Jogamos

Análise: Virche Evermore -ErroR: Salvation- (Switch): um otome game cercado por morte e sofrimento

Nova visual novel da Otomate discute o aspecto social e psicológico de viver em uma ilha onde a morte está sempre à espreita.

Virche Evermore -ErroR: Salvation-
é o mais novo título da parceria entre a Otomate e a publicadora ocidental Aksys Games. Com um estilo mais edgy, a visual novel explora mais a fundo o conceito de finais ruins girando em torno do conceito de uma ilha que parece ser “abençoada pela Morte”.

A encarnação da Morte

Ceres é uma jovem garota, mas sua história de vida é marcada por grandes tragédias. Ao longo dos anos, várias pessoas próximas à garota perderam a vida de formas repentinas e assustadoras. Esses casos foram tão comuns que ela passou até mesmo a ser chamada de “Morte” ou “Ceifadora” e tratada com desprezo e medo pelos demais.
A situação toda é tão psicologicamente pesada para ela, que Ceres passou a internalizar que a sua existência é um pecado e que as pessoas têm razão em tratá-la assim. Como a personagem é uma garota muito gentil, ela acabou desenvolvendo uma autoestima muito baixa e uma tendência a ter reações um pouco estranhas a coisas que acalentam o seu coração.
 
Infelizmente, a sensação de culpa da personagem é tanta que ela tende a se isolar dos demais e até a ter pensamentos suicidas. Porém, após o contato com um rapaz que se autointitula “Supervisor da morte”, Ceres tem a oportunidade de mudar um pouco a sua perspectiva e investigar as misteriosas mortes da ilha. Com o apoio de alguns rapazes de origens diversas, a protagonista terá a chance de conhecer mais a fundo a verdade por trás de vários segredos.

Arpéchélé, a terra da morte e dos Relivers

Na verdade, para além de Ceres, a própria ilha de Arpéchélé já tem uma condição bem única: nenhum de seus moradores consegue viver mais do que 23 anos. Ao chegar próximo dessa idade, problemas respiratórios e uma fraqueza generalizada começam a afetar o corpo da pessoa. As lendas locais falam de uma maldição invocada pela própria Morte há muitos anos.
 
Para lidar com a situação, foi desenvolvida uma tecnologia com base em estudos genéticos. Por meio da criação de clones e da transferência de memórias, os cientistas de Arpéchélé conseguiram fazer com que fosse possível estender o período de vida dos habitantes da ilha. Quem passa por esse processo é chamado de Reliver, mantendo sua aparência jovial pelos próximos anos de vida enquanto for capaz de pagar pelo tratamento.
A transição para Reliver não é um processo trivial e há algumas perdas significativas em relação à vida anterior, especialmente na capacidade de evolução pessoal e no desenvolvimento de suas emoções. Graças a essas diferenças, a sociedade passou a ter uma rixa entre indivíduos que querem prolongar sua vida a todo custo e aqueles que acreditam que não se deve ir além do fim da vida natural.
 
Em termos gerais, a ambientação é bem curiosa e é notável como Virche discute os impactos dessas condições tão únicas na constituição da sociedade e nas perspectivas individuais. Em algumas ocasiões, aspectos da trama podem parecer um tanto forçados para apresentar de forma muito didática o que acontece na sociedade, deixando a história menos crível. Porém, esses são pequenos problemas diante da qualidade geral da escrita, que suscita questionamentos interessantes sobre a vida e a morte.

Os múltiplos amantes da Morte

Como geralmente acontece em otome games, a estrutura da narrativa é dividida em uma rota comum e as rotas dos personagens. Inicialmente, temos a “rota comum”, na qual  somos apresentados aos personagens e ao contexto geral de Arpéchélé, com Ceres e vários rapazes curiosos se juntando para investigar certo incidente grave. O que aprendemos sobre cada um aqui é ainda uma visão superficial de seus trejeitos e problemas.
 
