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Análise: Fitness Boxing Fist of the North Star (Switch) é uma colaboração inesperada, mas eficaz

Nova edição da série de jogos fitness repete problemas antigos, mas usa a animação japonesa para trazer mais variedade à gameplay.

Imagem de Kenshiro com uma aura azul em Fitness Boxing Fist of the North Star.

Se olharmos com atenção, a biblioteca de jogos do Nintendo Switch é cheia de crossovers inusitados.


Temos Mario e os Rabbids em desafios estratégicos; Sora, Snake, Joker e dezenas de outros personagens descendo a porrada em Super Smash Bros. Ultimate; e por que não lembrar Fortnite e as múltiplas franquias representadas no battle royale?

Porém, uma colaboração que acabou passando despercebida foi entre a série de games de exercícios físicos Fitness Boxing e o mangá/anime Hokuto no Ken, ou Fist of the North Star.

Apropriadamente chamado Fitness Boxing Fist of the North Star, o game foi desenvolvido e lançado pela Imagineer em março de 2023 e mistura as rotinas de boxe já características da franquia com os heróis, vilões e cenários da HQ japonesa.

Com a chegada de um pacote de expansão ao título neste fim de ano, tivemos a oportunidade de nos exercitarmos com Kenshiro e companhia. O resultado foi uma experiência que, apesar de repetitiva em relação a games anteriores da série, traz novidades que diversificam um pouco a jogabilidade.

Atividade física pós-apocalíptica

Para quem não conhece, Fitness Boxing é uma franquia de jogos de atividades físicas em que os jogadores devem usar os controles de movimento dos Joy-Con para executar jabs, diretos, cruzados e uppercuts no ritmo de uma série de músicas instrumentais.

Devido à sua natureza fitness, a série sempre se voltou a um público mais amplo, contendo instrutores virtuais diversos e uma setlist repleta de famosas faixas pop. Uma parceria com uma IP mais madura e gráfica como Hokuto no Ken, neste caso, parecia improvável. Mas aconteceu.

O ambiente criado por essa soma é, no mínimo, surreal. Para fãs de Fist of the North Star, é bizarro ver guerreiros pós-apocalípticos atuando como instrutores de boxe, realizando alongamentos e falando coisas como "Posso lhe ensinar a arte do exercício".

Já para entusiastas de Fitness Boxing, todo o contexto de uma guerra nuclear, artes marciais, pontos vitais dos adversários e a luta pela sobrevivência definitivamente soam muito excessivos para uma sessão de exercício físico.
Imagem de Kenshiro em Fitness Boxing Fist of the North Star com uma caixa de texto escrito “O Divine Fist of the North Star só pode ser passado de pai para filho. Mas com Fitness Boxing, posso pelo menos lhe ensinar a arte do exercício."
Kenshiro: “O Divine Fist of the North Star só pode ser passado de pai para filho. Mas com Fitness Boxing, posso pelo menos lhe ensinar a arte do exercício.”


Mas é justamente nesse conflito que está o charme do jogo. Sua apresentação tem muito mais impacto que nos games anteriores da série. Porém, alguns pontos parecem ter regredido em relação aos lançamentos passados.

Um deles são os cenários nos quais as rotinas regulares ocorrem. Diferentemente de Fitness Boxing 2: Rhythm & Exercise, os mapas são estáticos, sem elementos animados que surgem durante o exercício. Isso faz com que as sessões sejam menos dinâmicas, o que é uma pena ao se considerar a quantidade de referências que poderiam ser feitas ao mangá/anime.

Além disso, não há opção de vozes em japonês. A dublagem em inglês é razoável – embora soe robótica em vários momentos –, mas Hokuto no Ken é conhecido por suas frases icônicas no idioma original, incluindo a clássica “omae wa mou shindeiru”, ou “você já está morto”. Não tê-las durante a gameplay é uma oportunidade perdida.

O game também peca ao aproveitar pouco a trilha sonora da animação em seu setlist. Grandes composições estão presentes, como a faixa de abertura AIO TORIMODOSE!!, mas a maior parte das canções é feita especificamente para o título. Essas músicas originais não são ruins, mas imagino a decepção de um fã fervoroso ao não reconhecer a maioria das trilhas.

A mesma jogabilidade de sempre

Quando o assunto é colocar o corpo para suar, Fitness Boxing Fist of the North Star não promove grandes inovações em sua jogabilidade central. Isso pode ser bom para alguns, mas questionável para quem já tem centenas de horas nos outros jogos da série.

