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Análise: Dodgeball Academia (Switch) mistura queimada com RPG em uma obra-prima brasileira

Essa pérola nacional desenvolvida pela Pocket Trap apresenta um carismático universo de desenho animado.



Completos opostos na teoria, a ideia de misturar de RPGs com esportes sempre resultou em ótimas experiências no mundo dos videogames. Assim como Romeu e Julieta, o caso de amor entre esses dois conceitos tão distintos surpreende a todos que duvidam de sua química inusitada.

Depois de passar tanto tempo esquecida, essa fórmula criada originalmente pelo primeiro Mario Golf do Game Boy Color finalmente está voltando a ser explorada por meio das produções indies. Nesse contexto, Dodgeball Academia (Switch) surge como um carismático RPG que transporta o jogador ao dia a dia de uma escola de queimada. Desenvolvido pelo estúdio brasileiro Pocket Trap, o título já vem sendo considerado um dos maiores lançamentos indies do ano.

Arremesso certeiro

Sem medo de brincar com os clichês do gênero, Dodgeball Academia é uma grande homenagem às histórias sobre esportes, especialmente aquelas oriundas de mangás e animes. Dá para notar isso logo de cara pelo visual do protagonista Otto, que é um jovem empolgado, corajoso e apaixonado pela prática da queimada. A história começa quando ele se transfere para uma famosa academia do esporte, onde deverá frequentar aulas com os professores mais malucos, treinar suas habilidades especiais e formar um time para competir no campeonato colegial.

Transbordando personalidade em todos os cantos da sua apresentação, o que mais chama atenção nessa trama é o carisma absurdo que se encontra em seu pequeno mundinho. Ao apostar em um estilo de arte que remete bastante ao traço típico dos desenhos animados ocidentais, a Pocket Trap faz com que acompanhar as aventuras de Otto e seus amigos acabe passando aquela mesma sensação nostálgica de assistir ao seu desenho preferido no Cartoon Network.




De fato, Dodgeball Academia é praticamente um desenho animado em formato de videogame, no melhor sentido da expressão, é claro. Todos os personagens são cativantes, divertidos e cheios de expressões que ajudam a torná-los únicos e memoráveis apesar de suas bases claramente clichês. O mundo do jogo é extremamente caricato e exagerado, porém sempre sabe reconhecer o momento certo para brincar com suas maluquices de forma humorística e às vezes até se apoiar nelas para construir momentos surpreendentemente profundos.

Assim como um desenho tradicional, a animação dos personagens foi totalmente feita a mão com muito carinho. Isso acaba trazendo uma maior fluidez aos movimentos caricatos dos personagens, além de contrastar de forma estilosa com os cenários 3D poligonais que Otto pode explorar.

O humor inusitado é mais um dos pontos fortes, especialmente para os brasileiros, que podem encontrar diversas piadas e referências típicas da nossa cultura dentro dos diálogos e cenários da escola. Uma boa comparação seria com o tipo de humor irônico presente em indies como Undertale (Multi) e Guacamelee (Multi), só que com um maior foco nos clichês encontrados em histórias sobre esporte.



Cuidado para não ser queimado

Dodgeball Academia tem um mundo tão apaixonante que às vezes até me esqueço que no final das contas ele também é um jogo — um daqueles bem competentes, por sinal. As partidas de queimada são simples à primeira vista, porém aos poucos vamos aprendendo novas mecânicas que ajudam a estabelecer mais nuances para os duelos em quadra.

Apesar de algumas diferenças aqui e ali, a essência do esporte continua a mesma de sempre. O objetivo é zerar a barra de HP dos oponentes acertando uma sequência bem dada de boladas na fuça deles. Dependendo do personagem, você pode arremessar a bola em diferentes trajetórias para enganar o oponente, enquanto também se preocupa em esquivar dos arremessos adversários, agarrando ou rebatendo as bolas para contra-atacar com mais eficiência.

Além dos movimentos básicos da queimada, é claro que os poderes especiais não poderiam ficar de fora. Ao carregar o arremesso, a bola pode adquirir propriedades diferentes, como efeitos de curva ou o elemento fogo no caso de Otto. É possível carregar também uma barra especial que quando cheia pode ser usada para disparar um arremesso com efeitos devastadores.

Os elementos de RPG existem para adicionar uma camada extra de profundidade a esse sistema. Ao aumentar o nível dos integrantes do time, novas habilidades passivas são liberadas em conjunto com melhorias nos atributos base. Também podemos atribuir dois equipamentos auxiliares a cada personagem, o que acaba servindo para oferecer uma maior customização em seus estilos de jogo.




Precisão nas diferenças

De maneira geral, os personagens em Dodgeball Academia costumam apresentar funções claras dentro do time, praticamente como uma party de RPG. O tímido Bexigo, por exemplo, é mais efetivo em curar o time através do carregamento de barra, enquanto o protagonista Otto funciona como um atacante com defesa, velocidade e ataques balanceados. Dependendo da regra da partida, são permitidos até três personagens no seu lado da quadra. Quando nocauteados, eles precisam ser revividos e curados após a batalha com o uso de itens que você encontra pelo cenário.

