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Análise: GYLT (Switch): o terror enfrentado na infância

O jogo de terror da Tequila Works traz uma experiência sólida de survival horror.

Quando eu era criança, costumava ter muitos pesadelos. Rabiscos e sombras pareciam ganhar vida própria e pequenos detalhes podiam ficar impregnados na minha mente por horas. Uma cena extremamente rápida de um programa na TV ou de um jogo podia levar a sonhos bizarros, especialmente se houvesse algum tipo de elemento macabro envolvido.

Por conta disso, eu evitei, durante a minha infância, muitas obras de terror ou violentas, especialmente jogos. Falo sobre isso, pois GYLT é um jogo que me remete a essas sensações da infância, apresentando uma experiência horripilante sob a ótica de uma criança.

Um mundo sombrio

Em GYLT, assumimos o papel de Sally, uma jovem garota cuja prima, Emily, está desaparecida. Espalhando cartazes por toda a cidade, nossa protagonista está muito preocupada com o paradeiro de sua parente, com quem tinha uma boa proximidade.

Porém, durante a sua busca, ela acaba sendo cercada por um grupo de valentões e a sua fuga a leva a ficar perdida. Na volta para a cidade, ela encontra coisas muito estranhas e nada do que ela conhecia está mais como era. Monstros sombrios vagam pelas ruas e há rastros de destruição.

Porém, uma coisa ela logo descobre: Emily está na escola dessa cidade tomada pelas sombras. Com isso, Sally ganha um objetivo claro: entrar no prédio e encontrar sua prima para saírem juntas desse pesadelo. Porém, a jornada não será tão fácil, sendo necessário explorar bem os locais para conseguir itens e garantir o melhor final.

Tópicos como bullying, isolamento social e outros dramas sociais são pontos que vêm à tona durante o jogo. Embora a trama principal seja mais direta na busca de Sally por Emily, os vários diários espalhados pela cidade ajudam a ter uma noção de várias mazelas, aumentando a curiosidade sobre o mundo que estamos encarando.

Luz e sombras

GYLT é um survival horror que limita nosso inventário de duas formas. A primeira envolve os inaladores, que são usados para recuperar nossa vida e só podemos ter no máximo cinco deles. A outra é a bateria da lanterna, que é gasta toda vez que usamos um feixe de luz para atacar os monstros. Fora esses itens, temos itens-chave que não sofrem tais limitações.

Embora seja possível seguir diretamente de um ponto relevante da trama a outro, a experiência ideal envolve vasculhar vários cantos. De forma geral, as áreas a explorar são simples, mas conseguem cumprir muito bem o seu propósito com desafios projetados de forma elegante pelos mapas.

Como Sally é frágil, o ideal é tentar sempre avaliar os padrões de movimento dos inimigos e optar por uma tática furtiva, esgueirando-se por trás de objetos do cenário. Conforme exploramos, até liberamos alguns itens que poderiam ser usados de forma ofensiva, com especial destaque para a lanterna; porém, as suas capacidades são limitadas pela bateria, compensando mais a economia de energia do estilo furtivo.

Em alguns poucos momentos da trama, também precisamos enfrentar chefões que testam a capacidade do jogador de avaliar padrões, se esgueirar por áreas limitadas e aproveitar o cenário a seu favor. Todos oferecem bons desafios, nem sempre focados exatamente no combate, mas sim no domínio das bases da gameplay.

Porém, o foco principal é a resolução de puzzles voltados a encontrar formas de entrar nas diversas áreas inicialmente trancadas. Em alguns momentos, precisamos entrar em tubulações; em outros, desligar fontes de energia para poder passar por poças eletrificadas; e até mesmo apagar incêndios é necessário em pontos mais avançados do jogo.

Os puzzles são elegantes e bem-produzidos, e chama a atenção o fato de que eles podem ser resolvidos com as poucas ferramentas de Sally. A limitação de recursos faz com que esses desafios tenham uma resolução geralmente intuitiva, mas em nenhum momento eles parecem ser algo trivial.

Aspectos técnicos por trás de tudo

Um ponto que costuma ser importante no terror é a direção sonora. O uso de trilhas e efeitos que reforçam a tensão da experiência pode ser a diferença entre um jogo besta e algo imersivo. Mais até mesmo do que os aspectos visuais, o uso de ruídos estranhos, vozes sussurrantes ou gritos histéricos por si só já trazem aquele desconforto fundamental.

Em GYLT, a trilha sonora aumenta quando um inimigo te detecta e começa a correr atrás de você. Essa escolha é ótima e a música cumpre bem o seu papel de fortalecer a tensão, porém há vários momentos em que a música passa do ponto. Ela mantém a tensão alta e o fato dela associar o ritmo à detecção de inimigos pode deixar o jogador desnorteado em momentos nos quais nem há inimigos por pertoe o toque parece indicar que há.

No aspecto visual, os ambientes fazem bom uso de uma iluminação parca e de vários elementos de destruição. Os monstros, embora tenham pouca variedade, incorporam sombras, chamas e até mesmo o conceito de “boneca” em seu design, e as suas animações e sons bizarros reforçam o tom de aberração no enfrentamento deles.

Em alguns momentos, por conta de estar jogando de dia em ambientes muito iluminados, precisei alterar a iluminação do jogo para poder enxergar melhor. Infelizmente, a opção de correção presente na obra acaba deixando o contraste do ambiente difícil de enxergar, o que dificultou a minha exploração em alguns momentos. A edição do Switch também pode ficar um pouco borrada em suas texturas, mas não é nada que chegue a ser um incômodo.

Por fim, vale destacar que a obra conta com legendas em português, mas o texto é de Portugal. Pessoalmente, não gosto da opção e tenderia a trocar a língua para o inglês por me deixar mais confortável com a leitura, mas só é possível fazer isso no menu inicial.

Mais uma boa adição ao Switch

GYLT é uma aventura de survival horror genuína com uma ambientação que remete ao contexto escolar infantil. Sob a ótica de uma pequena garota, o mundo sombrio que enfrentamos é horripilante e a obra consegue transmitir toda essa tensão e valorizar a exploração com um trabalho competente de criação de ambientes e puzzles com base em mecânicas básicas.

Prós

  • Experiência de survival horror genuína com forte tensão e exigência de constante atenção ao inventário limitado de itens de cura e ataque;
  • Com poucas ferramentas de base, o jogo consegue fazer puzzles elegantes e de resolução intuitiva sem cair na trivialidade;
  • Os diários e outros itens são um excelente incentivo à exploração.

Contras

  • As opções de mais iluminação reduzem significativamente o contraste de objetos;
  • A trilha sonora mantém a tensão mesmo sem nenhum inimigo por perto e acaba sendo um pouco desnorteante;
  • A única opção de português é a de Portugal e é necessário voltar ao menu inicial para trocar a língua.
GYLT — Switch/PC/PS4/PS5/XBO/XSX — Nota: 8.5
Versão utilizada para análise: Switch

Revisão: Davi Sousa
Análise produzida com cópia digital cedida pela Tequila Works


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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