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Análise: The Legend of Legacy HD Remastered (Switch) revive em alta definição um clássico cult do 3DS

Apesar de oferecer poucas mudanças em relação ao lançamento original, aqui está uma obra recomendada para fãs de JRPGs.

Com o Nintendo Switch entrando em seu oitavo ano no mercado, se tem algo que os seus milhões de donos não podem reclamar é da quantidade de RPGs japoneses disponíveis para o console. De clássicos modernos como Persona 5 Royal a títulos exclusivos como Pokémon: Legends Arceus e Xenoblade Chronicles 3, há algo para praticamente todos os gostos na biblioteca do dispositivo híbrido.


De fato, o tamanho da audiência em si justifica inclusive o lançamento de projetos menores do gênero, mas que nem por isso são menos empolgantes. É precisamente o caso de The Legend of Legacy HD Remastered, que, como o nome indica, revive em alta definição o JRPG lançado originalmente para Nintendo 3DS há nove anos. Embora não apresente muitas melhorias além da resolução, esta remasterização é recomendável, especialmente para quem busca uma aventura divertida, inspirada nos clássicos da década de 1990.

O começo de uma fantasia

The Legend of Legacy se passa na terra vasta e mágica de Avalon, repleta de deuses, monstros e mitos. Uma das principais e mais populares lendas, por exemplo, diz respeito ao Star Graal, um artefato cujos rumores dizem tratar-se de um elixir da imortalidade.

Incontáveis aventureiros, homens e mulheres, se aventuraram em busca do Star Graal e de outros tesouros similares em valor, mas, ainda assim, os mistérios em torno de Avalon permanecem. É neste contexto que somos apresentados aos sete protagonistas possíveis do jogo, cada qual com seus próprios motivos para explorar esta terra.

A voluptuosa alquimista Eloise, por exemplo, deseja encontrar o já mencionado Star Graal e alcançar a juventude eterna. Já o anfíbio Filmia pertence a uma antiga realeza e busca outros de sua espécie para salvar seu povo; e assim por diante. 

Infelizmente, apesar do grande número de protagonistas selecionáveis ao começar um novo jogo, o que encontramos aqui passa bem longe das ramificações narrativas mais complexas de títulos mais recentes, como Octopath Traveler (Switch) e a sua excelente sequência

Assim, caso este seja o seu primeiro contato com The Legend of Legacy, espere poucos diálogos e ínfimas variações entre uma história e outra. Tanto em 2015 quanto em 2024, a impressão é que a FuRyu escolheu priorizar a jogabilidade em vez da narrativa nesta produção, algo incomum para o gênero e, certamente, um aspecto a se considerar caso você não abra mão de uma boa história em um JRPG.

A arte da cartografia

Falando da jogabilidade em si, a maior parte de The Legend of Legacy ocorre nas diferentes áreas de Avalon, como ruínas em uma floresta, desertos, vales, túneis, etc. Ao investigar e explorar essas áreas — que funcionam como as dungeons (calabouços) do jogo — é possível preencher os mapas delas, vendê-los na vila para ganhar dinheiro e comprar novos itens e equipamentos melhores, explorando assim outras dungeons mais difíceis e distantes. Sendo bem sincero, é um ciclo repetitivo, mas que surpreendentemente consegue se manter divertido ao longo das quarenta horas necessárias para completar a campanha.

Já o sistema de combate segue o padrão dos RPGs de turno, mas há algumas peculiaridades. A primeira é o posicionamento dos membros do seu time, que aqui pode ser o grande diferencial entre uma vitória tranquila e uma derrota apertada. 

Escolher uma formação com todos os integrantes do time em posição de ataque, por exemplo, é a melhor opção para acabar rapidamente com inimigos mais fracos, já que todos atacarão quando tiverem chance. Mas, conforme os oponentes ficam mais durões, o ideal é explorar outras formações, como a que usa um personagem para defender o time enquanto os restantes atacam (Guard), ou a que torna a tarefa de reviver companheiros desmaiados mais fácil (Support).

Complementando a questão das formações, cada personagem tende a funcionar melhor em uma função específica, por conta de seus atributos iniciais. Eloise e Bianca, por exemplo, são ótimas defensoras desde o começo da aventura, enquanto Garnet e Filmia apresentam uma vocação natural para o ataque. 

Ainda assim, qualquer personagem pode usar qualquer equipamento e, com o tempo, aprender as técnicas correspondentes, o que concede bastante flexibilidade ao jogador na hora de formar a sua party. Com somente três atributos em jogo — Power, Defense e Support —, o caminho mais curto para aumentar os stats em cada um deles é cumprir os papéis relacionados em batalha e diminuir consideravelmente a necessidade de grind para os membros ativos.

Aliás, algo bem interessante é que aqui a vida de seus personagens é automaticamente restaurada ao encerrar uma batalha. Particularmente, essa escolha criativa nunca me incomodou, mas compensa notar que, tendo em vista alguns saltos de dificuldade entre um e outro mapa, ela torna a aventura um pouco desequilibrada, ora difícil, ora fácil demais, para os padrões do gênero. 