Além de desenvolver uma sinergia eficiente, o ideal é passar a bola para o companheiro de time sempre pensando em como explorar as fraquezas do oponente. A gameplay é simples, porém divertida e dinâmica o suficiente para conquistar tanto os jogadores casuais quanto os mais exigentes.

As partidas podem ter diferentes tipos de regras, números de participantes, bolas especiais e quadras dinâmicas. Alguns exemplos são as quadras de gelo, com grama alta ou com carros atropelando os participantes. Apesar do que se imagina, o jogo deixa uma sensação amarga no que diz respeito ao potencial que esses modos e regras especiais poderiam explorar. As ideias são criativas, mas no fim das contas não acabam mudando tanto assim o cerne da jogabilidade.

O mais próximo que há disso são as partidas que não têm divisão de quadras, deixando os jogadores se moverem livremente pela arena sem restrição de área. Infelizmente essa mecânica não é tão bem explorada a ponto de se diferenciar muito dos outros modos. Essa falta de variedade poderia ser problemática a longo termo, porém a campanha de Dodgeball Academia acerta bastante ao se encerrar antes que as coisas fiquem repetitivas.

Por falar em repetição, pode-se dizer que algo que nunca parece enjoar é a trilha sonora desse jogo. Vibrantes e divertidas, as melodias carregam muita inspiração naquele estilo típico dos JRPGs clássicos dos anos 90. Fazendo inúmeras referências às OSTs de Pokémon, não é difícil se pegar cantarolando as músicas toda vez que você entra em uma área ou começa uma partida.



Em busca do trófeu

No total, a campanha é composta por oito capítulos com cerca de uma a duas horas de duração cada. Quando não estiver nas ocasionais partidas obrigatórias para a história, você provavelmente estará explorando as redondezas da academia, realizando pequenas missões secundárias e procurando por baús com possíveis itens.

As ações necessárias para avançar nos eventos da história podem vir a se tornar um pouco chatas nos capítulos finais, visto que os NPCs começam a te mandar ir e voltar de lugares, várias vezes sem necessidade alguma. Pelo menos os acontecimentos são interessantes o suficiente para te motivar a continuar nesses raros momentos de backtracking.

Ao lado da campanha temos também o modo Versus, que funciona como uma maneira rápida de criar suas partidas contra o computador ou em multiplayer local. As mecânicas do jogo provam aqui que podem ficar ainda mais divertidas e competitivas com a companhia de amigos. Só é uma pena que não exista uma maneira de jogar online, nem que fosse de forma limitada.

A preocupação com a acessibilidade compõe um outro ponto interessante de se destacar em Dodgeball Academia. Além de oferecer as tradicionais opções de auxílio para deficientes auditivos e visuais, também temos a inclusão de um modificador de dificuldade bem completo e eficiente. A qualquer hora, é possível acessar o menu e customizar nos mínimos detalhes o dano que você dá e recebe dos adversários, deixando assim a experiência da maneira que mais te agrada.

Talvez a opção de acessibilidade mais surpreendente de todas seja o modo Aprendizado, introduzido como uma funcionalidade que te permite alternar e comparar o texto do diálogo em diversos idiomas diferentes com o simples toque de um botão. A ferramenta oferece uma maneira eficaz de ajudar o jogador a aprender outros idiomas através da curiosidade e comparação de textos semelhantes. É algo tão genial e simples de se implementar que eu fiquei surpreso pelo fato de que nunca encontrei nenhum outro jogo além de Disco Elysium (Multi) que tentou fazer algo do tipo antes.



Um desenho jogável

A combinação de esportes com RPGs se encontra em lua de mel com a chegada de Dodgeball Academia. Destacando-se pela jogabilidade viciante e transbordando muito carisma, ele se prova como uma pérola brasileira que merece todo o sucesso do mundo. Dá para perceber o carinho dos desenvolvedores em cada animaçãozinha, cada detalhezinho do cenário, ao ponto que o nosso coração simplesmente não consegue evitar se apaixonar pelo universo caricato da aventura.

Seria exagero dizer que eu comecei a me interessar em praticar queimada, mesmo odiando a ideia de receber boladas? Pessoalmente, eu não me canso de imaginar o quão incrível seria se o título recebesse uma adaptação para desenho animado. Levando em conta que Ninjin (Multi), outro jogo feito pela mesma desenvolvedora, também recebeu uma animação para a televisão, então talvez esse sonho não esteja tão distante assim.

Prós:

  • Carisma por toda parte;
  • Jogabilidade sólida;
  • Trilha sonora excelente;
  • Personagens divertidos e interessantes;
  • Elementos de RPG complementam muito bem a temática
  • Ótimas opções de acessibilidade;
  • Multiplayer local é diversão garantida.

Contras:

  • Potencial desperdiçado com a falta de mais modos variados;
  • Sem multiplayer online;
  • Alguns capítulos exageram no backtracking.
Dodgeball Academia - Switch/PS4/PC/XBO - Nota: 9.0
Versão utilizada para análise: Switch

Análise produzida com cópia digital cedida pela Humble Games
Revisão: Davi Sousa

Estudante de jornalismo que não vê a hora de achar um estágio. Apaixonado por videogames e esperando o fim de Hunter x Hunter e Berserk desde que me entendo por gente.
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