeito quando executa alguns movimentos. No começo, é algo simpático, mas quando se está há mais de vinte horas ouvindo-o falar as mesmas coisas sem parar, torna-se irritante. Quanto mais dublagem, melhor, mas não precisava exagerar assim.

Passado moderno

A narrativa não tão elaborada de The Cosmic Shake é compensada pela gameplay, que provoca uma boa viagem no tempo de volta aos anos 2000.

Mecanicamente, o novo jogo é uma espécie de sucessor espiritual de Battle for Bikini Bottom, com muitos elementos presentes no título de 2003 e na sua versão Rehydrated retornando.

O moveset de Bob Esponja é uma mistura das ações que o personagem tinha no game antigo – como pulos, ataques com sua rede e deslizamentos com a língua – e movimentos que Patrick e Sandy podiam executar em BfBB. Como esses dois personagens não são mais jogáveis, o protagonista herdou suas habilidades de planar, se pendurar em ganchos, atacar a distância e realizar pancadas corporais no chão.

Além disso, os fãs poderão encontrar uma série de referências ao game de 20 anos atrás, como cuecas que reabastecem a vida do herói, espátulas douradas escondidas pelas fases e Tikis, estruturas de madeira que Bob pode quebrar para coletar Geleia Cósmica, uma das moedas utilizadas ao longo da campanha.
Imagem de Bob Esponja, vestido como vaqueiro, andando em direção a tikis em um nível baseado no Velho Oeste em SpongeBob squarePants: The Cosmic Shake.
Alguns elementos dos níveis foram trazidos diretamente de Battle for Bikini Bottom


O que difere esse jogo de seu antecessor são os cenários em que a jornada se passa. A abertura de um multiverso permite que os níveis não se limitem aos entornos da Fenda do Biquini. Dessa forma, é possível explorar locais diversificados, como o Velho Oeste, a Pré-História, um estúdio de cinema, um castelo medieval, uma praia, o parque Mundo da Luva e uma cidade de Halloween na Fenda da Pedra.

Essa estrutura permite que os desenvolvedores sejam mais criativos não só com os ambientes, mas com a caracterização dos personagens. Nesses mundos paralelos, eles assumem diferentes personas, trazendo mais frescor aos NPCs. É divertido ver o Lula Molusco como um diretor cinematográfico, Seu Sirigueijo como um pirata ganancioso ou Gary como um rei tirano.
Imagens de Lula Molusco temático como um homem das cavernas e como um servente medieval em SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake.
Os mundos, apesar de criativos, também criam paradoxos. Por exemplo, como pode o Lula Molusco ter que ser resgatado no mundo pré-histórico, mas ser um servente no mundo medieval ao mesmo tempo?


Jogabilidade que evolui

O destaque da jogatina em The Cosmic Shake é a sensação de progressão. É nítido que houve um cuidado para não sobrecarregar os jogadores com desafios complexos logo de início nem deixar a jogabilidade tediosa com obstáculos que não evoluem com o tempo. Como um bom game de plataforma, ele vai introduzindo mecânicas novas gradativamente para então somá-las, criando momentos prazerosos de empoderamento e estratégia.

Na exploração dos mapas, diferentes elementos combinados exigem que o controle da esponja amarela seja cada vez mais preciso. Por exemplo: um trampolim que faz o protagonista saltar alto pode emendar com um gancho no qual ele se balança em direção a um escorregador em que ele deve despistar de objetos. Esse tipo de design agrada, pois permite que usuários mostrem na prática as habilidades de gameplay que obtiveram durante a aventura.

O mesmo pode ser dito sobre o combate. Monstros feitos de geleia estão à espreita de Bob Esponja em todos os lugares. Em um primeiro momento, as lutas se baseiam no herói sacudindo sua rede para lá e para cá para bater nos adversários. Porém, à medida que se avança, não só ele ganha novas opções de ataque, como homing attacks e projéteis com seu Soprador de Recifes, mas as criaturas também requerem táticas diferentes para serem abatidas. Estabelece-se então um sistema mais interessante, em que é necessário pensar na melhor forma de agir no meio de vários inimigos.
Bob Esponja lutando contra monstros de geleia, seres roxos, em SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake
Alguns inimigos de geleia que Bob deve enfrentar durante a aventura


Esse desenvolvimento de jogabilidade, embora eficaz, acontece de maneira bem simples. Não há aqui grandes inovações, e pessoas acostumadas com títulos do gênero terminarão as fases facilmente. Porém, diferentes jogadores, especialmente crianças, podem encontrar dificuldade em certos momentos. Felizmente, alguns recursos foram implementados para descomplicar a experiência para um público mais amplo.

