Blast from the Past

Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars (SNES) faz 25 anos

O desenvolvimento, o conceito e o legado por trás dessa lenda.




Desenvolvido pela Square (atual Square Enix) e publicado pela Nintendo, Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars (SNES), o primeiro RPG da franquia Super Mario, comemora em 2021 seu aniversário de 25 anos. Lançado em 9 de março de 1996 no Japão e em 13 de maio do mesmo ano na América do Norte, esse aclamado e inusitado título de RPG não só tinha como protagonista o mascote da Big N, Mario, mas também vários outros personagens da série Super Mario, todos licenciados pela Nintendo.


Super Mario RPG foi o primeiro RPG da série Super Mario e, por sete anos — até Final Fantasy Crystal Chronicles (GC) —, acreditava-se que seria o último título da Square para um console da Nintendo. Confira nesta matéria um pouco dos bastidores, do conceito e da recepção crítica desse título que abriu caminho para duas importantes séries da Nintendo: Paper Mario e Mario & Luigi.

O nascimento de uma lenda

No início da década de 1990, embora os RPGs da Square fossem populares no Japão (como os JRPGs em geral, aliás), seus títulos não vendiam muito bem no exterior. Em contraste, a franquia Super Mario era incrivelmente popular por todos os cantos do mundo, e Shigeru Miyamoto, o criador da série, queria fazer um RPG protagonizado por Mario. Entretanto, esse era um gênero de jogos em que a Nintendo tinha pouca experiência, e além disso, Miyamoto já estava concentrado no desenvolvimento de Super Mario 64 (N64).
Shigery Miyamoto ao lado de um cosplay de Mario ao estilo de Super Mario 64

Nesse contexto, um “Super Mario RPG” fruto de uma parceria entre as duas empresas japonesas seria uma feliz coincidência de interesses para ambas. O desenvolvimento desse inesperado RPG de Super Mario começou por volta do segundo trimestre de 1995 e o título foi oficialmente revelado no V-Jump Festival, no Japão, por Shigeru Miyamoto — produtor do jogo — e por um de seus diretores, Chihiro Fujioka.

Fujioka trabalhara há algum tempo como compositor e, nos últimos anos, ao entrar para a Square, também teve experiência como produtor e roteirista em Final Fantasy Legend III (GB) e Final Fantasy Mystic Quest (SNES), respectivamente, mas não havia tido nenhum protagonismo em carros-chefes da Square, como os títulos principais da série Final Fantasy. Em Super Mario RPG, ele dividiria a direção com Yoshihiko Maekawa, que também não tivera, até então, nenhum protagonismo em títulos de destaque da Square, mas havia contribuído como planejador de cenários do aclamado Final Fantasy VI (SNES), de 1994.

O desenvolvimento de um dos melhores gráficos para o Super Nintendo

Os líderes por trás da arte visual de Super Mario RPG foram Kiyofumi Kato e Yuko Hatae. Hatae era até então pouco expressivo na indústria dos jogos, enquanto Kato já era razoavelmente conhecido no Japão por vários títulos que nunca chegaram ao Ocidente — Entre esses, Psycho Dream, recentemente adicionado à biblioteca de SNES do Nintendo Switch Online.

Quanto à parte técnica, segundo uma das edições (83) da Nintendo Power, Miyamoto liderou equipes na Nintendo e na Square que passaram mais de um ano desenvolvendo os gráficos do jogo. Os desenvolvedores criaram os elementos internos, como colunas e escadas, e os elementos externos, que configuram o cenário, com técnicas avançadas de modelagem computacional.

Conforme previamente anunciado na edição 77 da Nintendo Power (de outubro de 1995), quando pelo menos 70% do jogo já estava completo, Super Mario RPG trazia vários elementos em 3D e efeitos especiais de iluminação para criar sombras e reflexos que visavam melhorar esses elementos.




Tal façanha técnica foi possível somente porque Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars foi um dos sete únicos jogos de SNES (fora do Japão) a usar o chip Nintendo AS-1, que concedia um microprocessador adicional, dando maior velocidade de clock; acesso mais rápido à memória RAM; armazenamento de dados e compactação, entre outros recursos.

Como resultado, as animações e a excelência dos gráficos em 3D receberam muitos elogios dos críticos da época (por exemplo, na Electronic Gaming Monthly), e a estética em geral ajudou a encorajar jogadores ocidentais a encarar a impopular jogabilidade dos RPGs. Por esses méritos, Super Mario RPG chegou a ser indicado, em março de 1997, a jogo de melhor gráfico na Nintendo Power Award, mas acabou derrotado por Super Mario 64.

Um híbrido de Final Fantasy e Super Mario Bros.

Com a orientação de Miyamoto, a Square desenvolveu a jogabilidade de Super Mario RPG combinando aspectos de RPG de seus jogos anteriores, como Final Fantasy VI (SNES), com elementos de ação em plataforma típicos da série Super Mario. O programador chefe foi Fumiaki Fukaya, que já havia trabalhado na programação de um título da Square que combinava elementos de ação e RPG em um dos jogos pioneiros do subgênero action-RPG: Secret of Mana (SNES).