Ao final desse trecho, temos a oportunidade de selecionar um dos rapazes para conhecer mais a fundo. Inicialmente, temos apenas três opções: o professor Lucas Proust, o nobre Mathis Claude e o pesquisador Scien Brofiise. É necessário terminar as histórias deles para desbloquear as rotas que envolvem o relacionamento da protagonista com outros rapazes e que trazem também revelações bem importantes para a trama do jogo.
Curiosamente, não é possível obter os “finais bons” da visual novel de início. Virche foi pensado como um jogo tortuoso no qual é necessário que o jogador passe pelo sofrimento dos finais mais negativos primeiro. Apenas após concluir todos os finais ruins, será possível buscar o que é chamado de “Salvation End” para cada um dos rapazes. 
 
Essa é uma escolha que ajuda a marcar o tom da proposta, mas que pode ser um tanto cansativa para jogadores mais casuais. Geralmente, em otome games, não há esse tipo de restrição, permitindo que a exploração de finais alternativos seja algo opcional. Felizmente, isso não chega a ser um ponto muito negativo para a experiência, tendo em vista a alta qualidade de vida da obra. Temos aqui tanto os elementos básicos de navegação (como skip, auto e log) quanto um fluxograma bem detalhado e a opção Skip to Next Choice para poder ir direto para a próxima escolha da história.

A beleza do Lycoris

Além de tudo que mencionei acima, vale destacar que Virche possui uma boa apresentação audiovisual. Embora sutis, como usual no gênero, o título possui algumas animações como movimentação labial e olhos piscando para os personagens. Também temos pequenos cut-ins para dar ênfase às expressões faciais dos interesses românticos em alguns momentos.
 
Um detalhe que chama a atenção também é o estilo realista de pintura dos personagens. Embora ainda mantenham uma estética de animação japonesa, há um aspecto mais plástico que é especialmente notável durante cenas com bocas em foco. O resultado dá uma impressão de textura, como se os personagens fossem bonecas hiperrealistas.


Também há um forte uso de sangue e elementos gráficos. Embora o jogo ainda evite situações de gore e em alguns casos seja mais descritivo para evitar horrorizar ainda mais o público, é uma parte bem importante do tom da obra. A trilha sonora também busca reforçar bem esse aspecto emocional da trama com suas melodias.

Por fim, gostaria de comentar que o jogo tem alguns erros de digitação, mas relativamente poucos em relação ao grande tamanho da história. De forma geral, a escrita em inglês é boa e esses problemas são pouco notáveis.

Em busca da salvação

Virche Evermore -ErroR: Salvation- se apresenta como mais uma boa pedida dentre os otome games lançados em inglês no Switch. Com uma perspectiva mais sombria do que o usual, a obra discute de forma bem interessante o sensível tema da morte em uma sociedade cheia de problemas. O resultado é envolvente e uma fácil recomendação para fãs de visual novels em geral.

Prós

  • Ambientação curiosa que discute o impacto da morte na sociedade e nos indivíduos;
  • Cada rota apresenta uma parte interessante do mistério envolvendo a alta quantidade de mortes na ilha;
  • Boa apresentação audiovisual que reforça a sensação de tragédia com um aspecto realista;
  • Navegar múltiplas vezes pela história é bastante cômodo graças ao fluxograma e o Skip to Next Choice.

Contras

  • Algumas partes da trama soam um pouco forçadas;
  • Ter que fazer os finais ruins dos personagens antes de liberar os bons pode fazer a experiência ser cansativa para o público mais casual;
  • Alguns erros de escrita.
Virche Evermore -ErroR: Salvation- — Switch — Nota: 8.5
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Aksys Games

é formado em Comunicação Social pela UFMG e costumava trabalhar numa equipe de desenvolvimento de jogos. Obcecado por jogos japoneses, é raro que ele não tenha em mãos um videogame portátil, sua principal paixão desde a infância.
Este texto não representa a opinião do Nintendo Blast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google