Estruturalmente, esta edição do título é totalmente baseada em Fitness Boxing 2. Ou seja, os mesmos modos de Exercício Diário e Treinamento Livre estão de volta, assim como todas as opções de melhoria de vida introduzidas nessa sequência.

Por isso, a versão de Hokuto no Ken entrega uma competente experiência de atividade física. Jogadores podem aproveitar uma grande gama de treinamentos, cada um com movimentos de ataque e esquiva específicos, em diferentes níveis de dificuldade.

Imagem de Kenshiro como instrutor de boxe em Fitness Boxing Fist of the North Star. É possível ver a interface de usuário, mostrando quais socos realizar.


Também é possível customizar as sessões, escolhendo a sequência das rotinas, indicando quais movimentos não incluir nos Exercícios Diários ou até mesmo selecionando ações para o game executar automaticamente – um ótimo recurso de acessibilidade.

No entanto, nada disso é novo para quem se exercita com a franquia desde 2019. Os principais modos de atividade física não trazem novidades significativas. Tirando poucas exceções, os movimentos de ataque, de defesa, as falas dos instrutores e os alongamentos são todos similares aos dos títulos anteriores. Consequentemente, não há um frescor na jogabilidade, principalmente se lembrarmos que este é o terceiro título da série.

Não só isso, mas jogadores precisam desbloquear novamente rotinas com as quais já estão acostumados nos jogos passados. Esse não é um processo necessariamente cansativo, mas, se o game conseguisse reconhecer dados de save dos outros títulos e destravasse os conteúdos mais avançados imediatamente, a experiência seria mais agradável para os fãs assíduos.

Os controles de movimento também refletem uma falta de refino presente desde o primeiro Fitness Boxing. Em minhas análises dos games predecessores, um dos pontos negativos era a inconstância nos motion controls. Ações muito próximas umas das outras podiam ser registradas de maneira errada pelo jogo, ou até mesmo não captadas de forma alguma.

Como Fist of the North Star usa a mesma base de gameplay dos títulos passados, esses problemas e outros, como a falta de um indicador de exercícios recomendados de acordo com os dados de peso de cada pessoa ou treinamentos que não são desenhados ao redor das músicas, retornam. A cada lançamento da franquia, fica mais difícil defender essas adversidades repetitivas.

Simulador de ATATATATATA

No entanto, essas questões são parcialmente mitigadas por modos inéditos que combinam o universo de Fitness Boxing com o de Hokuto no Ken.

O principal deles é o Battle. Nele, jogadores são desafiados a combater capangas e grandes antagonistas do mangá/anime em lutas envelopadas com rotinas de boxe.

Existem dois tipos de disputas. Contra inimigos comuns, é preciso derrotar uma quantidade definida de bandidos executando combos sem errar nenhum comando. Já nas batalhas contra chefões, a atividade física torna-se uma espécie de contenda em turnos, em que socos tiram a energia dos vilões, ao mesmo tempo que bloqueiam investidas inimigas.

Nessas boss battles, realizar os comandos de maneira correta preenche uma barra de especial que, se estiver completamente cheia ao final do duelo, ativa um último golpe: o Hokuto Hyakuretsu Ken, ou Hokuto Hundred Blows Rushing Fist. Assim como na animação, jogadores devem desferir uma série de socos o mais rápido possível, ouvindo Kenshiro proferindo o tradicional “ATATATATATATATA” durante o ataque.
Chefões do Modo Batalha também têm seus ataques especiais.


Embora um pouco previsível após certo tempo, esse modo é um bom exemplo de adaptação da gameplay de Fitness Boxing em um contexto mais aprofundado. Os desenvolvedores não só levaram em consideração os elementos da IP com a qual estavam colaborando, mas também gamificaram mais as atividades físicas, incluindo níveis, objetivos e recompensas aos exercícios.

Inclusive, as recompensas são muito mais relevantes que nos outros games da série. Ao concluir desafios, novos instrutores – incluindo certos vilões do modo Batalha – e músicas podem ser destravados com Fitness Points, que são obtidos não só ao cumprir achievements, mas também ao completar missões diárias ou simplesmente se exercitando.

Ao acrescentar itens desbloqueáveis além de roupas para os treinadores e diversificar os métodos para consegui-los, o jogo cria um loop de gameplay mais instigante.

DLC sem força

Infelizmente, o mesmo não pode ser dito sobre o DLC pago lançado neste mês de dezembro.

