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Análise: Mario vs. Donkey Kong (Switch) é uma bem-vinda modernização de um clássico do GBA

O remake aprimora o clássico de 2004, criando uma experiência de jogabilidade de quebra-cabeças mais fluida e agradável.


Não sei se vocês perceberam, mas o mundo é de Mario e Donkey Kong. Nós apenas vivemos nele.


O encanador e o gorila são os destaques das iniciativas recentes da Nintendo fora dos jogos eletrônicos, estrelando uma rivalidade em Super Mario Bros.: O Filme e dividindo espaço em uma futura extensão do parque temático Super Nintendo World.

Era questão de tempo para que esse holofote sobre os personagens fosse refletido também nos games. Dentro desse contexto, trazer Mario vs. Donkey Kong ao Nintendo Switch fez todo sentido. O surpreendente foi isso acontecer na forma de um remake do primeiro título da franquia, lançado originalmente para Game Boy Advance.

Após oito anos sem lançamentos, a série retornou às suas origens com uma reformulação que não só apresenta melhorias gráficas, mas também aprimoramentos de design que tornam muito mais agradável solucionar quebra-cabeças com o bigodudo.

Apresentação com personalidade

Os quase 20 anos que separam o atual remake do Mario vs. Donkey Kong original já deixavam evidente que a versão de Nintendo Switch traria retoques visuais significativos à experiência. Afinal, o salto tecnológico entre o console híbrido e o GBA é gritante.

No entanto, a equipe de desenvolvimento da Nintendo Software Technology não se limitou a produzir só um port modernizado. O zelo com a apresentação do título é notável a cada momento.

O primeiro exemplo disso está nas cutscenes que contam a breve história do game. O roubo dos bonecos Mini-Mario pelas mãos de Donkey Kong não é mais apresentado por meio de imagens estáticas, e sim por cenas totalmente animadas em computação gráfica.

A maneira como essas cinemáticas são compostas faz com que elas tenham mais ar de episódios de uma série de TV do que curtas de um jogo. Aliás, até mesmo nos níveis em si, essa característica se mantém. Três elementos tornam isso possível: a apresentação dos personagens, a ambientação e a trilha sonora.
As cutscenes têm composições mais cinematográficas no remake


O título usa modelos para heróis, vilões e inimigos que estão entre os melhores que a Nintendo já produziu para um jogo do Mario no Switch. Embora não cheguem à ousadia criativa de Super Mario Bros. Wonder (Switch), os personagens são tecnicamente bem construídos e animados. Assim, o bigodudo e o gorila ganham vida e personalidade.

Inimigos mais comuns também são injetados com carisma ao serem reinterpretados como se fossem brinquedos, assim como os Mini-Marios. É impossível não sorrir ao ver um Boo trocar de rosto como um boneco Power Ranger ao ser visto, ou um Shy Guy que se move por meio de uma chave de dar corda em suas costas. São detalhes que eram pouco notáveis no GBA devido à sua qualidade gráfica; no Switch, esses elementos finalmente podem brilhar.

O poder amplamente superior do console híbrido também permite que os ambientes tenham um polimento extra. Ao invés dos níveis de quebra-cabeça serem chapados como eram em 2004, agora eles possuem tridimensionalidade — tanto nos backgrounds quanto nos primeiros planos —, com elementos que projetam sombras e refletem luz. O resultado são cenários muito mais amigáveis aos olhos do que os conjuntos de pixels do passado.
Brinquedos de Boos perseguem Mario nos níveis do mundo Spooky House


No entanto, as melhorias não se resumem aos gráficos. A trilha sonora também recebeu novos arranjos: com uma mistura de instrumentos reais e digitais, as composições vão do jazz ao lo-fi, abusando de saxofones, pianos, flautas e violinos para embalar a aventura. São faixas que surpreendem pela sua qualidade, podendo facilmente entrar nas playlists de estudar/trabalhar de muita gente.

O único ponto negativo em relação à apresentação sonora é a exclusão de várias falas de Mario presentes no game original. Para o título de GBA, Charles Martinet gravou uma série de frases engraçadas, em um raro momento de liberdade concedido pela Big N. É uma pena não podermos ouvir o personagem falar um italiano macarrônico, gritar “Come back here, you big monkey!” ou agradecer o produtor Shigeru Miyamoto em alta qualidade de som.

Um jogo mais contemplativo

Já do lado da jogabilidade, Mario vs. Donkey Kong não parece provocar radicais alterações ao ser comparado com o game de 20 anos atrás. Porém, um olhar mais atento é capaz de notar mudanças significativas de design.

Essencialmente, a premissa é a mesma: guiar Mario por níveis compactos em que ele deve pular, escalar, fazer acrobacias e acionar botões que alteram o layout do ambiente para encontrar os Mini-Marios roubados pelo Donkey Kong.

Porém, fazer isso a esmo não é eficiente. É preciso observar os obstáculos, entender como eles se comportam e traçar uma rota eficaz para o protagonista. São puzzles que não inovam, mas que funcionam ao acrescentar gradativamente novos elementos aos quebra-cabeças à medida que se vai avançando pelos oito mundos principais — dois a mais do que na versão de GBA.

O objetivo final em cada level é conquistar uma classificação Perfect, representada por uma estrela dourada. É aqui que a versão de Switch difere completamente do título base, mostrando-se mais moderna para o bem e para o mal.