A série Final Fantasy serviu de modelo para as cenas de batalha por turno, enquanto os títulos da subsérie Super Mario Bros. deram o tom dos momentos de ação, nos quais a capacidade de Mario de correr em oito direções e pular e cair em uma perspectiva isométrica 2.5D deu a ele maior amplitude de movimento.

A história de Mario contava ainda como vários puzzles, os quais foram muito elogiados pelos críticos da época. E, enquanto o personagem seguia sua aventura, ele não se deparava com encontros aleatórios; os inimigos eram visíveis em campo, sendo possível evitá-los ou iniciar uma batalha por turnos ao encostar neles.

Quanto às batalhas de turno, elas seguiam o sistema tradicional com a adição de comandos de ação que amplificavam os efeitos de movimento. Ao início do turno, o jogador pode escolher entre atacar, defender, correr, usar um item ou realizar uma magia. E o comando de ação consiste em apertar certos botões de modo cronometrado durante um ataque.

O grupo do jogador inicialmente contempla apenas Mario, mas, no decorrer da história, pode ter até cinco personagens; sendo que Mario e até dois membros podem participar das batalhas. Cada personagem tem um conjunto único de ataques e técnicas que se complementam; assim, enquanto a Princesa Peach (aqui chamada de Toadstool), por exemplo, tem técnicas de cura, Geno e Bowser têm poderosos ataques ofensivos.

Alguns críticos, como Cavin, da RPGamer, notaram que o sistema de batalha durante os combates por turno não era muito original, mas que a interação e a combinação dos elementos de RPG com plataforma eram excelentes e muito criativas. Ademais, muitos destacaram que a jogabilidade era complexa o suficiente para desafiar veteranos de RPG, mas baseada em mecânicas simples o suficiente para não alienar os novatos no gênero.

A lenda das sete estrelas

O roteiro de Super Mario RPG foi escrito por Atsushi Tejima, que editara os manuais de Super Mario Kart (SNES) e Donkey Kong (SNES), e Kensuke Tanabe, que já havia contribuído de várias maneiras para para Super Mario Bros. 2 e Super Mario Bros. 3, no NES, e para as séries Kirby, Donkey Kong Country e The Legend of Zelda.

O mundo do jogo situa-se em uma região geográfica de variados ambientes, incluindo montanhas, florestas e porções de água, cada local com habitantes de características distintas. Mushroom Kingdom, por exemplo, é habitado por sapos, enquanto Moleville é habitada por toupeiras e em Yo'ster Isle vivem Yoshi e os demais de sua espécie. Entre esses locais, vale destacar ainda o castelo do Bowser, que contém um portal para a terra natal do célebre antagonista de Mario.

O início da narrativa consiste em uma típica tentativa de resgatar a Princesa Peach das garras de Bowser. Porém, durante a batalha, uma enorme espada viva chamada Exor cai do céu, rompe a Star Road (um caminho que ajuda a realizar os desejos das pessoas) e se choca com o castelo de Bowser. Essa cena marca o início de uma busca pelos pedaços estelares (Star Pieces) e uma incomum reviravolta nas aventuras de Mario: uma gangue, a Smithy Gang, invade aquele mundo.

A fim de tentar parar as investidas do grupo, Mario junta-se a Mallow, um habitante de uma terra de nuvens (Nimbus Land); Geno, um boneco possuído por um espírito celestial; e o próprio Bowser, cujos exércitos o abandonaram, por medo da Smithy Gang. Tal gangue, como logo é revelado, é liderada por Smithy, um robô ferreiro de uma dimensão alternativa que possui aspirações de dominar tudo.

Mais detalhes sobre a história podem estragar a experiência do jogo com spoilers desnecessários, e esse título vale muito a pena ser jogado ainda hoje, não só por ter envelhecido bem em estética e gameplay, mas também por ter um bom enredo com personagens carismáticos e referências engraçadas a outros títulos da Nintendo.

Os críticos à época elogiaram principalmente o ótimo humor que fazia jus ao alto padrão da Square, mas alguns sentiram falta de um enredo mais claramente unificado e temeram que os personagens fossem infantis demais para o público mais velho.

Arranjos de clássicos e novas peças bem animadas e com timbres variados

Trazendo peças originais, mas também alguns arranjos de músicas já conhecidas de Super Mario e Final Fantasy, a trilha sonora ficou por conta de Yoko Shimomura, que já havia trabalhado em marcantes composições nos arcades, como Final Fight e Street Fighter II: The World Warrior.
Yoko Shimomura
Shimomura enfatizou um estilo infantil com ritmos bem marcados, melodias simples e sem muitos acidentes, campos harmônicos em tons maiores e uma grande variedade de timbres, principalmente mesclando sons sintéticos com sons eletrônicos de instrumentos de sopro e percussão.

