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Análise: GetsuFumaDen: Undying Moon (Switch) é um roguelike bonitinho, mas ordinário

Novo jogo da Konami apresenta belos gráficos, mas desperdiça potencial.

35 anos separam Undying Moon do primeiro GetsuFumaDen, lançado para NES apenas no Japão. Nesse intervalo de tempo, a Konami passou de um dos grandes players do mercado para uma produtora menor, com títulos cada vez menos relevantes. Por isso, é uma decisão no mínimo inusitada ressuscitar um título até então restrito ao mercado oriental e que em sua época foi eclipsado pelo bem-sucedido Castlevania.


O novo jogo, agora sem restrições de região, ganha o mundo e chega ao Switch inclusive com legendas em português. Ainda assim, mantém-se como um mergulho de cabeça na cultura, na estética e mesmo na linguagem japonesa. Isso lhe confere uma identidade própria e até atrativa, mas que não é o suficiente para se tornar a volta da companhia aos grandes sucessos.

A aventura de Fuma

GetsuFumaDen: Undying Moon foi desenvolvido pela GuruGuru, enquanto a Konami adotou o papel de distribuidora. O estúdio se inspirou em lendas japonesas para a criação dos demônios que enfrentamos ao longo da campanha, com cenários semelhantes a gravuras vivas que são o grande charme do título.

Nesta fantasia, você é o representante do clã Getsu e deve descer às profundezas do inferno para enfrentar as forças sobrenaturais e proteger o mundo dos vivos. A história não é exatamente digna de Oscar, até porque o foco aqui é na ação com pitadas de hack-n-slash.
Colorindo a neve com o sangue dos inimigos


O que nos leva ao outro charme do título: a ação violenta. Ao combater demônios, sangue e ossos voam pela tela. Existe uma boa variedade de armas, que demandam diferentes estratégias e oferecem opções para diversos estilos de jogo. É interessante notar a sutileza de uma espada simples, a efetividade de usar duas espadas ou mesmo o peso de um golpe com um tacape.

A jogatina baseia-se em entrar numa fase e andar pelo cenário enfrentando os inimigos e abrindo baús para encontrar armas primárias e secundárias, dinheiro para ser utilizado com comerciantes e itens que podem ser usados para evoluir suas armas e seu personagem. Ao final, enfrenta-se o chefe após uma apresentação impactante e segue-se para um hall onde é possível entrar em outra fase ou voltar para o hub inicial. A fórmula é básica, mas sua execução aqui possui alguns problemas que afetam bastante a experiência.

Nem tudo que reluz é ouro

Visualmente, Undying Moon empresta muito da arte Ukiyo-e, um gênero de xilogravura e pintura característico do Japão dos séculos XVII a XIX. O game apresenta o equivalente a estampas ganhando movimento em suas muitas camadas: o primeiro plano é mais estático para ressaltar a movimentação dos personagens; o fundo possui outros planos, estes mais vivos, com destaque para o último, onde em geral é possível vislumbrar o chefe da fase.

As temáticas do Ukiyo-e também se mostram presentes: as máscaras do teatro kabuki e os lutadores de sumô inspiram o visual dos inimigos. As cenas históricas e de viagem, as paisagens, a fauna e flora, lendas populares… tudo explode na tela em seus mínimos detalhes. A primeira impressão diante dessa direção artística é de maravilhamento. A beleza das pinturas em movimento salta aos olhos imediatamente, até que algumas decisões equivocadas passam a se sobressair.
Neste cenário ainda vai entrar o movimento da espada, o sangue dos demônios, um ideograma…

Por exemplo, o Limbo Empesteado, que corresponde à primeira fase, é uma área em que a chuva chega a atrapalhar a visão do jogo. Diferente do que ocorre em outra fase, montanhosa, onde olhos incrustados em pedra provocam uma neblina que propositalmente limitam o que você consegue enxergar até que sejam destruídos. Outro exemplo: o movimento dos golpes, com seus brilhos e rastros, por vezes se confundem aos golpes dos adversários e à movimentação das imagens de fundo. São tantos detalhes postos ao mesmo tempo em tela que gera uma poluição visual, causando a impressão de que seria melhor uma proposta mais enxuta.

Andando em círculos

Essa questão visual acaba sendo afetada também por outra decisão, desta vez de game design. GetsuFumaDen é um jogo de ação roguelike que se propõe difícil e desafiador. Com isso em mente, a morte é punida com a perda de seu progresso na fase e o retorno para a Mansão Getsu, sua hub inicial. Desse modo, o jogo nos obriga a passar pelo já citado Limbo todas as vezes em que se reinicia a partida, o que faz diminuir o impacto visual a cada repetição, levando ao cansaço.

O mesmo acontece com todas as fases que são porta de entrada para outras. Por mais que a cada partida o desenho da fase mude, isso não é o suficiente para evitar o cansaço causado por essa mecânica. Pior, leva a novos problemas: o redesenho por vezes coloca inimigos em uma plataforma minúscula, sem espaço para o seu personagem, levando a um combate injusto e a perda de preciosos pontos de hp. Em outras ocasiões, a remodelagem proporcionou grandes áreas vazias, sem adversários ou itens para coletar, virando um passeio por um cenário cuja paisagem você já está farto de ver.
Beleza que cansa depois da milésima vez
Para ser justo, esse esquema repetitivo de mortes constantes e grind para conseguir sobreviver e chegar até um pouco mais longe não é nenhuma novidade. E talvez seja exatamente essa a questão: a Konami pareceu mais interessada em aderir à “moda” atual do que pensar no que seria melhor para o título.

Devagar e sempre

O protagonista Fuma é um guerreiro habilidoso e com movimentos bastante plásticos. Com todo esse clima fascinante do Japão antigo, criado não só pelo visual como também pela trilha sonora, ver toda a plasticidade de uma espadada bem dada em um inimigo é uma parte importante para a imersão. Para ajudar nesta visualização, a movimentação é lenta. Porém, isto ainda é um jogo de ação, e ter a jogabilidade afetada por movimentos lentos não é exatamente o ideal.

Esse exemplo resume o que é GetsuFumaDen: Undying Moon: um jogo de ação com visuais belíssimos. Porém, o apuro visual às vezes extrapola o limite do funcional. É um título clássico que flerta com as características dos roguelikes modernos de sucesso. Contudo, nem tudo que lhe serviu de inspiração ajudou a lhe dar destaque e personalidade. É um game com potencial para ser extraordinário, mas se perde no comum.

Prós

  • Direção de arte e trilha sonora impactantes;
  • Variedade de armas possibilita diversas estratégias de jogo;
  • Representação do Japão antigo favorece a imersão.

Contras

  • Tendência à poluição visual com muitos elementos simultâneos em tela;
  • Geração randômica dos níveis apresenta, por vezes, fases vazias ou com problemas;
  • A repetição obrigatória favorece o cansaço com o visual;
  • Movimentação lenta do personagem prejudica a jogabilidade.
GetsuFumaDen: Undying Moon — PC/Switch — Nota 5.0
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Janderson Silva
Análise produzida com cópia digital cedida pela Konami

Nascido no mesmo dia que Manoel Bandeira (mas com alguns anos de distância), perdido em Angra dos Reis (dos pobres e dos bobos da corte também), sob a influência da MPB, do rock e de coisas esquisitas como a Björk. Professor de história, acostumado a estar à margem de tudo e de todos por ser fora de moda. Gamer velho de guerra, comecei no Atari e até hoje não largo os mascotes - antes rivais - Mario e Sonic.
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