Originalmente, esse rank perfeito era concedido a quem conseguisse ultrapassar uma pontuação pré-definida pelo game, o que exigia movimentos extremamente precisos para derrotar todos os inimigos e colecionar três presentes colecionáveis espalhados pelos níveis no menor tempo possível.

No remake, esse sistema de pontos foi eliminado. Agora só é preciso pegar os presentinhos para obter o Perfect, seja no modo Classic (com uma chance por vida e tempo limitado) ou no Casual (com checkpoints, tempo infinito e múltiplas tentativas por vida).
Nas lutas contra Donkey Kong, o Perfect é conquistado ao derrotarmos o gorila sem tomar dano


Essa mudança combina muito mais com o gênero do título. Jogos de puzzle normalmente são mais contemplativos, exigindo um processo de raciocínio que muitas vezes não combina com a pressão do tempo ou comandos milimetricamente pensados. Remover os high-scores dá uma fluidez melhor à experiência, tornando-a mais agradável.

Por outro lado, essa jogabilidade fluida destaca a facilidade dos níveis. Com algumas poucas exceções, os quebra-cabeças são bastante fáceis de ser solucionados. Isso acontece devido à linearidade da maioria deles: basta escanear o cenário uma ou duas vezes para entender exatamente o que precisa ser feito.

Raros foram os momentos em que me senti travado de fato em um desafio, sem saber como progredir. Isso faz com que cada mundo seja concluído em questão de minutos, tornando a jogatina muito rápida para justificar o preço de R$ 249,00 na Nintendo eShop.

Novos conteúdos até auxiliam a trazer longevidade ao game. As fases inéditas de Merry Mini-Land e Slippery Summit encaixam-se bem com os níveis originais, trazendo elementos e estruturas que poderiam facilmente estar no jogo de GBA. Já a opção de multijogador cooperativo para até duas pessoas e o modo Time Trials permitem criar estratégias levemente diferentes para os níveis existentes.

Porém, nenhum deles é capaz de sustentar a gameplay por mais de uma ou duas semanas. Talvez outras adições, como os antigos níveis planejados para o acessório e-Reader, de Game Boy Advance, ou um editor de fases com possibilidade de compartilhamento online pudessem trazer mais custo-benefício ao título.

(Falta de) acessibilidade e localização

Quando o assunto é acessibilidade, Mario vs. Donkey Kong também deixa muito a desejar.

O único recurso acessível real são as opções de dificuldade Classic e Casual. Por mais que o game seja fácil no geral, esses estilos de jogo são bem agradáveis, pois permitem mais controle do ritmo da aventura. Além disso, o título não pune quem utiliza o modo Casual com ranks inferiores, o que é ótimo para completar os níveis expert pós-game.
No estilo Casual, Mario pode receber dano até cinco vezes antes de perder uma vida


No entanto, outras opções para pessoas com deficiência, como remapeamento nativo de botões e controle de volume de músicas e efeitos sonoros, estão ausentes.

Porém, o mais grave é a falta de filtros de cor para pessoas com daltonismo. Grande parte das fases possui botões azuis, vermelhos e amarelos que ativam blocos de cores correspondentes, mas com os mesmos padrões geométricos. Pessoas que têm dificuldades de distinguir colorações possivelmente terão problemas nesse sentido.

Outro ponto que vale destacar é a ausência de localização para português brasileiro. A natureza do remake não exige que se saiba profundamente outros idiomas para aproveitá-lo, mas a quantidade de textos é tão pequena que é questionável não localizar o jogo para nossa língua.

A rivalidade está de volta

Mario vs. Donkey Kong é um bom exemplo dos jogos que o Nintendo Switch provavelmente receberá neste suposto último ano do console antes do lançamento de seu sucessor: games menores ou remakes descompromissados de clássicos.

Porém, ao contrário de consoles passados, que receberam títulos menos impactantes em seus últimos meses, esse relançamento está no mesmo nível de outros que surgiram ao longo da vida do Switch.

Ele é uma ótima adição à biblioteca da plataforma híbrida, modernizando a gameplay do game de GBA para trazer uma experiência mais agradável. Infelizmente, a facilidade dos níveis torna o título muito curto para justificar seu valor.

Vamos torcer para que esse seja só o começo para o retorno dos embates entre Mario e Donkey Kong.

Prós

  • Ótima apresentação visual, com gráficos repaginados e animações que dão vida aos personagens e elementos;
  • Trilha sonora com arranjos de qualidade;
  • Mudanças de game design tornam a resolução de puzzles mais agradável;
  • Os novos conteúdos e o modo cooperativo se encaixam bem nas fases originais;
  • Os modos Classic e Casual podem ser desfrutados à escolha dos jogadores, sem penalidades.

Contras

  • Remoção de falas engraçadas do Mario presentes no game original;
  • A baixa dificuldade na maioria dos quebra-cabeças faz com que seja muito rápido completar os níveis;
  • Falta de recursos de acessibilidade, em especial opções para daltonismo;
  • Falta de localização em português brasileiro.
Mario vs. Donkey Kong – Switch – Nota: 8.0

 Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Nintendo


Jornalista, analista de mídias, PcD e entusiasta de games desde que jogou Pokémon Azul no Game Boy Color nos anos 90. De lá para cá, tenta aproveitar ao máximo todos os consoles no pouco tempo que a vida adulta permite. Se não está escrevendo para o Blast ou demorando anos para zerar um jogo, está no Twitter (@DanielMorbi) e no Instagram (@danielmorbi_)
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