Neste caso, já que estamos tratando de uma remasterização, seria bem interessante tanto para os veteranos quanto para os novatos poderem escolher ou ajustar a dificuldade manualmente, correto? Uma pena, mas, infelizmente, não é o caso neste relançamento.

Basicamente o mesmo jogo, sem grandes mudanças

Por falar em oportunidades perdidas, esta remasterização tinha a grande chance de consertar de forma definitiva dois dos principais problemas do lançamento original: a falta de clareza sobre os sistemas do jogo e a ausência de um tutorial propriamente dito. 

Um exemplo que eu gostaria de destacar — a título de ilustração — diz respeito à forma aleatória como os personagens sobem de nível. Sem pontos de experiência visíveis, em nenhum momento fica realmente claro para o jogador como exatamente o game decide distribuir níveis e atributos, além da relação óbvia com a participação nas batalhas.

Para não dizer que absolutamente nada foi feito nesse sentido, The Legend of Legacy HD Remastered traz consigo um recurso chamado de Guidebook. Agora, basta apertar o analógico direito em qualquer momento do jogo — inclusive durante as batalhas — para conferir um menu especial, com explicações que abrangem desde os controles até as habilidades e formações. 

Bem, na ausência de um tutorial de fato, o Guidebook ameniza, mas a verdade é que ele não resolve completamente o problema. Eu me arrisco inclusive a dizer que os jogadores continuarão aprendendo como jogar The Legend of Legacy na prática; e como também não há suporte ao português brasileiro, fica o aviso que é imprescindível saber ou ter noção de inglês ou japonês para aproveitar a obra, mesmo com poucos diálogos.

Para encerrar a análise em um tom positivo, destaco que os principais objetivos desta remasterização foram cumpridos, na minha opinião. Isso porque desde o fechamento da eShop do Nintendo 3DS, em 2023, esgotaram-se as maneiras de adquirir The Legend of Legacy de forma oficial, a não ser que você considere o mercado paralelo de revendas de usados (e as suas operações geralmente inflacionadas).

Portanto, em uma indústria que sofre até hoje com problemas para preservar as suas mídias, é muito bom ver este JRPG experimental da FuRyu disponível para compra em plataformas modernas, como o Switch. O grande chamariz deste relançamento — os visuais em HD — também merecem elogios, com as artes simples, mas coloridas e vibrantes, se destacando em alta definição tanto no modo TV quanto no modo portátil do console. 

Um dos maiores diferenciais de The Legend of Legacy, na época de seu lançamento original, era a parte técnica, que simulava um livro 3D com seus cenários sendo revelados à medida que se caminhava por eles. Mesmo com a ausência do efeito estereoscópico, a apresentação ainda merece elogios nove anos depois e ajuda a elevar o valor da obra, agora preservada indefinidamente com este relançamento.

Redescobrindo Avalon, agora em alta definição

The Legend of Legacy HD Remastered é bem-sucedido em sua missão de reviver em alta definição e nas plataformas modernas um clássico cult até então preso no Nintendo 3DS. Embora o trabalho de remasterização tenha sido pouco ousado e faça quase nada de concreto para consertar os deslizes cometidos no lançamento original, a falta de ambição não é o suficiente para mudar o fato de que este JRPG experimental merece ser conferido por entusiastas do gênero. Basta que as expectativas sejam devidamente ajustadas.

Prós

  • Resgata em alta definição um dos JRPGs mais curiosos do Nintendo 3DS;
  • Jogabilidade divertida, que concede liberdade durante as batalhas e flexibilidade na composição da party;
  • A grande quantidade de protagonistas permite ao jogador vivenciar a história por outros ângulos, ainda que, na prática, as variações não sejam muito significativas;
  • Sem problemas de performance ou apresentação tanto no modo TV quanto no modo portátil do Switch.

Contras

  • O trabalho pouco ousado de remasterização indica que os deslizes do jogo original continuam presentes neste relançamento;
  • O desenvolvimento pálido dos personagens e da história acaba tornando a narrativa algo secundário dentro do título (e suscitando comparações com concorrentes mais recentes do gênero);
  • A falta de clareza sobre os sistemas do jogo e a aleatoriedade na progressão de stats, bem como os eventuais saltos de dificuldade, pode afastar ou desmotivar os jogadores;
  • A ausência de suporte ao português brasileiro, mesmo com poucos diálogos, é decepcionante.
The Legend of Legacy HD Remastered — Switch/PC/PS4 — Nota: 7.5
Versão utilizada para análise: Switch
Revisão: Cristiane Amarante
Análise produzida com cópia digital cedida pela NIS America

é bacharel em Produção Cultural pela UFF e estudante de Comunicação Social pela FSMA. Na infância, ganhou um Super Nintendo dos pais e, desde então, nunca mais deixou o mundo dos games. Ainda sonha em ser um Mestre Pokémon.
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