Além das obras originais, a OST de Shimomura também incorporou arranjos de peças de Koji Kondo compostas para a série Super Mario, como Super Pipe House e Long Long Ago...; e também três de Nobuo Uematsu, usadas em Final Fantasy IV: Fight Against Crystaller, Victory Over Crystaller e Conversation with Crystaller. Em 25 de março de 1996, a trilha foi publicada no Japão pela NTT em um álbum com dois discos com o nome “Super Mario RPG Original Sound Version”. Confira abaixo a OST completa:


A trilha sonora de Shimomura foi muito elogiada por sua riqueza de sons e por combinar muito bem com os ambientes circundantes, mas muitos consideraram as músicas de batalha um tanto monótonas.

25 anos depois

Duas décadas e meia depois, não há como não olhar para trás e perceber que Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars é um marco na indústria dos videogames e um dos títulos mais importantes para a trajetória da Nintendo. Além disso, é notável como esse jogo representou uma última grande contribuição da Square em plataformas da Big N antes de, no ano seguinte (1997), levar suas franquias para o PlayStation da Sony.

O casamento entre a Square e a Nintendo resultou em um trabalho único e inesperado, que contribuiu muito para convencer mais jogadores ocidentais a dar uma chance aos RPGs, especialmente JRPGs. Ademais, apesar de já existirem títulos que mesclavam ação e elementos de RPG, Super Mario RPG foi um experimento muito peculiar de híbrido entre RPG tradicional e plataforma, que veio a inspirar outros jogos no futuro que procurassem aproximar esses dois tipos de gêneros tão distantes, a começar pelo fato de que usualmente sequer é possível pular em RPGs.



Para a Nintendo em particular, essa parceria de sucesso motivou-a a continuar com propostas de RPG para o bigodudo. Daí nasceram duas subséries que seriam suas sucessoras espirituais: Paper Mario, principalmente para os consoles domésticos, desenvolvido em parceria com a Intelligent Systems; e Mario & Luigi, nos portáteis, desenvolvido em parceria com a AlphaDream. Ambas são IPs de duradouro sucesso comercial e que também renderam alguns títulos clássicos obrigatórios (com média 90 ou mais no Metacritic), como Paper Mario (64), Mario & Luigi: Superstar Saga (GBA) e Mario & Luigi: Bowser’s Inside Story (DS).

Também por parte dos desenvolvedores, Super Mario RPG abriu muitas oportunidades para que brilhassem na indústria dos jogos. Os diretores, Maekawa e Fujioka, de pouco destaque até então, viriam a ocupar cargos importantes na Nintendo depois do sucesso desse RPG. Ambos estariam na direção e/ou produção de quase todos os títulos da subsérie Mario & Luigi. Outro exemplo é a compositora, Shimomura, que, como dito em entrevista, consideraria seu trabalho em Super Mario RPG um dos momentos de virada em sua carreira, ao lado de Street Fighter II e Kingdom Hearts (PS1).

Em 2008, Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars foi disponibilizado no Virtual Console do Wii e, em 2016, no Virtual Console de Wii U. Em  2017, esse título também foi colocado entre os 21 jogos pré-instalados do Super NES Classic Edition. Mais recentemente, no final de 2020, o personagem favorito dos fãs de Super Mario RPG, Geno, teve uma skin em sua homenagem disponibilizada em DLC para Super Smash Bros. Ultimate (Switch). Atualmente é um dos títulos mais aguardados para o serviço Nintendo Switch Online — SNES.
Skin de Geno em Super Smash Bros. Ultimate
E você, o que acha de Super Mario RPG: Legend of the Seven Stars? Já jogou esse ou algum outro RPG da série Super Mario? Chegou a jogá-lo na época do SNES? Aliás... essa calhou de ser uma de suas primeiras experiências com RPGs? Certamente foi a introdução no gênero de muitos no Ocidente. Ou você experimentou esse título mais tarde? Talvez no Virtual Console de alguma das últimas plataformas da Nintendo.

De qualquer forma, assim como eu, imagino que esteja ansioso para a chegada desse título no Nintendo Switch Online — SNES. Para este momento de 25 anos do jogo, seria uma adição muito bem-vinda. Mas, até lá, contentemo-nos com a skin de Geno em Super Smash Bros. Ultimate.

Revisão: Davi Sousa

Doutorando em Filosofia que passa seu tempo livre com piano, livros, PC e portáteis. No Twitter, também é conhecido como Vivi. Interessa-se especialmente por narrativas de ficção científica, realismo mágico e alta fantasia política, e aprecia mecânicas de puzzle, stealth, estratégia e RPG. Seu histórico de análises pode ser conferido no OpenCritic e suas reflexões sobre RPG e game design encontram-se na SUPERJUMP (textos em inglês), bem como no Podcast do Vivi e em seu canal no YouTube.
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