Em alguns pontos em certos cenários, é possível escolher rotas com diferentes níveis de complexidade, evitando o bloqueio no progresso pelos mapas. Alguns inimigos também podem ser paralisados por bolhas lançadas por Bob, permitindo um maior tempo para atacar.

Além disso, Patrick – que acompanha o personagem principal como um balão flutuante – é capaz de apontar caminhos para seguir, indicar NPCs com os quais é possível interagir e trazer cuecas de energia caso o protagonista esteja em perigo. São pequenos detalhes que somam à alcançabilidade do game.
Bob Esponja desenhando um arco-íris com as mãos e sendo fotografado em SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake.
O jogo também possui uma série de minigames curtos, mas que ajudam a diversificar os níveis


Problemas com peixe

Infelizmente, nenhuma progressão bem desenhada funcionará sem um level design eficiente. É nesse lado que Cosmic Shake apresenta suas falhas.

Os mundos criados pelas Lágrimas da Sereia funcionam como grandes níveis lineares, os quais Bob Esponja deve percorrer até chegar aos objetivos finais, que normalmente são lutas contra chefões bem elaboradas ou desafios um pouco mais difíceis. Esses trajetos, apesar de cheios de obstáculos instigantes, sofrem com problemas de duração.

Na maioria das fases, a jornada é excessivamente longa, com diferentes submetas que esticam artificialmente a duração do jogo. Há horas em que pensa-se que uma fetch quest terminou, porém ela retorna minutos depois. Em outras, o jogador cumpre tarefas que não têm muito a ver com o intuito do nível, como completar uma corrida de caracol ou consertar um teatro de sombras. É uma enrolação que arrasta a história e torna certas missões entediantes.
Bob Esponja transformado em um caracol em SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake.
Bob se transformando em um caracol para participar de corridas


Para salvar o progresso nesses estágios extensos, o game utiliza um sistema de checkpoints espalhados pelo cenário. Apesar de permitirem que se viaje rapidamente para partes importantes dos mapas, eles podem causar inconveniências.

Embora tenha mecanismos de autosave, o título sempre carrega a fase a partir do último checkpoint cruzado. Assim, pode acontecer de o jogador concluir muitas missões, mas não passar pelo próximo ponto de checagem. Quando ele voltar ao jogo, terá todas as suas quests completas salvas, mas retornará ao checkpoint em um ponto anterior da fase. Ou seja, será preciso atravessar todos os ambientes de novo até chegar onde parou. Mais uma característica que alonga desnecessariamente a jogatina.

A dimensão dos níveis também atrapalha a busca por colecionáveis. Cada mundo possui dobrões de ouro escondidos e outros itens. Muitas vezes, eles só são acessíveis por meio de habilidades destravadas em etapas futuras.

Por causa disso, encontrá-los todos demanda muito backtracking. A não ser que você tenha uma memória surpreendente, será necessário escanear de cima a baixo cada fase novamente para obtê-los, o que pode ser maçante. A falta de um mapa com indicações, à la Super Mario Odyssey (Switch), é significativa.

Esse esforço poderia valer a pena caso a recompensa fosse boa. No entanto, o prêmio é a possibilidade de adquirir fantasias que mudam a aparência de Bob Esponja com a Geleia Cósmica coletada nos níveis. Apesar de serem simpáticas e fazerem várias referências às diversas épocas da animação, elas são puramente estéticas, não alterando em nada a jogabilidade, o que acaba diminuindo a relevância dos colecionáveis.
Bob Esponja, Lula Molusco e Sandy na frente da casa de Lula Molusco, com um dobrão de ouro ao lado deles.
“Um dobrão de ouro!”


