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Análise: Charade Maniacs (Switch): vigilância, isolamento e laços em um mundo futurista

Visual novel otome conta a história de um grupo de pessoas forçadas a participar de dramas para voltar para casa após serem sequestradas.

Charade Maniacs
é o mais novo otome game publicado pela Idea Factory International. Com um conceito curioso de futuro, a obra coloca um grupo de pessoas em uma situação tensa na qual eles são sequestrados e forçados a participar de um misterioso desafio de atuação. Apesar de ter um potencial interessante na sua proposta, o desenvolvimento desorganizado e fraco da trama pesa significativamente contra a experiência.

Luz, câmera e ação

Charade Maniacs conta a história de uma jovem garota chamada Hiyori Sena, cujo nome pode ser alterado se o jogador quiser. Aluna da Gekkei High School, a garota é a irmã mais velha de uma grande família e leva a sua vida de forma mundana. Na mesma sala que ela, estuda o jovem Tomose Banjo, seu amigo de infância que parece nutrir algo a mais pela personagem, sempre tentando protegê-la.

Um dia, enquanto os dois estão voltando para casa, eles encontram um indivíduo misterioso com uma máscara estranha no rosto. Eles acabam sendo raptados e acordam em um lugar desconhecido junto a outros rapazes. Em pouco tempo, esse grupo de pessoas que não parecem se conhecer descobrem que estão em Arcadia, palco de uma das lendas urbanas mais quentes da atualidade.

Uma misteriosa transmissão chamada de “Other World Stream” tem sido vista nas TVs e dizem que quem faz parte dela tem os seus sonhos realizados. A existência dessa gravação é extremamente implausível, especialmente porque a obra se passa em um futuro totalmente controlado pelo governo. Porém, Hiyori logo descobre que a realidade pode ser tão estranha quanto as ideias aparentemente fantasiosas indicavam.

Em Arcadia, ela e nove rapazes terão que atuar em “dramas” variados, como cenas de romance, mistério e terror. Fazer bem o papel irá lhes render pontos que podem ser trocados por vários itens e o tão sonhado retorno para casa. Apesar dessa perspectiva de “vencer o jogo”, é claro que eles não vão ficar parados e tentarão descobrir uma saída o mais rápido possível, até porque eles já sabem que há pelo menos um traidor que fez parte do processo de sequestro de pessoas para Arcadia.

Um Big Brother de atuação

Ao contrário de outros títulos com mistérios similares, como Danganronpa, não há nenhuma perspectiva de mortes ou algo que aumente a tensão imediata da trama. O conceito geral de mundo futurista é até interessante, com assistentes robóticos, pulseiras que servem como a principal forma de comunicação e livros com displays eletrônicos que permitem a cópia de seu conteúdo.

Os conflitos da história se dão especialmente em função de três elementos: as backstories dos personagens, as interações em função das suas personalidades e os momentos de atuação. Enquanto os dois primeiros são elementos típicos desse tipo de narrativa, a questão das atuações é um pouco mais específico do contexto, tendo relação com o fato de que eles podem ter que fazer determinadas ações, como empurrar uma pessoa de um lugar alto, esfaqueá-la e coisas do tipo, a mando do roteiro.

Em vez de fingir, eles realmente precisam realizar as ações e, mesmo que as pessoas voltem ao normal como se nada tivesse acontecido logo depois, a dor física é real naquele momento. Caso se recusem, os personagens sofrem punições que podem impactar as funcionalidades do seu corpo, como “ficar sem voz”, “perder a capacidade de usar um braço ou perna” e coisas ainda mais específicas.

Infelizmente, isso é subaproveitado, com as transmissões sendo raras e de pequeno impacto. Com isso, a trama tenta focar nas interações entre os personagens para poder dar conta de desenvolver o elenco grande, mas esses diálogos são mundanos e muitas vezes repetitivos em sua natureza, enfraquecendo consideravelmente a atmosfera de mistério.

Além disso, o roteiro possui grandes inconsistências, passando a sensação de que queriam colocar reviravoltas muito significativas para cada rota sem pensar em como a história poderia se manter coesa e coerente como um todo. O resultado é uma trama abaixo da média no gênero, embora os outros elementos da experiência sejam, de forma geral, a qualidade esperada da Otomate. Pessoalmente, ainda acho que os elementos gerais de Charade Maniacs valem a pena, mas a impressão geral é de algo que poderia ser mais interessante se tivesse foco.

Belo, mas ordinário

Apesar dos problemas que comentei acima, em termos técnicos, a obra possui alta qualidade em aspectos como gráficos e trilha sonora. Um bom exemplo disso são as ilustrações de personagens feitas por Teita (Norn9), que contam com leves animações, como movimentação labial e piscadas de olhos. Todos os personagens possuem silhuetas, vestimentas e coloração que fazem deles facilmente distinguíveis entre si e agradáveis de se olhar.

Os fundos também são bem detalhados e usam um efeito de luz que ajuda a dar um estilo único para a sua aparência. O mesmo pode ser dito para a interface, que brinca com o conceito futurista na estética dos menus em um formato hexagonal. Na trilha sonora, também temos músicas com um toque eletrônico que reforçam a ambientação, ao mesmo tempo que instigam a curiosidade para os mistérios da trama.

Como usual de obras da Otomate, a experiência de usuário é bem confortável, incluindo vários elementos de qualidade de vida, como skip, log e auto, quicksave, ajustes de velocidade do diálogo e do volume das vozes (incluindo opção individual) e um fluxograma para ir rapidamente a um ponto específico da trama. Infelizmente, ao contrário de alguns títulos, esse sistema não inclui a opção de ajustar elementos como a tendência de afeto da personagem por um determinado aliado, reduzindo um pouco a efetividade do seu uso, embora ainda não seja algo tão complicado de explorar.

O problema maior na usabilidade fica por conta da falta de indicações de quais rotas estão bloqueadas no início. Se, por um lado, isso ajuda a evitar alguns spoilers, por outro, é fácil tentar focar em uma das três opções românticas bloqueadas e depois ficar sem saber se talvez não tenha sido um erro nas escolhas feitas. Outro detalhe é que há alguns erros de escrita bem bobos e que parecem algo fácil de detectar em testes de garantia de qualidade (QA) da tradução.

Aquém de sua proposta

Charade Maniacs não é uma das visual novels de referência quando o assunto são otome games. Para quem é muito fã do gênero e tem curiosidade em propostas futuristas, o jogo ainda pode oferecer uma experiência interessante, mas, assim como Paradigm Paradox, é algo de difícil recomendação diante de tantas obras mais interessantes no mercado, incluindo outros títulos da própria Otomate, como Birushana, Cupid Parasite, Collar x Malice e Norn9: Var Commons.

Prós

  • Curioso conceito de mundo futurista;
  • As ilustrações de personagens e ambientes são de alta qualidade;
  • Trilha sonora envolvente;
  • Como usual dos títulos da Otomate, o jogo possui bons elementos de qualidade de vida que tornam a experiência confortável.

Contras

  • Subaproveitamento do Other World Stream e inconsistências de roteiro bem significativas;
  • Interações fracas e repetitivas entre os personagens;
  • Não indica com clareza as rotas bloqueadas;
  • Alguns pequenos erros de escrita que poderiam ser corrigidos com QA.

Charade Maniacs — Switch — Nota: 6.5

Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Idea Factory International


é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
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