O pacote adicional adiciona dois modos bastante curtos. O primeiro é protagonizado pelo vilão Heart e testa a capacidade dos jogadores em executar o Hokuto Hyakuretsu Ken com quantidades específicas de socos em um tempo limitado.

O segundo traz um dos principais antagonistas de Fist of the North Star, Raoh. Nele, é preciso realizar socos rápidos e com timing certeiro para mandar capangas voando pelos ares.

Ambos não se aprofundam muito em suas mecânicas, limitando-se a apenas alguns minutos de aproveitamento. O único elemento que tenta manter essas adições mais relevantes são pontos que podem ser obtidos exclusivamente nesses modos para garantir vestimentas extras para os personagens.

No entanto, há um desbalanceamento. A quantidade necessária de pontos para liberar esses itens é muito grande, o que resulta em repetidas sessões rasas para obtê-los. No final das contas, o esforço não vale muito a pena, algo problemático para um DLC que custa R$ 124,00.

Imagem de Heart recebendo uma série de socos em Fitness Boxing Fist of the North Star.


Acessibilidade e localização

Vale lembrar também que, por ser um jogo totalmente baseado em movimentos, Fitness Boxing Fist of the North Star pode impor obstáculos de jogabilidade para pessoas com dificuldades motoras.

Como dito acima, o game tem opções que desativam ou automatizam certas ações durante os exercícios, mas a necessidade de segurar um Joy-Con em cada mão e movê-los durante as atividades pode dificultar o aproveitamento para alguns.

Essa necessidade de usar os controles desacoplados do console também faz com que o título não seja naturalmente compatível com o Nintendo Switch Lite. Nesse caso, para aproveitar o game no portátil, é necessário possuir um par extra de Joy-Con.

Além disso, é importante ressaltar que o jogo não possui localização em português brasileiro. Porém, devido à natureza autoexplicativa de seu design, conhecimento de outros idiomas não é muito necessário.

Você já está… em forma

É difícil de entender, à primeira vista, por que Fitness Boxing Fist of the North Star existe. A intersecção de fãs da franquia de treinamentos físicos e de Hokuto no Ken deve ser muito pequena para justificar um game com as duas marcas.

Mas é uma combinação que funciona. Sim, a base de sua gameplay continua inalterada e, para quem joga os títulos de boxe desde o início, é frustrante ver que praticamente todos os problemas originais continuam presentes aqui.

Porém, o game ainda promove boas atividades aeróbicas e de musculação, e consegue ser um bom aliado para uma vida mais saudável. Além disso, os modos mais inspirados em Fist of the North Star conseguem diversificar a jogabilidade.

Mais uma vez, o Switch recebe um competente jogo fitness. A curiosidade agora fica para a edição de Fitness Boxing com Hatsune Miku, já anunciada pela Imagineer. Esperemos quais novidades essa nova colaboração trará.

Prós

  • Apresentação impactante, misturando Fitness Boxing com Fist of the North Star de maneira deliciosamente bizarra;
  • Game continua entregando modos competentes de exercícios físicos e opções de qualidade de vida simples, mas eficazes;
  • Modo Batalha integra as duas franquias de maneira instigante, colocando mais game design ao redor das atividades físicas;
  • Itens desbloqueáveis de maior relevância, com mais opções para se conseguir os pontos necessários para liberá-los;
  • Opções de remoção e automatização de certos movimentos são boas para a acessibilidade.

Contras

  • Muitos dos problemas da franquia estão de volta, como controles de movimento instáveis, exercícios descompassados com as músicas e falta de opções de atividades que levem em conta os dados de saúde dos jogadores;
  • Principais modos de exercício são batidos para quem já jogou os games anteriores da série Fitness Boxing;
  • DLC raso, sem atividades interessantes no longo prazo;
  • Poucas músicas da série animada Hokuto no Ken;
  • Falta de localização em português brasileiro e de vozes em japonês.
Fitness Boxing Fist of the North Star – Switch – Nota: 7.5
Revisão: Juliana Paiva Zapparoli
Análise produzida com cópia digital cedida pela Imagineer

Jornalista, analista de mídias, PcD e entusiasta de games desde que jogou Pokémon Azul no Game Boy Color nos anos 90. De lá para cá, tenta aproveitar ao máximo todos os consoles no pouco tempo que a vida adulta permite. Se não está escrevendo para o Blast ou demorando anos para zerar um jogo, está no Twitter (@DanielMorbi) e no Instagram (@danielmorbi_)
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