Performance e acessibilidade

Com o Nintendo Switch beirando o seu sexto ano de vida, tornou-se lugar comum esperar que novos jogos para o console tenham contratempos gráficos ou de performance que façam a gameplay não ser tão agradável. Felizmente, The Cosmic Shake não é tão afetado por esses problemas.

Não se engane: há vezes em que o título definitivamente mostra que está rodando em um hardware portátil. Pode-se encontrar algumas texturas que demoram para carregar, momentos em que a taxa de quadros por segundo cai ou situações em que o game trava para poder carregar seus assets. Porém, esses exemplos são bastante momentâneos.

No geral, o jogo apresenta uma performance estável, mantendo-se por volta dos 30 fps dependendo da complexidade das cenas. Somado ao pouco pop-in no cenário e ao baixo lag, cria-se um ambiente propício para desafios de plataforma de precisão. Pode-se dizer que o aspecto técnico permite um controle fluido e consequentemente divertido.

Já quando o assunto é a acessibilidade, algumas falhas são perceptíveis, embora o coração da Purple Lamp estivesse no lugar certo. O jogo possui configurações acessíveis, mas elas se limitam a correções de cores para diferentes tipos de daltonismo e customização de tamanho e opacidade de legendas. Isso é ótimo para pessoas que necessitam dessas opções, mas não há nada que ajude pessoas com deficiências motoras.
Bob Esponja correndo pela Fenda do Biquíni, com filtro de deuteranopia ligado.
Jogo com filtro de correção de deuteranopia ligado


Remapeamento nativo de controle, modo turbo para o apertar de botões ou controle de velocidade da ação estão ausentes. Essas faltas são consideráveis, pois há muitas ocasiões em que jogadores devem realizar movimentos em rápida sequência ou pressionar o mesmo botão repetidas vezes para prosseguir. Quem tem dificuldade nessas circunstâncias está desamparado, infelizmente.

Estou pronto!

SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake é o primeiro jogo de plataforma original da turma da Fenda do Biquíni em quase oito anos. Tanto tempo longe do gênero poderia ter jogado a franquia ainda mais fundo no mundo dos jogos licenciados medianos. Felizmente, não foi esse o caminho tomado pelo estúdio Purple Lamp.

Embora tenha problemas na estrutura de seus níveis, o game traz controles, desafios e progressão de jogabilidade que satisfazem quem busca um game divertido para jogar sem compromissos. Quem cresceu com os títulos de Bob Esponja nos anos 2000 se sentirá em casa com essa sacudida cósmica.

Prós

  • Enredo com humor simples, mas cativante, cheio de piadas one-liners e gags visuais;
  • A localização e a dublagem em português brasileiro com os atores originais da animação trazem mais qualidade à apresentação do game;
  • A história baseada em multiversos permite maior criatividade na caracterização de personagens;
  • Desafios e sistema de combate que evolui com o tempo e não deixa a jogabilidade repetitiva;
  • Os minigames e outras atividades trazem momentos breves de diversidade aos níveis;
  • Amigável para pessoas com diferentes habilidades em jogos de plataforma, especialmente crianças;
  • Boa performance técnica no Nintendo Switch.

Contras

  • Alguns níveis são excessivamente longos, com atividades que estendem artificialmente a duração do jogo;
  • O sistema de checkpoints pode atrapalhar na progressão da aventura;
  • Os colecionáveis não recompensam de maneira satisfatória;
  • Ausência de remapeamento de botões e outras opções acessíveis de gameplay;
  • Bob Esponja não para de falar enquanto percorre os níveis.
SpongeBob SquarePants: The Cosmic Shake – Switch/PS4/XBO/PC – Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: Switch

 Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela THQ Nordic


Jornalista, analista de mídias, PcD e entusiasta de games desde que jogou Pokémon Azul no Game Boy Color nos anos 90. De lá para cá, tenta aproveitar ao máximo todos os consoles no pouco tempo que a vida adulta permite. Se não está escrevendo para o Blast ou demorando anos para zerar um jogo, está no Twitter (@DanielMorbi) e no Instagram (@danielmorbi_)
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